Mídia internacional faz escarcéu sobre espião russo
O alegado envenenamento do ex-coronel das Forças de Segurança do Estado (FSB, em russo) da Rússia, Alexandr Litvinenko, continua nas manchetes da grande mídia internacional.
Publicado 23/11/2006 16:09
A Scotland Yard, que abriu um inquérito, não faz qualquer comentário a respeito da investigação, mas suas atenções concentram-se agora essencialmente sobre três pessoas, suspeitas de terem cometido crime: dois homens russos com os quais Litvinenko falou num hotel e tomou chá e o italiano Mario Scaramella, com quem almoçou num restaurante japonês na cidade de Londres, no dia 1.º de novembro.
Nesta quinta-feira (23/11), a revista russa Kommersant publica as opiniões de analistas e políticos russos sobre caso. Leonid Zamiatin, o embaixador da União Soviética no Reino Unido entre 1986 e 1992, acha que o caso interessa mais aos ucranianos que aos russos.
Desertor importante
“Litvinenko é um desertor importante, quer para o Reino Unido, quer para os EUA. Quando fugiu da Rússia, possuia segredos que muitos serviços de espionagem do mundo adorariam saber. Os ingleses têm o MI-5, um organismo mais sensato, que é uma rede de espiões mais ampla do que a dos americanos. Mas, provavelmente, os EUA receberam alguns dados e queriam verificá-los”, disse o ex-embaixador.
Os EUA enviaram um pedido oficial ao Reino Unido sobre o andamento do inquérito. Zamiátin conta que “não se pode esquecer que Litvinenko tinha sido demitido essencialmente por causa da Ucrânia e de Kutchmá (ex-presidente da Ucrânia), por isso a minha conclusão é que Litvinenko tinha sido mais daninho à Ucrânia que à Rússia.
Para Serguei Ivanov, vice-presidente do partido liberal Iábloko (Maçã), “a reação pública é a reação correta de uma comunidade civilizada à uma tentativa de homicídio. Quando há suspeita de os serviços secretos do outro Estado realizarem tal operação, não se pode reagir de outra maneira”, observou.
Política mais rígida
“Não é por acaso, que o Serviço de Inteligência no Estrangeiro russo (SVR) desmentiu imediatamente que esteja envolvido neste incidente. O interesse dos EUA explica-se por uma modernização da sua política em relação à nós . Os democratas vão efetuar uma política mais rigida em relação à Rússia”, acreditou o dirigente.
Outro dirigente de direita, Vladimir Jirinovski, lider do nacionalista Partido Liberal Democrático e vice-presidente da Duma, disse que “na véspera das eleições presidenciais nos EUA os partidos aproveitam qualquer pretexto para chamar a atenção”.
Campanha antirússia
O dirigente afirmou também que Boris Berezovski também estaria envolvido na intromissão americana em relação ao inquérito, pois “está buscando novas possibilidades de agravar a situação na Rússia, ao seguir um pedido da administração dos EUA”.
“Agora a campanha antirussa toma força em todo o mundo. Os americanos, como sempre, não deixarão escapar uma chance para mais uma vez chutar a Rússia. Acho que este alvaroço em torno do envenenamento é vantajoso só para um homem: Berezovsky. E, ao organizar este escândalo mundial contra a Rússia, ele dessa maneira vinga o seu fracasso como político e como homem de negócios”, opina Nikolai Leonov, membro do Comitê de Segurança da Duma e ex-chefe do Departamento de Análise do Serviço de Inteligência no Estrangeiro do antigo Comitê de Defesa do Estado (KGB).
Para Garry Kasparov, vice-campeão mundial de xadrez e atual lider do partido Frente Civil Unida, “A paciência rebentou. A comunidade ocidental começa entender que na Rússia se realiza uma ofensiva total aos que naõ seguem a política do Kremlin.
Litvinenko, que os peritos dizem ter sido envenenado com tálio ou com uma substância radioativa, foi transferido para uma unidade de tratamento intensiva e tem 50% de hipóteses de sobrevivência nas próximas quatro semanas. Oficialmente, a Rússia desmentiu qualquer envolvimento no incidente.
“Não temos nada que ver com o que aconteceu a Litvinenko”, declarou à Agência France Press o porta-voz do serviço de Inteligência , Serguei Ivanov, acrescentando que “é preciso procurar em outros círculos”.
Assassinar Bereszovsky
O FSB recusou-se, por sua vez, a fazer qualquer comentário e exigiu um pedido oficial de declarações por fax. Litvinenko, ex-agente do FSB, afirmou ter recusado, em 1998, uma ordem para assassinar o bilionário russo Boris Berezovky e foi depois preso por “abuso de poder”.
Litvinenko, de 44 anos, foi julgado à revelia por traição. Enquanto aguardava o julgamento, fugiu da Rússia e obteve a cidadania britânica. Era um dos “investigadores” do assassinato da jornalista russa Anna Politkovskaya, que fazia aberta e sistemática oposição ao governo de Vladímir Pútin.