Aldo adapta Câmara dos Deputados ao sentimento do povo

Em setembro passado, Aldo Rebelo (PCdoB-SP) se elegeu presidente da Câmara dos Deputados, com o apoio do governo federal. Era a primeira vez que um comunista atingia o terceiro cargo da República, atrás apenas do presidente e de seu vice. Um ano depois, o

Em setembro, completa-se um ano de sua presença na presidência da Câmara dos Deputados. Alguns analistas avaliam que sob sua direção a Câmara dos Deputados se reergueu e recuperou seu importante papel à frente da política brasileira. Qual seu balanço faz deste período, indicando pontos positivos e negativos?
Uma dificuldade neste processo é o foco por demais seletivo lançado sobre o Parlamento. Nossas deformidades são muitas, mas seguramente não são maiores que as virtudes. Cumpre compreender que o Parlamento é maior que seus integrantes. As críticas, nem sempre justas, às vezes procedentes, deveriam atingir os homens, não a instituição. Os parlamentares passam, mas o Congresso sempre se engrandece em sua permanência altiva na História do Brasil. Nenhuma instituição é tão aberta, e por isso facilmente fiscalizada quanto o Legislativo. Vivemos grandes turbulências, mas tenho a esperança de que o Congresso se fortaleça como pilar insubstituível da democracia. O aspecto mais positivo dessa crise foi a demonstração de que temos instituições democráticas sólidas, que necessitam de aprofundamento e aperfeiçoamento, mas já fortes o suficiente para impedir golpes de Estado, que sempre foram o atalho usado para se abater qualquer projeto de governo de tendência nacional e popular no Brasil.


 


Este foi um período difícil, com forte exposição do Congresso Nacional, acusações contra parlamentares e campanha negativa na imprensa. Mesmo assim, pesquisas recentes apontam para uma recuperação da imagem do Congresso brasileiro – a aprovação teria subido, segundo o Datafolha, de 13% para 17% entre julho e agosto, e a reprovação teria caído de 40% para 37%. Isto é, melhorou. A que atribui esse desempenho?
Problemas antigos, varridos para baixo do tapete na poeira dos tempos, vieram à tona nesta legislatura. Mas o Congresso já tinha avaliações oscilantes. Ocorre que a temporada de caça à política é um fenômeno mundial. Uma das pregações deletérias da globalização e sua ideologia, o neoliberalismo, é que fora do mercado não há solução para nada. A política é dada como superada, uma atividade inútil. A democracia representativa, em particular, tem sofrido um bombardeio ideológico mais corrosivo que napalm num campo de palha seca. Quando assumi a presidência da Câmara estava sendo divulgada uma pesquisa do Instituto Gallup, feita com 50 mil pessoas em 68 países, revelando que 65% dos entrevistados “não acham que seu país é governado pela vontade popular”. A desconfiança ronda os parlamentos do mundo. O caso dos Estados Unidos, pela proximidade e influência, merece atenção. Somente 27% dos norte-americanos aprovam o seu Congresso, enquanto 67% o desaprovam.


 


Em que pé está o programa de racionalização e redução dos gastos da Câmara dos Deputados?
Cortamos, só no ano passado, R$ 134 milhões de despesas com publicidade, divulgação institucional, limitação das viagens e missões oficiais, adiamento de admissões e contratação de pessoal. E agora acabamos de cortar mais R$ 10 milhões de verba publicitária. Já conseguimos também uma redução de 40% no total pago de hora extra apenas com uma pequena mudança na regra. Conseguimos também eliminar o pagamento extra em caso de convocação extraordinária da Câmara e do Senado, quando os parlamentares precisam permanecer trabalhando no período de recesso. Tudo isso são reformas com sentido de adaptar a Câmara aos novos tempos, torná-la mais ágil e mais conectada com o sentimento da população.


 


A Câmara dos Deputados tem enfrentado algumas questões polêmicas. Uma delas é o voto secreto nas votações em plenário. Qual é a perspectiva de aprovação final do voto secreto para todas as ocasiões? E qual sua opinião sobre essa questão?
O voto secreto cumpriu o papel de proteger o Parlamento do arbítrio do Executivo, assegurando ao legislador autonomia para votar contra quem tivesse poder de retaliação. Foi assim desde que este instituto passou a figurar na Constituição de 1824. Atualmente, o ambiente de liberdades democráticas que desfrutamos dispensa a salvaguarda. Aprovada a mudança na Constituição, as Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais poderão mudar seus regimentos e universalizar o voto aberto. A imunidade parlamentar permanecerá como um penhor da inviolabilidade do deputado ou senador por suas idéias, palavras ou votos. Mas a matéria está agora em análise no Senado e precisamos aguardar o final da tramitação.


