Carlos Alberto Caó morre ao 76 anos

Faleceu neste domingo o jornalista e militante do movimento negro Carlos Alberto Caó de Oliveira. O jornalista tinha 76 anos e sua destaca trajetória política teve início no movimento estudantil da Bahia, passando pelo jornalismo e chegou ao parlamento quando foi autor da lei que tornou crime o preconceito de raça, cor, sexo e estado civil, a Lei Caó. Na Assembleia Constituinte, por emenda sua, o crime de racismo passou a ser inafiançável e imprescritível.

Carlos Alberto Cao

O jornalista, advogado e militante do movimento negro Carlos Alberto Caó marcou sua trajetória pela postura aguerrida com que defendia sua posições. Destacou-se desde os tempos em que foi líder estudantil na Bahia, depois como jornalista político e de economia trabalhou em diversos veículos de comunicação mesmo sob dura vigilância do regime militar de 1964 e no parlamento se sobressaiu, tanto na Câmara dos Deputados, como no Assembleia Nacional Constituinte, por combater o racismo e torna-lo crime.

A deputada federal Jandira Feghalli (PCdoB-RJ), através das redes sociais, prestou solidariedade aos familiares e amigo de Caó a quem definiu como “uma das principais lideranças políticas brasileiras no combate às discriminações, como o racismo” e ressaltou sua “reverenciável trajetória humanista”. O senador Paulo Paim (PT-RS) também se manifestou nas redes sociais e se disse consternado com o falecimento de Caó. Para ele “um homem de estatura universal,  militante social, brasileiro apaixonado pelo seu país”. O deputado Jean Willys (Psol-RJ) afirmou que recebia com tristeza a notícia da morte de Caó “um dos mais brilhantes membros do movimento negro do Brasil”. Para ele “é nossa responsabilidade dar continuidade ao seu legado”.

Da Bahia à Constituinte

Carlos Alberto Caó Oliveira dos Santos iniciou sua trajetória política aos 15 anos de idade em Salvador, quando tornou-se secretário da Associação de Moradores do Bairro da Federação, cargo que exerceu de 1956 a 1959. Atuando também no movimento estudantil, de 1958 a 1959 foi vice-presidente do Centro Acadêmico Rui Barbosa, do Colégio Estadual da Bahia. Em 1960, ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e, em 1962, foi eleito vice-presidente de intercâmbio internacional da União Nacional dos Estudantes (UNE). Em 1963, foi um dos organizadores do I Seminário Internacional dos Estudantes do Mundo Subdesenvolvido, realizado em Salvador. No segundo semestre daquele ano, assumiu a presidência da União dos Estudantes da Bahia (UEB), onde atuou até o golpe militar de 1964.

Perseguido pelo regime militar, Caó refugiou-se no Rio de Janeiro, onde passou a exercer a profissão de jornalista. Foi redator e editor político no jornal Luta Democrática até 1966, quando empregou-se na Tribuna da Imprensa, de onde viria a se licenciar em 1968. Também trabalhou como tradutor na Editora Civilização Brasileira. Ainda em 1966, retomou o curso de direito, transferindo-se para a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde, no ano seguinte, diplomou-se bacharel em ciências jurídicas. Em seguida, nesta mesma instituição, fez o curso de extensão em direito tributário e, em 1967, o curso de extensão em ciência política e administração da Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

A partir de 1968, ainda no Rio de Janeiro, trabalhou em O Jornal e na TV Tupi, também como redator e editor político. Foi um dos fundadores e primeiro secretário-geral do Clube dos Repórteres Políticos, entidade criada para enfrentar a censura imposta pelo regime militar.

Em função das suas atividades no movimento estudantil, respondeu a inquéritos policiais militares. Em fevereiro de 1970, foi submetido a julgamento na 6ª Região Militar, em Salvador, sendo condenado a dois anos de prisão. Permaneceu preso nesta cidade por seis meses e 15 dias, tendo sido libertado por decisão do Superior Tribunal Militar (STM), que considerou a pena prescrita.

Logo que foi libertado, retornou ao Rio de Janeiro. Demitido da TV Tupi desde o seu julgamento, continuou a trabalhar como jornalista, tendo sido forçado, contudo, a abandonar a área política. Assim, transferiu-se para a reportagem econômica, indo trabalhar no Jornal do Brasil e, em 1974, na revista Veja. Para escapar do rígido controle exercido pelo regime militar sobre o noticiário econômico, organizou com um grupo de jornalistas, no início dos anos 1970, a Associação dos Jornalistas de Economia e Finanças (AJEF), tendo presidido a entidade no biênio 1975-1976.

Em julho de 1978 foi eleito presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro, sendo reeleito em 1981, ano em que, a convite de Leonel Brizola, filiou-se ao Partido Democrático Trabalhista (PDT). Disputou as eleições de novembro de 1982, obtendo a segunda suplência do PDT na Câmara dos Deputados. Assumiu o mandato parlamentar em março de 1983, licenciando-se, no mesmo mês, para exercer o cargo de secretário de Trabalho e Habitação do primeiro governo Brizola no Rio de Janeiro (1983-1987). À frente da pasta, foi responsável pela implementação do programa Cada família, um lote — uma política habitacional alternativa à do Banco Nacional de Habitação (BNH). Permaneceu no cargo até 1986, quando foi novamente suplente na eleição para deputado federal constituinte, em novembro. Ainda em 1986, passou a integrar o diretório nacional do PDT.

Retornou à Câmara em janeiro de 1987, antes do início dos trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, em virtude da morte do deputado Giulio Caruso. Empossado como constituinte em fevereiro seguinte, foi um dos poucos parlamentares negros a participar da elaboração da nova Constituição, consagrando-se pela aprovação da emenda Caó, posteriormente regulamentada pela Lei Caó, que tornou a prática do racismo crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Além desta, conseguiu incorporar aproximadamente mais 60 emendas à nova Carta. O direito de voto para cabos e soldados, a democratização dos meios de comunicação, a definição da ruptura da legalidade democrática como crime imprescritível e o amplo exercício do direito de greve foram alguns de seus projetos de lei homologados.