Segundo Tempo muda realidade em Quingoma de Fora (BA)  

Quingoma de Fora é uma antiga zona de engenho do recôncavo baiano, que nos séculos XVIII e XIX teve na cana-de-açúcar a principal produção. Hoje, dois séculos depois, o povoado tem cerca de 3,5 mil moradores afro-descendentes da etnia Quingomas e é contemplado pelo Segundo Tempo, que exerce papel no resgate da auto-estima e na ressocialização de 460 crianças e adolescentes.

O núcleo na escola rural de Quingoma de Fora é uma das 76 unidades de atendimento do programa – uma parceria entre o Ministério do Esporte e a Prefeitura de Lauro de Freitas.

Além do atendimento total de mais de 15 mil estudantes da região, o programa gera emprego e renda para 128 profissionais, movimentando a economia local. A comunidade, que sofre com a falta de infra-estrutura urbana, como asfalto e saneamento básico, também é contemplada com energia elétrica com outro programa do governo federal, o Luz para Todos.
 

Foi justamente no Segundo Tempo que os alunos encontram uma alternativa para combater a ociosidade e garantir cultura e lazer. Para o coordenador de núcleo do programa, o professor Adalberto França, um dos grandes desafios foi a disciplina dos alunos.

Para combater todo o mau comportamento, o docente utilizou a psicologia. ''Conversamos muito, demos conselhos e, em casos extremos, até ameaçamos de afastamento temporário. Mas, a psicologia surtiu efeito. Realizamos diversas reuniões com os pais, que tiveram papel essencial para o desenvolvimento dos alunos e para a mudança do ambiente escolar'', explicou.

A oportunidade de praticar esportes oferecidos pelo Segundo Tempo, como futebol, basquete, vôlei, caratê e capoeira fez com que o aluno Francisco*, de apenas seis anos, mudasse o comportamento, marcado pela violência doméstica. ''Hoje, esse aluno é uma referência de amizade na escola. Além de ser muito carinhoso, ele deixou a agressividade de lado e não se envergonha de dar um abraço amigo nos colegas'', recordou o professor.
 

As atividades extracurriculares também foram fundamentais para o desenvolvimento dos alunos beneficiados pelo programa. Em um passeio à Represa da Embasa, que abastece todo o município, os alunos descreveram com palavras e desenhos a relação e a importância do meio ambiente para o ser humano.

''Os trabalhos dos alunos estão expostos num painel de quatro metros dentro da escola'', elogiou França. Pai de uma menina de quatro anos, Hana, França dá a receita para manter infância e juventude saudáveis. ''O amor ainda é o melhor remédio”.

Histórico

Os Quingomas são uma etnia africana, vinda em menor número para a Bahia. Boa parte das fazendas e engenhos que compunham a antiga freguesia de Santo Amaro de Ipitanga utilizavam o trabalho escravo dos Quingomas. No sítio histórico ainda existem vestígios das antigas instalações das casas grandes, senzalas, moendas, tanques, entre outros.

O povoado também mantém terreiros de candomblés e casas de farinha, onde se produzem o beijú quingoma (sem côco). As árvores frutíferas plantadas nos quintais das casas são outras características de Quingoma de Fora. Cajú, coco, manga, genipapo, mandioca e hortaliças são cultivadas para a sobrevivência das famílias e o excesso é comercializado todos os sábados, na feira de Lauro de Freitas (BA). A grande maioria sobrevive de empregos informais como faxinas e capinas.

* Francisco é um nome fictício, em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente

De Brasília
Carla Belizária