MPF pediu prisão para impedir “resistência popular em defesa de Lula”

O jornal El País publicou trecho de um documento que revela que a pressa de Sergio Moro em mandar prender o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contou ainda com o reforço do Ministério Público Federal, que encaminhou pedido para que a pena fosse imediatamente cumprida porque o ex-presidente tem uma trajetória "absolutamente singular” em razão da "exitosa trajetória de vida" e "de seu carisma pessoal incomparável".

vigília em defesa de Lula - Adonis Guerra/SMABC

“Em razão de sua exitosa trajetória de vida, de seu carisma pessoal incomparável e do exercício de dois mandatos na Presidência da República, com diversos avanços na sociedade brasileira, o processo e o julgamento do réu Luiz Inácio canalizou a atenção de um número muito expressivo de pessoas, acirrando paixões e ódios”, diz o documento do MPF assinado pelo procurador da República Mauricio Gotardo Gerum.

Ele diz que a pena deveria começar a ser cumprida de forma imediata “para estancar a sensação de onipotência” de Lula, que não estaria se submetendo às decisões judiciais. Mas o ex-presidente não descumpriu nenhuma medida, apenas exerceu o seu direito constitucional de recorrer às instâncias superiores contra as decisões arbitrárias de Moro e do MPF.

Na petição do procurador conclui com um pedido expresso para que o TRF-4 oficie “com urgência ao juízo de primeira instância para o imediato cumprimento da ordem de prisão” e foi registrada no sistema do MPF às 12h17 minutos da quinta-feira (5). Às 17h31, o TRF-4 comunicou Moro sobre a autorização do início do cumprimento da pena e em apenas 19 minutos, às 17h50, emitiu o despacho de mandado de prisão contra o ex-presidente.

A assessoria de imprensa do MPF tentou explicar o documento afirmando que os argumentos do procurador visavam apenas demonstrar que eram necessário medidas excepcionais para que o tribunal gaúcho pudesse organizar uma logística especial de prisão, se assim entendesse necessário.

Como afirma o procurador, Lula tem uma trajetória notória pelos seus feitos como Presidente da República exercido por dois mandatos e que levou a reeleição de sua candidata também por dois mandatos. Não é à toa que o próprio TRF-4 decidiu transmitir o julgamento dos recursos apresentados pela defesa do ex-presidente via internet, feito nunca antes ocorrido.

Aliás, o processo do ex-presidente também teve tratamento especial pelo tribunal, com a tramitação mais rápida entre todos os 23 processos da Lava Jato julgados na Corte. Entre a decisão de Moro, que condenou Lula a nove anos e seis meses de prisão, e a data do julgamento, decorrerão cerca de cinco meses. Já nos demais processos da Lava Jato, o tempo médio de ações semelhantes foi de 15,6 meses.

Mas os fatos estranhos que cercam o processo do ex-presidente não param por aí. Horas antes do MPF encaminhar a sua petição, o presidente do TRF-4, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores, havia dito em entrevista à rádio Jovem Pan que a prisão imediata de Lula estaria afastada.

“Anuncia-se que talvez a defesa interponha novos embargos de declaração. Após o julgamento desses novos embargos, se forem interpostos, o relator do processo, o desembargador Gebran, aí sim está autorizado a comunicar o juiz Moro para eventual cumprimento da decisão do Tribunal que foi tomada no dia 24 de janeiro desse ano”. Thompson Flores completou: “Acredito que isso aí deve ser examinado no máximo em 30 dias como foram os embargos anteriores”.

“Manipulatório de massas”

Na petição do procurador Gerum ele classifica as caravanas de Lula pelo país e as manifestações de apoio que ele recebeu como “movimentos manipulatórios das massas” e que por isso não se poderia perder tempo em prendê-lo, caso contrário a "uma resistência popular em defesa do ex-presidente" poderia impedir a sua prisão.

“Assume especial importância a presteza no início do cumprimento da pena, não só para estancar essa sensação de onipotência, mas também para evitar que esses movimentos manipulatórios das massas atinjam níveis que tragam dificuldades extremas para fazer valer a lei penal”, defende o procurador.

Ele não para por aí. Demonstra que Lula representa uma ameaça por "sua grande capacidade de articulação política para enfrentar, de forma ostensiva e acintosa, a ação penal e as condenações que sofreu".

Em seu texto, Gerun menciona reportagens publicadas em jornais brasileiros nas quais o ex-presidente denuncia que está sendo vítima de uma perseguição política e também sublinha trechos da nota emitida pelo PT após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que negou um pedido de habeas corpus preventivo. O procurador diz que ficou impressionado “especialmente” por haver declarado que a “Constituição foi rasgada por quem deveria defendê-la e a maioria do STF sancionou mais uma violência contra o maior líder popular do país, Lula’, dizendo ainda que ‘a maioria do STF ajoelhou-se ante a pressão escandalosamente orquestrada pela Rede Globo’”.