Edvaldo (PCdoB) fala da posse em Aracaju e campanha de Déda
Nesta sexta-feira (30), o PCdoB terá seu primeiro prefeito de capital em 84 anos de existência. Edvaldo Nogueira, vice-prefeito de Aracaju, assume a cadeira deixada por Marcelo Déda, do PT, que sairá candidato ao governo de Sergipe, numa festa onde se esp
Publicado 29/03/2006 14:50
Junto com o prefeito petista, Nogueira ajudou a fazer de Aracaju a capital nordestina com maior IDH (Índice de Direitos Humanos); e a dobradinha PT-PCdoB alcançou a aprovação de mais de 70% da população. “A chegada à prefeitura de um comunista nos deixa num misto de expectativa, alegria e esperança porque é a chance de darmos continuidade a esse trabalho que desenvolvemos nesses cinco anos", opina Edvaldo. Veja a entrevista.
Vermelho: Nesta sexta-feira, você assume a prefeitura de Aracaju. O que isso significa para a cidade e para os comunistas?
Edvaldo Nogueira: Do ponto de vista da militância, há um clima de muita expectativa e diria que, pelo que pude perceber, de alegria por parte da população aracajuana. Isso porque a minha posse na prefeitura de Aracaju tem duplo significado, por ser também o lançamento da candidatura do Marcelo Déda (PT), a pré-candidatura ao governo do estado. E esses dois fenômenos, a perspectiva da eleição de Déda para governador e a minha chegada à prefeitura de Aracaju, são rios que correm na mesma direção.
Depois da ditadura, não houve ainda experiência desses setores mais democráticos governarem Sergipe. As elites se revezaram durante todos esses anos. Então, pela primeira vez surge essa oportunidade. E numa coligação liderada por PT, PCdoB, PSB, PTB e PL, em que o núcleo central é PT, PCdoB e PSB. Esta possibilidade é um avanço muito grande para o estado desde 1962, quando o último governador progressista, Seixas Dória, se elegeu e foi deposto pela ditadura militar. Miguel Arraes, em Pernambuco, e Seixas Dória, em Sergipe, são os dois únicos governadores depostos pela ditadura. Portanto, é um momento muito importante.
Vermelho: Como foi o trabalho junto com Déda na administração municipal?
Nogueira: Por meio da aliança entre PT e PCdoB, Déda e eu conseguimos realizar um grande trabalho em todos os aspectos da cidade. Em Aracaju é visível a transformação, desde a limpeza pública, a pavimentação, até saúde, educação, transporte, moradia. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, Aracaju é a primeira capital do Norte e Nordeste em qualidade de vida. E é a maior renda per capita da região. É uma cidade que deu um salto muito importante e se tornou referência por isso.
O fato de a administração ter uma aprovação alta e a possibilidade de derrotar as elites por meio da candidatura de Déda criam um clima de muita determinação e muita esperança na população aracajuana. E a chegada à prefeitura de um comunista nos deixa num misto de expectativa, alegria e esperança, porque é a chance de darmos continuidade ao trabalho que desenvolvemos nesses cinco anos. É um momento importante na vida da cidade, do estado e do Partido.
Vermelho: Quais são os níveis de aprovação da população à administração Déda/Edvaldo?
Nogueira: São níveis muito altos. Pesquisa recente mostra que a administração teve 77% de aprovação. Além disso, ganhamos as últimas eleições com 72% dos votos. Foi a maior votação proporcional à reeleição. Na primeira eleição, em 2000, tivemos 52% dos votos e ganhamos no primeiro turno.
Vermelho: Sua administração será uma continuidade da de Marcelo Déda?
Nogueira: No meu entender, temos de dar continuidade — porque conseguimos fazer um projeto global na administração de Aracaju. Foi um governo de realizações sociais, um governo que se preocupa com a beleza física da cidade, com a construção de praças, de escolas, a limpeza pública, mas também com o social, a saúde e a educação.
Havia um entendimento de que a área social só seria educação, assistência social e saúde. Nós mudamos um pouco esse parâmetro. Realizamos muitas obras de que a cidade necessitava. Duzentos quilômetros de recapeamento asfáltico foram feitos, um número muito grande se comparado com o tamanho da cidade. Nós praticamente refizemos todo o eixo viário de Aracaju. Melhorou sensivelmente o transporte coletivo e o tráfego na cidade. Hoje, a limpeza pública tem um mesmo padrão tanto na zona mais rica como na zona mais pobre. É um padrão de excelência da limpeza.
