Rechaçadas nas urnas, privatizações voltam ao debate com Temer

O processo de impeachment ainda está em curso. Mas o assédio e as sinalizações de alguns setores deixam antever o que poderá ser uma gestão Michel Temer, caso o golpe se consolide. A ex-diretora do BNDES no governo de Fernando Henrique Cardoso, Eliane Landau, propôs “repensar o papel do Estado”, apostando em um revival das privatizações. Economistas e “gente do mercado” já fazem pressão por reformas e cortes. E, no fundo, tudo aponta para uma pauta entreguista e contra os trabalhadores.

privatizações

Antiga aliada dos que hoje querem depor a presidenta Dilma Rousseff e outrora conhecida como a “musa das privatizações”, Eliane escreveu há alguns dias, em O Globo: “Assim como foi no final da década de 80, a profunda crise fiscal deixa claro hoje que, além dos desperdícios causados pela influência política nas decisões das estatais, se esgotou a capacidade do governo de investir e prestar serviços de qualidade. Repensar as funções de Estado é uma velha, mas sempre atual, agenda”.

Nesse caso, a ideia de passar em revista o papel do Estado nada mais é do que reduzir o Estado, deixando à míngua aqueles que, de fato, precisam dele.

No texto, fica claro o anseio privatista da autora, que elogia projetos que tramitam no Congresso e alteram o estatuto das empresas estatais, abrindo brechas para a privatização, e dificultam a representação dos trabalhadores nos fundos de pensão destas companhias.

Para não restar dúvida sobre o viés entreguista, ela completa: “Muito mais pode ser feito, inclusive uma análise da necessidade de manter certas empresas sob controle estatal ou até mesmo em operação”, disse, disparando contra Petrobras, Eletrobrás e Infraero, patrimônios do país.

Porta-voz daquilo que a oposição sempre desejou, mas tinha vergonha de reconhecer nas campanhas eleitorais, Eliane aponta para o retorno à cartilha neoliberal aplicada na década de 1990 e, desde o fim do governo de Fernando Henrique Cardoso, rejeitada nas urnas.

Uma matéria de O Globo, publicada nesta quarta (20), também faz referência às privatizações. Segundo o texto, analistas e especialistas da área de energia não esperam uma grande reformulação da política para o segmento num eventual governo Temer, mas o mercado aposta em “ajustes na regulamentação e em privatizações”.

O documento Ponte para o Futuro, uma espécie de plano de governo precoce, lançado pelo PMDB no ano passado, fala em uma "política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias".

A mensagem tem estimulado certezas de que privatizações de ativos no setor de energia podem ser aceleradas.

Em uma declaração anônima à Reuters, “um economista que participou da elaboração” da plataforma peemedebista confirmou que Temer e seu partido já trabalham um programa, no qual consta “aprofundar o plano de 15 bilhões de dólares em vendas de ativos da Petrobras para incluir a privatização de outras subsidiárias, incluindo a Transpetro e a BR Distribuidora, para evitar um custoso resgate governamental”.

O analista de energia da Haitong Securities, Sergio Tamashiro, disse a O Globo que “com certeza" haveria uma aceleração na venda de empresas, que sempre enfrentou forte resistência por parte de sindicatos ligados ao PT.

O próprio Temer já assumiu o papel de defensor da liquidação do patrimônio público. Em videoconferência de evento jurídico realizado em Portugal com a cúpula do impeachment, o vice que quer ser titular elogiou as privatizações ocorridas na década de 1990. “Quebramos monopólios estatais que tinham uma visão de que o Estado é que deve fazer tudo. Avançamos para dizer que a iniciativa privada pode colaborar muitíssimo", disse.

E a revista Veja, trincheira da luta pelo impeachment, também já vaticinou, sobre uma hipotética gestão Temer: “A tônica estatista vai dar lugar a amplos programas de concessão de portos, aeroportos e rodovias. As privatizações, satanizadas pelos petistas, voltarão à agenda do país, a começar por órgãos como a Infraero e a BR Distribuidora, repartições públicas até bem pouco tempo atrás usadas pelos próprios peemedebistas como centrais de empreguismo e propina”.

O enredo de um eventual futuro sem Dilma está centrado, portanto, em um homem sem votos a tentar aplicar um programa derrotado pelo povo. Muitos são então os indícios, avisos e cobranças que já permitem antecipar o caráter do Plano Temer: distante dos interesses nacionais, a serviço do capital privado e prejudicial para os trabalhadores.