A Compreensão da Essência Humana na Teoria Marxiana (parte I )

Em a Ideologia Alemã Marx e Engels afirmam:  “Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo que se queira. Mas eles próprios começaram a diferenciar–se dos animais t&atilde

A Compreensão da Essência Humana na Teoria Marxiana (parte I )

São muitas as definições que buscam respostas às questões, o que é o homem, qual sua essência e o que o diferencia dos demais animais. Alguns pensadores buscam responder essas interrogações com um conteúdo essencialmente metafísico, utilizando-se da razão e da religião, retirando  do homem  seu leito histórico, além de desconsiderar suas origens biológicas.

Marx e Engels criticaram categoricamente essa abordagem, desconstruindo – a através da introdução de uma visão histórica do desenvolvimento humano, que começa a ser definida à medida que este produz suas condições de existência, distinguindo-se assim dos demais animais. Em a Ideologia Alemã Marx e Engels afirmam:  “Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo que se queira. Mas eles próprios começaram a diferenciar–se dos animais tão logo começaram a produzir seus meios de vida. (…) Produzindo seus meios de vida, os homens produzem, indiretamente, sua própria vida material”.1

Em Marx e Engels há a rejeição do determinismo de uma essência humana constituída aleatoriamente aos fenômenos objetivos em desenvolvimento, afirmada por espécie animal mais razão. O homem é construtor da história e numa relação dialética com a natureza, resultado da mesma. Ainda em a Ideologia Alemã dizem: “A história nada mais é do que a sucessão de diferentes gerações, cada uma das quais explora os materiais, os capitais e as forças de produção a ela transmitida pelas gerações anteriores; ou seja, de um lado prossegue em condições completamente diferente a atividade precedente, enquanto, de outro lado, modifica as circunstâncias anteriores através de uma atividade totalmente diversa.”2

A teoria marxiana do papel do trabalho na definição da formação humana, não pode ser analisada como a auto-produção do homem pelo trabalho como princípio auto-suficiente, mas deve levar em consideração o acúmulo e desenvolvimento anterior, o que permitirá, ser este, sujeito de um processo universal, e sua história depende dos meios encontrados, sendo inerente à sua existência a necessidade de desenvolvê-los. Sua universalidade é o conteúdo da própria história.

Em Marx o homem é visto como parte integrante da natureza, produto da mesma e, enquanto ser natural, prescinde da natureza, tendo como pressuposto a sua própria natureza, ou seja, a natureza de seu organismo. Ao analisar o homem enquanto parte da natureza, MARX (1989:164 e 1987:206), no primeiro e no terceiro dos Manuscritos de 1844, afirma: A natureza é o corpo inorgânico do homem, isto é, a natureza na medida em que não é o próprio corpo humano.

O homem vive da natureza, quer dizer: a natureza é o seu corpo, com o qual tem de manter-se em permanente intercâmbio para não morrer. Afirmar que a vida física e espiritual do homem e a natureza são interdependentes significa apenas que a natureza se inter-relaciona com ela mesma”. “O homem é imediatamente ser natural. Como ser natural, e como ser natural vivo está, em parte, dotado de forças naturais, de forças vitais, é um ser natural ativo; estas forças existem nele como disposição e capacidades, como instintos; em parte, como ser natural, corpóreo, sensível, objetivo, é um ser que padece, condicionado e limitado, tal qual o animal e a planta; isto é, os objetos de seus instintos existem exteriormente, como objetos independentes dele; entretanto, esses objetos são objetos de seu carecimento, objetos essenciais, imprescindíveis para a efetuação e confirmação de suas forças essenciais”.

O homem é parte da natureza, inseparável dela, portanto é um ser vivo que possui limites, está condicionado como qualquer outro ser vivo as leis gerais da natureza. A satisfação de suas necessidades não pode ser atendida fora dos limites de seu intercâmbio com a natureza.

Esta também só pode ser atendida com um passo à frente de sua condição meramente animal, visto como a produção de seus meios de vida, que ao serem produzidos geram novas necessidades e conseqüentemente nova ação, caracterizando não um ato, mas um processo contínuo, gerador de uma cultura humana.

Para o filósofo húngaro Gyorgy Markus (1974ª:53/54) os elementos constitutivos de uma resposta sobre o que é o ser humano,“(…) terá que indicar propriedades que, por uma parte, fundamentem a unidade do gênero humano e, por outra, expliquem sua diferença em relação a todas as demais espécies do mundo vivo".
A  resposta sobre o que é a essência do homem transcende os elementos dos traços comuns humanos comparativos a outras espécies. A história humana coloca-se para além de  características instintivas, biológicas, os meios encontrados são variados, as relações sociais que determinam o alcance de suas possibilidades variam. A apropriação da cultura anterior dada não se dá por vontade própria, mas construída objetivamente. Para Leontiev (1978b: 274) os traços que definem uma espécie podem ser abstraídos do estudo de alguns representantes da espécie, visto que essas características fundamentais são encontradas em todos. 

Mas a espécie humana possui um grau de complexidade acentuado, "A unidade da espécie humana parece ser praticamente inexistente, não em virtude das diferenças de cor e pele, da forma dos olhos ou quaisquer outros traços exteriores, mas sim das enormes diferenças nas condições e modos de vida, na riqueza  da atividade material e mental, do nível de desenvolvimento das formas e aptidões intelectuais."

Os homens possuem traços comuns que os definem enquanto espécie, o que a natureza permite a outras espécies. Como parte integrante da natureza, exerce a priori sobre ela, ações que o caracteriza como ser animal, natural. Em um momento posterior, no processo já acima citado de objetivação e apropriação, este desenvolve ações genéricas, parte integrante de seu processo histórico, desenvolvendo um quadro objetivo dado. Faz evoluir assim, nas condições de seu tempo, seu processo histórico – cultural. O processo histórico de humanização vai definindo o lado humano numa relação de autodesenvolvimento da cultura herdada, estabelecendo neste transcurso os elementos que constituem o gênero humano.

José Rodrigues da Silva

Graduado em filosofia, Secretário de Formação do Comitê Estadual do PCdoB – Minas Gerais.

Notas
(1)   MARX e ENGELS. A Ideologia Alemã. Tradução de José Carlos Bruni e Marco Aurélio Nogueira.São Paulo, Editora HUCITEC,1996 pg.27.
(2)   Idem, p.70