Na área da saúde fizemos uma grande transformação: hoje Aracaju tem 90% de cobertura de Programa Saúde da Família. Construímos 10 novos postos de saúde e reformamos outros 40. Aracaju foi a quarta cidade brasileira a criar o Samu, sistema de urgência e emergência. E agora implantamos o projeto, pioneiro no Brasil, do hospital horizontal: não construímos prédios, mas estabelecemos em hospitais filantrópicos a presença da prefeitura. Vamos inaugurar dois pronto-socorros nas zonas sul e norte, que vão fechar o ciclo da saúde no município de Aracaju. Reduzimos a mortalidade infantil neonatal em aproximadamente 37% e melhoramos todos os índices de saúde na cidade.
Na educação diminuímos a evasão escolar, a repetência e praticamente zeramos o déficit educacional. Sentimos que democratizamos a educação. Agora estamos nos concentrando na idéia de dar mais qualidade ao ensino. Outra mudança que implantamos é a eleição para o cargo de diretor nas escolas municipais. Ou seja, já não é mais o prefeito quem nomeia; a escolha é feita pelos estudantes e pela comunidade através de eleições diretas. Temos os Conselhos Escolares e descentralizamos os recursos para a escola. A escola tem uma parte de recursos que o próprio diretor administra, para as pequenas obras, para as coisas essenciais do dia-a-dia da escola. A merenda é muito eficiente, inclusive utilizando os gêneros regionais. Isso melhora também o comércio, porque se compra lá mesmo a comida, nas empresas locais, gerando emprego e renda.
Na área habitacional, em parceria com a Caixa Econômica Federal, desenvolvemos um programa chamado Parque de Arrendamento Residencial, dentro do qual seis mil casas serão entregues neste mês. Este foi um passo muito importante para a população, porque tínhamos um déficit habitacional alto na classe mais pobre. É um grande feito. Inclusive o presidente Lula esteve no dia 15 em Aracaju para inaugurar um conjunto residencial com 500 unidades habitacionais dessa parceria com a Caixa.
Investimos também na geração de emprego e renda, na formação de mão-de-obra, nos bancos de emprego. E entramos também nessa área de convênios com os bancos federais, de empréstimos pequenos, de até R$ 30 mil para pequenas e médias empresas e pequenos empreendedores.
Nesses cinco anos, conseguimos organizar quase dois mil vendedores ambulantes, que foram cadastrados, profissionalizados, uniformizados e aprenderam outros idiomas e noções de turismo, principalmente para os que trabalham nas praias e pontos turísticos.
Vermelho: Como é tratada a questão do uso do dinheiro público na administração de Aracaju?
Nogueira: O dinheiro público é tratado com muita seriedade e aplicado exclusivamente no âmbito público. Não houve nenhuma denúncia, nesses cinco anos, nenhum fato concreto de corrupção. Isto mesmo com adversários ferrenhos e uma imprensa que basicamente é da oposição, que controla 80% dos meios de comunicação em Aracaju.
Um fato importante também é que nós conseguimos triplicar o orçamento de Aracaju. Quando nós chegamos à prefeitura municipal, o orçamento de 2001 era de R$ 160 milhões. Hoje é de R$ 545 milhões. E sem aumentar os impostos. Pelo contrário, nós reduzimos o IPTU. Em 2001 havia quatro mil famílias isentas do IPTU. Hoje, são mais de 40 mil famílias. Nós conseguimos melhorar essa situação porque cobramos os impostos daqueles que podiam pagar, fizemos uma política de dureza fiscal para os que sonegam, os que não gostam de pagar imposto, para os ricos e os incorporadores. Conseguimos melhorar muito a arrecadação municipal, sem penalizar a população mais carente, inclusive isentamos essa população de impostos e de taxas. Não criamos nenhum novo imposto. Aracaju se tornou uma cidade auto-sustentável. O dia-a-dia da administração, a limpeza pública, a saúde, a educação, o funcionalismo público e obras pequenas nós conseguimos fazer com recursos próprios.
Vermelho: O que foi feito no âmbito cultural?
