“Carta Capital”: crise aérea atiça defensores da privatização
A revista Carta Capital que chega às bancas neste final de semana traz uma reportagem que mostra que, por trás da tentativa da oposição de instalar a CPI do “apagão aéreo”, está a intenção de privatizar a Infraero.
Publicado 30/03/2007 23:40
O autor da reportagem – que tem o título “Caninos Afiados” – Leandro Fortes, disse em entrevista ao jornalista Paulo Henrique Amorim nesta sexta-feira (30), que sempre houve um movimento das companhias aéreas para privatizar toda a infra-estrutura aeroportuária no Brasil.
Fortes disse que a discussão da privatização da Infraero sempre esbarrou nos números relativos aos aeroportos. Segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), há 67 aeroportos administrados pela Infraero.
Segundo a reportagem de Leandro Fortes, desses 67 aeroporto, somente 12 são lucrativos. Fortes disse também que os aeroportos que lucram sustentam os deficitários.
“Quando se fala em privatização eles querem privatizar somente o filé (…) Um aeroporto como Congonhas que é importantíssimo, todo mundo quer privatizar a parte de infra-estrutura aeroportuária. Mas ninguém quer privatizar o aeroporto de Tabatinga, lá no Amazonas”, disse Fortes.
Caminhoneiros de Allende
Também no site Conversa Afiada ( http://conversa-afiada.ig.com.br ), o jornalista Paulo Henrique Amorim compara a atual paralisação dos controladores de vôos com uma greve nacional da Associação dos Donos de Caminhões financiada pela CIA que ajudou a derrubar o presidente Salvador Allende, do Chile, em 1973.
''O objetivo do 'paro' dos caminhoneiros era exatamente o dos controladores: desorganizar a produção'', opina Amorim.
''No Chile de Allende, havia um mínimo de pluralidade na imprensa – uma parte da imprensa apoiava o presidente eleito pelo povo. Aqui, os controladores de vôo já há algum tempo aplicam a chantagem de “parar” o país. Hoje, nesta sexta-feira, conseguiram'', diz o jornalista.
Amorim vai ainda mais longe na sua denúncia e afirma que os controladores ''têm o mesmo objetivo dos colegas chilenos: derrubar o Presidente da República''.
''No Chile, como aqui, o 'paro' dos controladores tem a função de jogar a classe média contra o Governo. Quem anda de avião é a classe média', explica.
Clique aqui para ver o comentário na íntegra
Leia abaixo a entrevista feita por Paulo Henrique Amorim com o jornalista Leandro Fortes, autor da reportagem da revista Carta Capital:
Leandro, essa sua reportagem é sobre essa chamada “crise aérea”, não é isso?
Leandro Fortes – Isso. Essa crise chamada “caos aéreo”.
“Caos aéreo” ou “apagão aéreo”, não é isso?
Leandro Fortes – Isso. Nome é o que não falta!
Nome é o que não falta. Agora, vem cá, você faz uma revelação nessa matéria que é, se não me engano, pelo o que eu percebi do texto a que eu tive acesso que, por trás dessa discussão do caos aéreo, tem um problema subjacente que é a privatização, a idéia, a aspiração de alguns grupos de fazer a privatização de toda a operação de aviação comercial no Brasil, não é isso?
Leandro Fortes – É isso.
Como é que seria essa privatização?
Leandro Fortes – Essa não é uma idéia nova. Na verdade, sempre houve um movimento, que partiu das companhias aéreas, da privatização, sobretudo, da parte de infra-estrutura aeroportuária. Mas acontece o seguinte: essa discussão ela sempre esbarrou nos números relativos a aeroportos. De acordo com a Anac, existem 67 aeroportos administrados pela Infraero no Brasil. Mas somente 12, Paulo Henrique, são lucrativos. O sistema sempre aconteceu da seguinte forma: esses aeroportos que lucram eles sustentam os aeroportos deficitários. Então, quando se fala em privatização, eles querem que privatize só o filé.
Privatizar os 11.
Leandro Fortes – Privatizar os 11, que dão lucro, né. Um aeroporto como Congonhas, que é importantíssimo, todo mundo quer privatizar a parte de estrutura aeroportuária, mas ninguém quer privatizar o de Tabatinga, lá no Amazonas, que não dá lucro nenhum, pelo contrário, dá prejuízo. Mas os aeroportos que dão lucro sustentam esses que não dão lucro.
Mas no momento, quem você acha que defende essa idéia?
