Diversidade brasileira nas Olimpíadas de Tóquio

Marta e Paulinho, no futebol, e Douglas, no voleibol, marcaram os primeiros dias da Olimpíada de Tóquio.

Embora, para alguns brasileiros, a emoção de torcer pela conquista do ouro, esbarre no sentimento preocupante de ainda atravessar a pandemia da Covid-19 e as inúmeras crises, econômica, social e política, que o país enfrenta, não contávamos que em meio ao arrevesado cenário assistiríamos a diversidade brasileira sendo bem representada em suas diversas formas, seja na luta de Marta [maior jogadora de futebol de todos os tempos] por reconhecimento, o carisma de Douglas Souza, primeiro jogador da seleção masculina brasileira de vôlei a se declarar gay, ou na fé de Paulinho, ao comemorar sua vitória agradecendo seu Orixá.

A luta de Marta: rainha do futebol brasileiro

É no campo de futebol que Marta Vieira dos Santos projeta sua representatividade. Mulher, casada com a também jogadora de futebol, Toni Deion, é considerada a maior futebolista dos últimos tempos. Aclamada por Pelé e por milhares de mulheres que sonham em se tornar jogadoras profissionais, Marta também se destaca pela luta diária pelo reconhecimento. A atleta não possui patrocínios de grandes empresas, batalha por uma remuneração adequada às grandes atletas e parceiras de campo.

A futebolista já foi escolhida seis vezes como a melhor do mundo, sendo cinco de forma consecutiva. Um recorde não apenas entre mulheres, mas também entre homens. Ela também foi considerada pela Revista Época uma das 100 pessoas brasileiras mais influentes do ano de 2009. Um fenômeno que ainda esbarra na disparidade salarial de gênero. Marta recebe cerca de 340 mil euros, o que corresponde a R$ 1.495.000,00 por temporada. Embora pareça uma alta quantia, é o equivalente a 1% do salário de Neymar Jr, por exemplo.

Pela segunda vez, agora nas Olimpíadas de Tóquio, Marta levantou novamente a campanha “Go Equal”, com o objetivo de garantir um pagamento mais justo para o futebol feminino. A primeira vez que a atleta aderiu à campanha foi em 2019, na Copa do Mudo de Futebol Feminino. “Não é só pelo dinheiro em si. É toda uma história”, ressalta Marta, símbolo de luta pelo respeito e reconhecimento profissional.

Jogadora da seleção brasileira de futebol, Marta (foto: reprodução)

Douglas Sousa: o atleta que conquistou milhões de seguidores em dois dias

Sim, milhões de brasileiros foram surpreendidos pelo carisma e a leveza de Douglas Correia de Souza, de 25 anos, jogador da seleção masculina brasileira de vôlei, que conquistou em apenas dois dias, mais de um milhão de seguidores no Instagram e nesse período de tempo, transmitiu com entusiasmo sua rotina e de seus colegas, na vila olímpica. Mas para além disso, o que nos aproxima de Douglas é a maneira com que ele rompe os padrões de uma equipe masculinizada  e se apresenta como é: atleta profissional, gay, fã de Pablo Vittar e dono de bordões icônicos.

Atuante na posição de ponteiro Douglas Souza, nasceu em São Paulo, em Santa Bárbara d’Oeste. Ainda pequeno, iniciou sua trajetória na quadra de vôlei por recomendação médica em virtude de problemas de bronquite. Campeão sul-americano infantil aos 11 anos, foi campeão sul-americano juvenil, vice-campeão da Liga Mundial e medalha de prata em Toronto 2015, antes de se tornar campeão olímpico em 2016, nas Olimpídas do Rio de Janeiro. Entre tantos orgulhos, há o de ser o primeiro jogador da seleção masculina brasileira de vôlei a se declarar gay, cujo feito comtempla sua trajetória.

Além de atleta, Douglas, nas horas vagas, utiliza o YouTube para levar entretenimento para os internautas sobre sua vida, sobre games e competições de vôlei, mas não foi em seu humilde canal com apenas 16 mil inscritos que ele se tornou conhecido por milhões de pessoas. A sua rotina na Vila Olímpica, atrelada ao seu humor e descontração, diante de uma das competições mais importantes de sua vida, chamou a atenção de muita gente para o seu perfil no Instagram. Em 2020, ele declarou que gostaria de ser lembrado “como primeiro homossexual no vôlei”, assim está sendo.

Douglas Souza, jogador da seleção maculina brasileira de vôlei (Foto: Reprodução)

Paulinho leva o candomblé às Olimpíadas

O candomblé, alvo da intolerância religiosa no Brasil, assim como outras religiões de matriz africana, ocupa pouco ou quase nenhum espaço de grande visibilidade na mídia por ser uma das religiões mais perseguidas, proveniente de um racismo estrutural que acompanha o povo negro há séculos. E é nesse contexto que o jogador de futebol Paulinho, de 21 anos, deu voz à resistência de sua religião ao comemorar um gol simbolizando a flecha em agradecimento à Oxóssi, orixá das florestas.

Aos 17 anos de idade Paulinho contou à mãe Ana Cristina o desejo de descobrir sua ancestralidade e espiritualidade por meio do Candomblé. Hoje o camisa 7 da seleção brasileira rompe o tabu e expõe para o mundo a reverencia a Exu. “Eu quero buscar o conhecimento dos meus orixás, quero saber quem me guia, quem habita em mim”, ressaltou o atleta.

Em campo, durante a primeira disputa, nas Olimpíadas, contra a Alemanha, Paulinho marcou um dos quatro gols, resultando em sua comemoração. Mas fora dele, o atleta também dribla os desafios, marcados pelo preconceito e a intolerância religiosa, utilizando as redes sociais para pregar o respeito.

Paulinho, jogador da seleção masculina brasileira de futebol (Foto: Reprodução)

O Brasil é um país de contraste. Sua diversidade pode ser observada na música, no clima e em cada região do mapa, mas ainda ainda há muitos espaços a serem ocupados por essa diversidade que é avo de preconceito, discriminação e perseguição. Marta, Douglas, Paulinho e a equipe de atletismo brasileiro que compete nas olimpíadas são reflexos dessa pluralidade e vê-los ocupando espaços tão importantes e visibilizados, erguendo suas vozes em resistência, é ser espelho e reflexo àqueles que não se sentem representados nesta sociedade.

Artigo publicado inicialmente no site o Pedreirense