Eleições no Rio: apostadores, estado de confiança e bloco histórico

 "Para conhecer o seu inimigo, você deve tornar-se seu inimigo" (Sun Tzu)

*Por Bruno Sobral

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Muitas vezes na hora de se montar um programa para uma candidatura, os "conselheiros" ou o próprio candidato se apegam a busca do autoconhecimento e de sua circunstância. Nesse sentido, se apegam ao que eles acham sobre as prioridades para uma agenda. Por isso, gastam energia em debates sobre pesos e valores. Muitos acreditarão que o importante é uma boa pauta de segurança e de gestão, já outros tantos uma boa pauta de geração rápida de empregos e atender demandas sociais emergenciais…Toda uma agenda de desenvolvimento é multidimensional, nada é mais ou menos importante. Contudo, o que se disputa em uma eleição é a capacidade de escolher seus próprios inimigos e neutralizá-los no que eles se acreditam fortes.

Por exemplo, na eleição do Estado do Rio de Janeiro, a maior sacada de Eduardo Paes como candidato é buscar se diferenciar de Luiz Fernando Pezão, atual governador com baixíssima popularidade, atribuindo a ele incapacidade de realizar e de executar. Para isso, desfilia-se do MDB (mesmo partido do governador) e muda-se para o DEM, colando-se na trilha do processo reformista em voga e que gerou um filhote direto para o estado: Regime de Recuperação Fiscal. Nesse sentido, segue a máxima que é melhor errar de modo tradicional que acertar de modo excêntrico, pois seria maior o risco de ser considerado irresponsável.

E importa pouco o que nós achamos disso agora, ele vai criando novos cenários a partir disso e costurando para tratar Pezão como seu adversário, logo, fugindo de polarizar uma disputa de agendas com a esquerda. Nesse sentido, buscará tirar proveito da grande divergência acerca de um debate sobre vanguardas e renovação para deixar cada um de seus adversários lutando por suas agendas, enquanto ele se antecipa e oferece não uma agenda original, mas inspirar confiança em sua capacidade de realizar e executar o “necessário” segundo a opinião pública dominante.

Como o economista John Maynard Keynes ensinou com sua parábola do concurso de beleza, o que importa não é o que você acha melhor, mas antes o que você acha que os outros vão achar antes destes acharem o que irão achar. Traduzindo, o que importa não é sua verdade (por mais autentica que seja), mas sua capacidade de liderar a tomada de decisão a seu favor. Para isso, importa pouco uma análise criteriosa da realidade, pode ser até uma vaga opinião desde que inspire confiança em um cenário. Como Keynes ensina, não é escolhido o melhor, mas aquele que cada um achou que os outros achariam que poderia ter capacidade de vencer e lidar com o poder. Ninguém confia em apostas fracas. A eleição é um jogo de apostas baseado na arte de gerar um estado de confiança para tomada de decisões futuras associada à função.

Muitos veem polarização em tudo, mas, no Rio de Janeiro como em outros estados, o quadro real é de grande pulverização e diante disso uma hábil estrutura tradicional buscando se recompor ao criar novos cenários do possível a fazer. Nessa eleição, o principal não é uma disputa de agendas. Ou falando de outra forma, a principal agenda não é temática e sim política, é mostrar que é capaz de criar um bloco de poder em torno de si e lidar com o poder associado ao cargo. Não basta patrulhar ou estigmatizar seu adversário, a disputa é pela força de um estado de confiança projetado. É preciso contrariá-lo com um cenário diferente do que o fortalece para então não agir com a segurança esperada, assim, induzi-lo a demonstrar fraqueza para exercer a função e isolá-lo.

Por isso, boa parte do pensamento conservador ironiza o conteúdo de utopias e propostas políticas pouco críveis de uma ação geral mais objetiva. É com bons sentimentos que se faz péssima política quando diante e em volta impera o desejo de poder. Em eleição majoritária, ganha-se formando maiorias capazes de servir como bases de governabilidade. Só discurso para minorias e de resistência é "anticandidatura" diante da assimetria de poder. Se sentir depois melhor de quem o venceu, é algo que só faz bem para si mesmo. Não tem efeito social. Ter projeto é mais do que dizer não ou sim a algum ideal. Entre o "bom senso" e o senso de poder, não se pode ter dúvidas de qual é a base da preparação para ação política.

Seja qual for o conjunto de ambições, terá que se deparar com o desafio de despertar interesse de apostadores no jogo do concerto político. Todos os apostadores desejam não sonhadores e visionários, mas pessoas práticas que imaginam sentadas na cadeira antes de parar para ouvi-las com mais atenção. Antes que o problema de uma unidade das esquerdas, é um problema de formação de bloco histórico, de capacidade de direção política. As maiores vantagens são essas, focar nos apostadores e saber ser prático e dirigente. É preciso já ser o vitorioso antes de lutar para todos confiarem nisso e apostarem em você.