Leandro Fortes – Olha, no final do ano passado, teve uma reunião no Senado Federal, na comissão que trata sobre esse assunto, e os representantes da TAM, falando em nome das companhias aérea, colocaram claramente essa idéia de privatização. Eu acho que essa idéia permanece como agenda das companhias aéreas, porque parte do crescimento das companhias aéreas exige investimento muito pesado, o investimento no setor aéreo é muito grande. E como as companhias aéreas vivem sempre na corda-bamba, você privatizando o sistema de infra-estrutura aéreo-portuária, você pode agregar um elemento de receita muito poderoso. Hoje, só as taxas que são pagas, as taxas de serviços que são repassadas pelas companhias aéreas pela Infraero chega a R$ 1 bilhão por ano.
Por decolagem.
Leandro Fortes – Todas as taxas operacionais. Inclusive essas de embarque, as taxas operacionais de embarque, desembarque, de equipamentos. Todas essas taxas, uso das instalações, tudo isso as companhias aéreas repassam para a Infraero. Esse ano vai chegar a R$ 1 bilhão. É muito dinheiro. Então, tem muito dinheiro e muita gente de olho nisso. Parte dessa resistência – ou a maior parte dessa resistência – se chama Waldir Pires no Ministério da Defesa, estar ligado a essa questão: o Waldir Pires é absolutamente contrário à privatização e isso tem apoio do pessoal da FAB, né, porque teoricamente foram eles que construíram esses aeroportos todos no Brasil.
Então, você acredita então que uma parte dessa gritaria contra o chamado “Apagão Aéreo” ou “Caos Aéreo”, uma parte disso deriva dessa agenda de privatização?
Leandro Fortes – Não tenho nenhuma dúvida que deriva porque há um super-dimensionamento desse problema, desde a queda do avião da Gol no ano passado e a esses problemas dos controladores de vôo se revelou o seguinte: há de fato um problema, o sistema é problemático.
Houve uma explosão da demanda.
Leandro Fortes – Houve uma explosão enorme da demanda. As passagens ficaram mais baratas, mais gente passou a andar de avião e o sistema não acompanhou o crescimento desse número de passageiros. Só que essa questão ela tem um contorno político… você vê a ação midiática. Não há em nenhum aeroporto do Brasil que não tenham duas ou três equipes de televisão filmando qualquer atraso. Por que só agora? Porque é o momento político interessante para buscar essa questão e colocá-la como um problema que pode ser resolvido como privatizando.
Quer dizer, uma das conclusões de uma CPI do “Apagão” será propor a privatização do sistema?
Leandro Fortes – É possível que sim porque a CPI do “Apagão Aéreo”, na maneira como ela foi bolada e na maneira como ela está possivelmente pra ser instalada, ela obedece a uma agenda da oposição. Ela não trata exatamente de um problema. Ela pegou o problema pra fazer uma ação política. E as ações políticas no Brasil, pela crise 2005-2006, se revelaram muito menos ligadas a objetivos da comissão e muito mais aos interesses políticos envolvidos.
O objetivo é derrubar o governo Lula. Eu acabei de escrever isso aqui no iG.
Leandro Fortes – O que pode gerar essa CPI do “Apagão Aéreo”? pode gerar uma outra CPI, como a do “Fim do Mundo”. Você abre uma CPI e agrega a ela todo tipo de denúncia contra o governo.
Tudo o que levanta vôo…
Leandro Fortes – Tudo o que levanta vôo, exatamente.
Vai ser a CPI do “Barata Voa”.
Leandro Fortes – Vai ser a CPI do “Barata Voa” ou algo…
Olha aqui, você sabe que tem aqui dois internautas aqui do UOL, desculpe, desculpe, do iG – eu to aqui abrindo o UOL também –, mas dois internautas aqui do iG, do Conversa Afiada, estão sugerindo colocar do Sivan na CPI também. Já que é tudo o que está no ar, bota o Sivan também, né?
Leandro Fortes – É, se for remexer no Sivan, vai descobrir ainda muita coisa. O Sivan foi um grande escândalo nacional que, por razões políticas da época, do governo Fernando Henrique, não foram esclarecidas.
Não, não, o Sivan foi para debaixo do tapete.
Leandro Fortes – E olha, aquilo sim foi uma crise do setor aéreo e para o setor de segurança estratégico muito grande. Com esquemas de corrupção como muito desses que você vê no Brasil. Pode ser um movimento dos governistas: já que estão mexendo por um lado, estão mexendo por outro.
Quer dizer que tem aí esse pano de fundo, de fazer a privatização.
Leandro Fortes – Com certeza. Essa pressão específica aqui está muito na raiz desta resistência que a gente ouve hoje na oposição entre as companhias aéreas à presença de Waldir Pires no Ministério da Defesa.