PT lança Congresso dentro da lógica da luta de tendências

Com um seminário internacional nesta sexta-feira (9) e uma reunião do Diretório Nacional no sábado (10), ambos em Salvador, o PT comemora o seu 27º aniversário e lança oficialmente o seu 3º Congresso, previsto para julho. Em pauta, a relação partido-gover

O modelo sofreu um pesado ataque do governador da Bahia, Jacques Wahner. Perguntado se o modelo de tendências esgotou-se no PT, em entrevista publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo, Wagner, diz que sim. “Acho que sim. Apesar de reconhecer o direito de filiação a uma tendência, é um conceito que não funciona mais. As teses para o 3º Congresso estão sendo assinadas por mais de uma corrente. A responsabilidade dos que tinham maioria, como o Campo Majoritário, foi deixar o partido parar de fazer confronto de idéias e passar a fazer confrontos de máquinas, de aparelhos, de exércitos. Nas reuniões, o importante não era mais ouvir o argumento, mas quem argumentava. As tendências podem existir sem engessar o pensamento. Virou briga de máquina, de levantar crachá”, condenou.



Na mesma entrevista, o protagonista da principal vitória eleitoral petista depois da de Lula diz que a hegemonia do Campo Majoritário também se esgotou. Mas agrega que “não [a] devemos substituir por outra hegemonia que defina todas as decisões do partido”.



Um modelo que vem do berço



O modelo do partido de tendências vigora desde a fundação do PT, no Colégio Sion, São Paulo, em 10 de fevereiro de 1980. Existiu primeiro informalmente, dado que o partido surgiu em certa medida da confluência de organizações que tinham existência anterior e não se dissolveram nele. Nos anos 90, institucionalizou-se; sofreu depurações (como a que gerou o atual PSTU); e consolidou-se conforme uma lógica estribada na hegemonia da “Articulação dos 113”, que mais tarde evoluiria para o chamado Campo Majoritário.



Na época, não poucos petistas chegaram a teorizar sobre o modelo de partido de tendências, apresentando-o como uma contribuição original à teoria e à prática partidárias. Ao mesmo tempo, o sistema, as tendências e a hegemonia do Campo solidificavam-se com o sistema de eleição direta dos organismos dirigentes e de seus presidentes.



Equilíbrio rompido com a crise de 2005



Esse equilíbrio se rompeu com onda de denúncias que desencadeou a crise de 2005. As denúncias de “mensalão” e caixa dois se concentraram no Campo Majoritário e em especial no seu principal reduto, São Paulo. Nas eleições partidárias de setembro daquele ano o Campo a rigor deixou de ser majoritário: teve 42% dos votos, embora elegendo, em segundo turno, o seu candidato a presidente da sigla, o deputado Ricardo Berzoini (SP). Os outros votos se repartiram entre as seis chapas de outras tendências, da chamada esquerda do PT, das quais uma fração tomou em seguida o caminho do PSOL.



As eleições de outubro recompuseram em certo sentido as forças do chamado Campo Majoritário: As fatias das tendências de esquerda na bancada parlamentar petista se reduziram, e em geral os deputados eleitos pelo chamado de voto opinião perderam terreno; ao passo que ganharam espaço parlamentares ligados a redutos eleitorais de tipo mais tradicional, tendentes a apoiar o Campo.



Quatro teses ao Congresso



Com a convocação do 3º Congresso, quatro teses se apresentaram até agora para o debate interno petista.



Das quatro, a que teve maior repercussão na imprensa intitula-se “Mensagem ao partido”. É assinada por 30 dirigentes petistas, entre eles a tendência Democracia Socialista e a filósofa Marilena Chauí, mas tem sido mais ligada a outro signatário, Tarso Genro, ministro (Relações Institucionais). Quando foi presidente interino da legenda, Tarso lançou a proposta de “refundação do PT”, abatida na tese para “reconstrução partidária”.



“PT: construindo um novo Brasil” traz nada menos que 487 assinaturas, ligadas ao Campo, entre elas a do presidente Berzoini. “A esperança é vermelha” é a única tese patrocinada por uma das tendências petistas tradicionais, a Articulação de Esquerda. “Um novo rumo para o PT” tem como primeiro signatário o deputado federal Cândido Vaccarezza (SP), seguido por outros parlamentares paulistas. Vaccarezza é tido como ligado ao ex-ministro e ex-presidente do PT José Dirceu, que teve papel histórico e ainda tem forte influência no Campo.



O Blog do Noblat (veja em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/indice.asp?a=119) publicou a íntegra das quatro teses. O quadro geral, as assinaturas e o próprio teor dos documentos ainda podem sofrer alterações, até 7 de março. Porém o início do processo, a ser deflagrado em Salvador, mostra que o 3º Congresso continua a girar fortemente em torno da lógica das tendências, embora os abalos sísmicos recentes tenham provocado realinhamentos entre elas.



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, idealizador, fundador, primeiro presidente, presidente de honra e principal expoente do PT, comparece nesta sexta-feira ao jantar em Salvador e faz um pronunciamento. Os observadores acreditam que ele continuará a manter distância desse imbroglio. Esta tem sido a sua tradição como militante partidário. E a tradição se fortaleceu grandemente com a eleição e a reeleição presidenciais. Tornou-se um lugar comum dizer que Lula é maior que o PT; se isso é verdade para o partido no seu conjunto, quanto mais para as tendências e neotendências que se enfrentam no seu interior.