Nogueira: Houve a recuperação das tradições culturais do município de Aracaju, outra preocupação da nossa gestão. Fizemos com que o forró – grande carro-chefe da cultura sergipana – ganhasse mais destaque. O Forrocaju hoje consegue competir com Caruaru e Campina Grande, que é considerada o melhor São João do Brasil. São 13 dias de festa (de 17 a 31 de junho), com os grandes nomes da música popular. E não deturpamos o forró, como muitos estados fizeram. O nosso é um forró original, pé de serra, como chamam, mas, ao mesmo tempo, um forró que dialoga com outras culturas. Tem a lei de incentivo à cultura também, que nós revitalizamos. Vários projetos foram colocados em prática através dela e isso foi um passo muito grande na área cultural em Aracaju.
Vermelho: Como vice-prefeito, você teve participação efetiva na administração?
Nogueira: Conseguimos fazer um governo em que o prefeito Marcelo Déda dirigia politicamente, mas nós, o PCdoB, eu como vice-prefeito e o secretário de governo, tivemos uma participação efetiva. Tivemos, o que não é comum na administração pública, uma sincronia muito grande, um trabalho realmente em conjunto entre PT e PCdoB e entre Déda e eu. Portanto, o sucesso da atual administração tem também a força e a participação efetiva do PCdoB. Vamos dar continuidade ao que foi começado, mas obviamente, colocarei minha maneira de administrar. A idéia é de fortalecer cada vez mais esse modelo administrativo.
Vermelho: Como é a oposição a vocês?
Nogueira: Nosso principal opositor é o PFL, o governador João Alves Filho. Inclusive, ele é candidato à reeleição. Já foi o seu terceiro mandato como governador e, agora, está querendo conquistar o quarto. É um político da cúpula nacional do PFL, já foi ministro do Interior do governo Sarney. Um político que tem uma grande liderança, embora sempre tenha feito governos que beneficiaram as elites.
Sergipe é um estado que poderia estar em melhores condições não fosse o governo desastroso, antipopular, reacionário e antidemocrático de João Alves. Ele quer continuar esse projeto para impedir o avanço da esquerda em Aracaju e em Sergipe. Portanto, a batalha eleitoral será grande. É uma luta incessante contra o PFL em Sergipe. Por isso, é importante a vitória de Déda no governo do estado. Com ele no governo e com a experiência que tive na vice-prefeitura nesses dois anos e nove meses, poderemos fazer parcerias e projetos com os quais tanto Aracaju quanto o estado serão beneficiados.
Vermelho: Aracaju é uma cidade que tende para o conservadorismo?
Nogueira: Não. Historicamente Aracaju é uma cidade progressista. Em 1946, Yedo Fiúza, candidato do Partido Comunista, ganhou aqui as eleições contra o general Eurico Gaspar Dutra. Acredito que seja a única capital brasileira em que o Partido Comunista ganhou uma eleição. E Luis Carlos Prestes foi o senador mais votado em Aracaju.
É a primeira cidade do Brasil que foi planejada para ser capital, antes de Belo Horizonte, Teresina e Palmas. A capital de Aracaju, até 1855, era São Cristóvão. O governador da época, Inácio Barbosa, por uma série de questões políticas e econômicas, conseguiu transferir a capital de São Cristóvão para Aracaju, uma cidade que tem características muito progressistas e avançadas. Uma cidade que, apesar de pequena, de estar no menor estado da Federação, tem um traço forte: depois da redemocratização, as elites nunca ganharam a prefeitura de Aracaju. Sempre são partidos de oposição ao modelo conservador.
Vermelho: Como deverá ser a sua gestão à frente da prefeitura?
Nogueira: Penso basicamente em duas etapas. A primeira, de transição, vai até o final do ano. Nela, vamos trabalhar para continuar esse projeto que vem sendo colocado em prática por Déda nesses cinco anos. E dela faz parte a tarefa política de apoiar Déda em sua candidatura ao governo do estado. Esses elementos vão constituir essa primeira parte.
A segunda será a partir de janeiro de 2007, quando se inicia um novo processo também de gestão administrativa, na qual a nossa marca, a nossa ação, será mais visível. Neste ano, temos que lutar também para o sucesso de uma tarefa política de envergadura: a reeleição de Lula, sem, com isso, partidarizar a prefeitura ou usar a máquina pública.
De São Paulo,
Priscila Lobregatte