 


Mas o grande tema é a reforma política, presa entre a necessidade sentida por muitos de ampliar a democracia, e a demanda de alguns setores de criar restrições ao funcionamento dos partidos políticos, consolidando por exemplo a cláusula de barreira. Em sua opinião, qual é a tendência, neste ponto, na próxima legislatura?
A reforma política, ao contrário do que muitos pensam, não é fácil, mas um pacto social complexo. Trata-se de regulamentar as relações entre os representados e os representantes no regime democrático. O representado não é apenas o eleitor individualizado, mas também as classes e camadas sociais diversas, os interesses conflitantes, os matizes ideológicos que permeiam a sociedade organizada. A grande inovação legislativa que tivemos foi o Código Eleitoral de 1932, que em essência está em vigor até hoje. O Brasil tem pouco tempo de pluripartidarismo e muita gente considera que existem partidos em demasia no quadro nacional. Mas acredito que tem correntes de pensamento no País que não ficariam representadas com a adoção dessa cláusula de barreira de 5% dos votos prevista para entrar em vigor esse ano. Mas qualquer alteração dessa regra teria de passar pelos grandes partidos porque não se conseguiria nem apoio político nem numérico somente com os partidos menores. Como presidente da Câmara, só colocaria esse tema em debate se houvesse um acordo amplo sobre a necessidade de se repensar a regra.


 


Outro ponto de enorme interesse é a retomada do desenvolvimento e do crescimento econômico. A Câmara dos Deputados já havia tomado a iniciativa, neste ano, de promover um Seminário sobre o Desenvolvimento. Em que sentido a Câmara dos Deputados pode ter um papel ativo na implantação de um programa de desenvolvimento para o país?
O Legislativo, em consonância com a sociedade, pode melhorar a legislação para ajudar a abrir caminho ao desenvolvimento, seja removendo a burocracia, seja desonerando a atividade produtiva, como estamos fazendo ao aprovar a Lei Geral das Micros e Pequenas Empresas. Em 2007 teremos de examinar com mais realismo a legislação ambiental, que vem sendo usada para travar o início de numerosos projetos em setores essenciais, como o de energia. A perspectiva é que apenas a aprovação da Lei Geral, que unifica impostos federais no Supersimples, pode gerar mais de 6 milhões e R$ 10 bilhões de recursos adicionais. Hoje temos mais de 5 milhões de pequenas e micro empresas no País, responsáveis por 60% dos empregados formais e 20% do nosso Produto Interno Bruto (PIB).


 


Há também a proposta, do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, de uma Lei de Responsabilidade Social, para estimular políticas de manutenção dos direitos humanos e reduzir as desigualdades sociais. Ela tem apoio no Congresso?
Todas as propostas que têm o objetivo de tornar o Brasil um País mais justo e igualitário, com melhores condições de vida material e espiritual, são positivas e merecem nosso apoio.


 


Outra proposta polêmica é a do projeto de lei 73/99, que cria cotas raciais no ensino superior. Em resposta à polêmica criada, já se falou em cotas sociais, em lugar de raciais. Qual sua opinião a respeito?
As cotas quase foram aprovadas nas comissões, em caráter terminativo, sem votação em plenário, mas houve um consenso de que um assunto tão controverso deveria ser decidido pelo conjunto dos deputados. Talvez possamos evoluir para privilegiar as cotas sociais. São mais universais e compatíveis com a formação do povo brasileiro, baseada na miscigenação.


 


Para finalizar, seu nome está no páreo, este ano, disputando um novo ao mandato de deputado federal numa situação nova, que decorre de sua forte visibilidade alcançada por seu desempenho como líder do governo na Câmara dos Deputados, ministro da Coordenação Política do governo Lula e, agora, presidente da Câmara dos Deputados. Como vai sua campanha este ano?
Procuro fazer, mais uma vez, a campanha modesta que sempre fiz: baseada em idéias e projetos para o Brasil.


 


Por José Carlos Ruy