Campanha Alckmin já busca o culpado; será o marqueteiro?

Por Adalberto Monteiro
A campanha de Alckmin sequer vai ter uma derrota honrada, pois que as lideranças da direita já se põem a analisar o fracasso mesmo antes do fim confronto. E explicar a derrota de Alckmin que se prenuncia acachapante tão somente p

É correto o preceito de que vitória não se canta antes da hora. A história registra candidatos que dormiram favoritos e acordaram derrotados. Mesmo um favorito precisa lutar até o último minuto. Derrota, mesmo que seja quase certa, também, não se reconhece com a batalha ainda acesa. Mas, a campanha de Alckmin sequer vai ter uma derrota honrada, pois que as lideranças da direita já se põem a analisar o fracasso mesmo antes do fim confronto. E alguns mais afoitos precipitadamente se lançam à procura de um culpado. Mais do que depressa tratam de jogar na panela o marqueteiro da campanha, o jornalista Luiz Gonzalez.



Mas, será o marqueteiro o culpado?



O senador Álvaro Dias diz que sim. Segundo ele, a campanha tratou de modo insuficiente o tema da corrupção. E devia ter batido mais. O prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, já apresentou uma sintética, porém incisiva análise. Diz que o marketing  errou ao tentar igualar Alckmin a Lula no papel que do que ele denomina de “prefeito do Brasil”. ACM também deu o seu parecer, colocando azeite de dendê na panela em que foi atirado o pobre do marqueteiro.



É certo que a campanha do PSDB-PFL chega ao fim com um candidato desfigurado, padecendo de crise de identidade.



Para começar qual é mesmo o nome do candidato? Geraldo Alckmin, um alinhado sábio grão-tucano? só Alckmin, como prefere a imprensa? ou simplesmente Geraldo, o humilde médico de Pindamonhangaba, como no programa de TV?



Qual é sua índole? É um político agressivo, estilo “Tyson” do debate da Bandeirantes? ou o personagem relativamente cordato do debate do SBT? Que Alckmin subirá na arena da Globo na noite de hoje (27), o primeiro, o segundo, ou a mistura de todos eles?



Qual é seu programa, quais são suas idéias? Primeiro, pressionado pela campanha de Lula, ele botou na cabeça o boné do Banco do Brasil, vestiu uma jaqueta com as logomarcas das estatais, e jurou que não iria privatizar. No momento seguinte, recebeu uma pressão do mercado, a revista Veja passou-lhe um carão público, e ele voltou atrás. Tirou o boné do BB da cabeça, jogou a tal jaqueta bem longe. Disse em alto e bom som que errou por não ter desde o início feito a defesa da privataria de FHC e que se “precisar privatizar, a gente privatiza”.



Em relação aos gastos públicos bem lá no início da campanha, Alckmin entra em cena atacando “a gastança” do governo e dizendo que era preciso aumentar a eficiência do Estado, que segundo ele teria sido “inchado” pela gestão de Lula. O professor Nakano, um dos seus principais assessores, defendeu um corte de mais 60 bilhões de reais nos gastos públicos. Foi desautorizado e “expulso” da sala. O mestre foi reduzido a um aluno mal-comportado. Neste particular, qual é então mesmo a proposta do tucano?



Essa dubiedade programática levou Alckmin a fazer uma campanha esquizofrênica. Em determinados momentos foi um neoliberal envergonhado ou dissimulado. Em outros, tomado de euforia, rezou por inteiro o credo liberal.



Na maior parte da campanha, Alckmin rendeu-se ao programa de seu adversário. “Eu vou não só vou manter, mas melhorar o Bolsa Família”; “Eu vou manter o Prouni, a Zona Franca de Manaus”… Em outras palavras: se eleito ele daria continuidade com mais eficiência aos atuais programas do governo federal. Se é assim, o eleitor tinha e tem todos os motivos para escolher o próprio Lula para dar seguimento ao que já existe.



Alckmin esbarrou no senso crítico do povo



Explicar a derrota de Alckmin, que se prenuncia acachapante, tão somente por eventuais erros de comunicação da campanha é um escapismo oportunista. O marqueteiro até que fez por onde. Ninguém dava nada pelo “picolé de chuchu” e olha que a criatura adquiriu alguma vitalidade. O problema não é esse.



O bombardeio da mídia e o marketing da campanha Alckmin esbarram no senso crítico do povo brasileiro, que se elevou. A mídia usou e abusou da manipulação, fez talvez a maior campanha de desmoralização contra um presidente em toda a história da República, e ao se exceder mostrou “os fundos”, quebrou o mito da isenção, escancarou a parcialidade.



Será o marqueteiro o culpado? Explicação simplista. A provável reeleição de Lula terá muitos significados e conseqüências históricas. Entre elas: a arrogância e a pretensão do aparato midiático de ser o tutor e dono da consciência do povo foram derrotadas. O povo fez sua escolha, optou por um caminho oposto ao que lhe ordenavam os chamados formadores de opinião. Estamos diante de uma boa nova: “os de baixo” caminham em direção oposta a que lhes ordena a mídia dos de “cima”.



Tentar jogar a culpa no marqueteiro, na forma e no conteúdo do programa de TV, é buscar ocultar o real motivo da derrota tucana: a nação, em sua maioria, pobres e ricos, diplomados e pouco escolarizados, brancos, negros, índios, mestiços, rejeitou o programa neoliberal do PSDB e do PFL. Sentindo essa rejeição, a campanha de Alckmin “amarelou”. O tucano encurtou o bico e mudou a cor das penas.



Parece aquela fábula do macaco que tentou entrar numa festa no céu camuflado de outro bicho. Chegou a atravessar a linha da porta. Mas, deixou o rabo de fora e foi desmascarado.



Não é à toa que FHC, nos jornais de hoje (27), conclama os tucanos “a ser mais enérgico na defesa de suas crenças” (Leia-se: privatizações e tudo mais). Acontece que as crenças dos tucanos estão em baixa. FHC é a “Carolina” do PSDB: o tempo passou na janela, e só ele não viu. Fala e age como se vivesse nos anos 90, era da ditadura do pensamento único.



A causa real da derrota é essa: o povo aprovou governo Lula, avaliou que o governo dele foi melhor do que o de FHC, rejeitou o ideário neoliberal e resolveu acreditar no compromisso de Lula de que seu segundo mandato será de realizações mais ousadas, sobretudo, vencendo o desafio do desenvolvimento com distribuição de renda.
Antes o culpado era o mordomo. Agora, na pós-modernidade tucana é o marqueteiro.



*Jornalista e poeta, da direção nacional do PCdoB e presidente do Instituto Maurício Grabois