Cineasta chinês rebate Ang Lee e elogia política estatal

Um dos melhores debates culturais na China ocorreu neste domingo (19/06), segundo dia do Festival Internacional de Cinema de Xangai. Os diretores Ang Lee e Feng Xiaogang discutiram a política cultural do Estado chinês. Cooptado há mais de 30 anos pe

A China é um dos poucos países do mundo em que a indústria norte-americana não sufoca nem contamina as produções locais. Um dos segredos é a corajosa política adotada pelo governo comunista chinês, que valoriza o cinema nacional e combate vigorosamente a hegemonia de Hollywood e o imperialismo cultural. Convém frisar que o país cede espaço, sim, a filmes americanos, mas sem pasteurizar seu próprio mercado.

As críticas do Ocidente —  ao qual Ang Lee se alinhou — não impediram o êxito do 9º Festival de Cinema de Xangai. Astros e estrelas do mundo cinematográfico marcam presença. Nunca a participação de personalidades e filmes estrangeiros foi tão maciça. De quebra, é a maior e mais elogiada edição do evento, ainda que as agências de notícias prefiram lembrar que se trata do “mais jovem e modesto [festival de cinema] do mundo dentro da classe A”.

Neste ano, os organizadores também comemoram o 85º aniversário do Partido Comunista Chinês. A maior agremiação partidária do mundo foi fundada em 1921, numa reunião realizada, curiosamente, a poucos minutos a pé do salão onde aconteceu a abertura do festival.

Os porquês do controle estatal
Claro que quem aderiu à indústria americana e visa ao lucro só tem a reclamar da China. É o caso de Ang Lee, diretor dos fracos Hulk e O Segredo de Brokeback Mountain, mas do interessante O Tigre e o Dragão. Na entrevista concedida neste domingo, Lee ousou dizer que a China precisa aprender com Hollywood, se a cidade quiser voltar à fase áurea dos anos 30.

O cineasta, nascido em Taiwan e radicado nos Estados Unidos desde os anos 1970, só não explicou por que o cinema americano está em crise há três anos, com queda crescente de público. Como se a soberania e a autodeterminação dos povos não fossem importantes para superar os dilemas da globalização, Ang Lee disse que “o orgulho nacional não deve vir em primeiro lugar”.

Mais coerente, o diretor Feng Xiaogang, um dos mais populares na China, saiu em defesa do controle estatal: “Não tenho medo de Hollywood!”. O cineasta ainda atacou diretores treinados nos Estados Unidos, como Zhang Yimou, Chen Kaige e Tian Zhuangzhuang, que “parecem ter esquecido como se conta histórias a seu público nativo”.

“Eles tentam ser tão vagos quanto possível”, argumentou Feng”. “Na verdade, acho que desprezam o cinema que conta histórias. Certos filmes de Ang Lee são profundos demais para meu gosto e acrescentam pouco ao cinema.”

Feng compara à política cultural chinesa à preocupação dos cineastas coreanos com a concorrência de Hollywood. Recentemente, o governo da Coréia do Sul aumentou a cota de filmes estrangeiros — o que prejudicou sensivelmente a produção local. “Determinadas restrições”, observou o diretor, “são necessárias para a proteção cultural”. A única contrapartida, segundo ele, é que, “se isso for levado ao exagero, os diretores chineses ficarão preguiçosos”.

Filmes ocidentais ficaram proibidos na China até 1994. Oito anos depois, para entrar na Organização Mundial do Comércio (OMC), o país teve de elevar a cota de filmes estrangeiros exibidos em seus cinemas.

Por André Cintra, da redação,
com dados de agências internacionais