Fundeb: regulamentação por medida provisória evita questões polêmicas
Assinada às pressas para que passe a vigorar a partir de 2007, a MP que regulamenta o Fundeb detalha as regras para transferência, a gestão e o controle dos recursos, mas não toca em algumas das principais polêmicas da regulação.
Publicado 29/12/2006 17:00
por Jonas Valente – Carta Maior
O governo editou nesta quinta-feira (28) a Medida Provisória (MP) que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Aprovado no início deste mês, o Fundo vai substituir o Fundef, restrito apenas ao ensino fundamental (1a à 8a série), e terá ampliação progressiva de recursos até 2010, quando garantirá R$ 55,8 bilhões para 48,1 milhões de estudantes que estão na educação infantil, fundamental, básica, especial e de jovens e adultos. A edição da MP há apenas três dias do encerramento de 2006 teve como objetivo garantir a vigência do fundo já a partir de 2007, já que o Fundef tem funcionamento previsto apenas até este ano.
Segundo a MP, o principal critério de distribuição dos recursos será o número de matrículas registrado no censo escolar. Serão definidos coeficientes para cada modalidade de educação e um valor mínimo por estudante. Para Juçara Dutra, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o governo acertou ao incluir na regulamentação um dispositivo que determinará o valor mínimo e máximo por aluno, o que permitirá flexibilidade para avaliar constantemente as necessidades e demandas de cada modalidade educacional. “A tese é boa porque não engessa o valor, como era no Fundef”, aponta.
No plano da divisão entre os entes federados, os critérios deverão levar em conta, segundo o ministro da Educação, Fernando Haddad, a necessidade de correção das disparidades regionais. Ou seja, haverá mais recursos para os estados e municípios que têm a relação entre arrecadação e matrículas mais deficitária. “Em algumas localidades do País, o investimento vai quase dobrar, porque hoje, nos estados mais pobres da Federação, o investimento está aquém de R$ 700, e com o Fundeb, a partir do seu 3º ano de vigência ou 4º ano de vigência, vai passar de R$ 1,2 mil. Portanto, em algumas localidades muito pobres o Fundeb vai ter um impacto muito forte no financiamento da educação e na relação do custo por aluno”, declarou Haddad, em entrevista coletiva dada após a assinatura da Medida Provisória.
Outro ponto da regulamentação destacado pelo ministro é o controle social sobre os recursos. A MP prevê a criação de conselhos nos três âmbitos da Federação compostos por governos, trabalhadores, pais e estudantes, com a responsabilidade de fiscalizar a aplicação dos recursos do Fundeb e o censo escolar estadual ou local. Os conselhos também devem participar da elaboração das propostas orçamentárias anuais de cada ente federado. Um dos papéis destas instâncias será evitar desvios na informação sobre as matrículas de cada estado ou município. Segundo o Ministério da Educação (MEC), a partir do próximo ano esta tarefa será facilitada pela informatização do censo, quando o nome de cada aluno, bem como a relação de familiares e endereço, estará disponível na internet.
Polêmicas para depois
Apesar de extensa, a MP que detalha as regras para transferência, a gestão e o controle dos recursos não toca em algumas das principais polêmicas da regulação (leia matéria), que devem ser definidas nos próximos meses. A principal delas é a definição sobre as qual será o coeficiente de cada modalidade educacional, que será decidida por um Grupo de Trabalho (GT) a ser composto pelo MEC e por representantes dos secretários estaduais e municipais de educação. Os integrantes do GT terão trabalho duro na busca pela melhor divisão, uma vez que o Fundeb, apesar de um aporte 60% superior ao Fundef, não dá conta das demandas de universalização em todas as esferas que cobre. A disputa principal deve ficar entre a educação infantil e o ensino médio, pois o ensino fundamental já se encontra quase universalizado, com 97% de crianças matriculadas, e manterá no mínimo o valor já usado no Fundef.
Hoje, há sete milhões de matrículas no ensino médio, mas pesquisas mostram que apenas 33% dos jovens com idade para cursar esta etapa estão na escola. Na educação infantil, segundo dados da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), o percentual de crianças de 0 a 6 anos matriculadas em creches e escolas é de 37%, sendo apenas 11% em creches. Nesta realidade de “cobertor curto”, os estados reivindicam um fator de diferenciação mais alto para o ensino médio, rede que pela Constituição é de competência estadual.
Este é o motivo das reclamações das entidades da sociedade civil integrantes da campanha Fundeb Pra Valer. O GT que irá definir a distribuição só tem participação governamental e a posição a favor do ensino médio deve prevalecer apesar da avaliação das organizações da campanha de que deveriam ser incrementados os recursos para a educação infantil. “Achamos que educação infantil entre as prioridades com bastante ênfase. Os alunos que concluem o ensino fundamental já forçam o aumento de vagas para a educação média, já a educação infantil já não tem o mesmo poder de pressão”, defende Juçara Dutra. Segundo a presidente da CNTE, as organizações chegaram a solicitar espaço no grupo de trabalho, mas as dificuldades inerentes ao processo de indicação foram apresentadas pelo ministro Haddad como justificativa para a manutenção do GT restrito a representantes governamentais. “Negociamos para que, antes de definir os coeficientes para cada modalidade, o GT realize audiências públicas para que sociedade civil apresente sua visão”, informa.
Já no caso do encaminhamento do projeto de lei instituindo piso salarial para os trabalhadores da educação básica, previsto na Lei que criou o Fundeb, o MEC e os secretários de educação irão negociar diretamente com a CNTE uma proposta antes do envio ao Congresso. “Sabemos que se chegassem propostas diferentes no Congresso, a possibilidade de aprovação seria pequena”, explica Dutra. Segundo o secretário de educação básica do MEC, Francisco das Chagas, a proposta deve ser finalizada para envio ao Parlamento até o mês de abril.
Fonte: Agência Carta Maior