Lula veta emenda “antitrabalhista”, mas polêmica continua

O presidente da República vetou a chamada “emenda 3” do projeto de lei que cria a Super-Receita, sancionado nesta sexta-feira (16). Essa emenda limitava a atuação da fiscalização sobre empresas que contratam profissionais sob a forma de pessoa jurídica.

O veto foi anunciado no final da tarde pelo líder do governo na Câmara dos Deputados, José Múcio Monteiro (PTB-PE), e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, após reunião com lideranças do Congresso Nacional. Eles também anunciaram que será apresentada na próxima semana um projeto de lei, em regime de urgência, para tratar dessa mesma questão.


 



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta sexta-feira (16) a criação sa Super-Receita,  vetou a emenda número 3 do projeto. A emenda, que foi aprovada pelo Congresso, estabelecia que apenas a Justiça do Trabalho – e não um fiscal da Receita – poderia contestar um contrato firmado entre duas pessoas jurídicas para a prestação de serviços. O ministro da fazenda, Guido Mantega, informou que o governo federal vai enviar nos próximos dias ao Congresso Nacional um projeto de lei, com urgência constitucional, em substituição à emenda.


 


O veto


 



O veto à emenda 3 da Super Receita, segundo explicou o ministro da Fazenda, se deve a controvérsias que poderiam surgir no campo jurídico. “A emenda não resolveria o problema a que ela se propõe a resolver, que é definir melhor o quadro da pessoa jurídica com ação personalíssima. Consideramos que não esclarece nada. Não facilita em nada a vida destas empresas. Estamos caminhando para uma alternativa mais eficiente”, disse Mantega.


 


Segundo ele, essa discussão, porém, não diz respeito à “esmagadora maioria” das pessoas jurídicas com lucro presumido. “Não estamos querendo alterar nada em relação a estas pessoas jurídicas: profissionais liberais, escritórios, consultórios. Não muda absolutamente nada. Aliás, nunca esteve em pauta uma mudança. Estamos discutindo o caso de empresas que desempenham trabalho de caráter personalíssimo, que representa uma pequena minoria”, afirmou. Segundo o governo, a pessoa jurídica de caráter personalíssimo é aquela que tem vínculo com uma única empresa.


 


O projeto de lei



Até o momento, o governo considerava enviar uma medida provisória como alternativa à emenda. Mas, segundo Mantega, optou-se pelo projeto de lei para possibilitar o diálogo com o Congresso Nacional e com a sociedade. O ministro da Fazenda confirmou que vai receber sindicatos e associações de serviços de setores interessados, como a imprensa, por exemplo, para debater a questão.


 



“Vamos abrir uma discussão com a sociedade, de modo que todos sejam ouvidos e que possamos construir juntos uma legislação que seja mais moderna e dê conta de tudo isso”, disse. Mantega considerou que essa é uma oportunidade de discutir as novas relações trabalhistas que estão aparecendo como, por exemplo, de empresas de informática que contratam profissionais pela internet até mesmo de outros países.


 


“Não será permitido a fiscalização fazer uma autuação, ou abrir um procedimento de multa sem que haja o direito de defesa do contribuinte. Hoje você tem uma fiscalização que detecta uma possível irregularidade e aí autua o estabelecimento. Já lança um crédito tributário e depois o contribuinte tem que se defender. O que estamos dizendo é que não pode mais fazer isso. Vai haver a notificação de que alguma irregularidade possa estar ocorrendo, mas não haverá nenhuma autuação”, disse Mantega.


 


Explicou ainda que a questão será remetida para instância superior, ou seja, o delegado da Receita Federal da região correspondente. “Caberá a ele verificar se tem procedência aquela acusação que está sendo feita depois de ouvir o direito de defesa da parte. Somente depois disso é que se dará procedimento a alguma autuação”, disse o ministro.


 



Mutilação dos poderes dos fiscais


 



Mas os movimentos sociais e o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, têm outra opinião sobre o assunto. Para eles, a emenda 3 mutilava os poderes dos fiscais do trabalho e por isso deve ser vetada.


 


Uma das entidades que pressionaram o governo para que a emenda fosse vetada foi a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrícolas) que emitiu uma nota na qual afirma que “essa Emenda é prejudicial aos trabalhadores e trabalhadoras rurais, fere princípios constitucionais e direitos trabalhistas. Direitos esses, adquiridos de lutas sindicais por décadas. Possibilitará ao patronato trocar os empregados registrados em carteira profissional por autônomos, sem sofrer qualquer ação do Ministério do Trabalho e Emprego. Conseqüentemente, não haverá como exigir FGTS, multa fundiária, férias, décimo terceiro, pagamento de horas-extras, aposentadoria por idade, licença maternidade, entre outros”, explica a nota.


 


A CUT, outras centrais sindicais, representantes da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e de entidades representativas da Justiça do Trabalho também pediram ao governo que vetasse Emenda 3. Em audiência com o ministro Luiz Marinho, as entidades argumentaram que a emenda abre mais espaço para a precarização do mercado de trabalho ao retirar da fiscalização do Ministério do Trabalho o poder de diagnosticar e definir se há vínculo de trabalho entre uma empresa e um trabalhador e remeter a questão à Justiça. “Isso vai contra a luta dos trabalhadores e suas representações sindicais por garantia de direitos e crescimento do mercado formal”, disseram as centrais em documento entregue ao ministro.


 


Com o veto estabelecido hoje, o governo elimina temporiariamente o problema apontado pelas entidades, mas as declarações do ministro Guido Mantega, a favor da limitação dos poderes dos fiscais, sugerem que o centro da polêmica não foi resolvido. Novos embates entre governo e movimento sindical devem acontecer nos próximos dias.