Para Conanda, apoio a pena de morte é circunstancial

Pesquisas de CNT/Sensus e Datafolha indicam que aumentou apoio à pena capital. Defensores dos direitos humanos vêem índice próximo a 50% como dentro dos padrões mundiais e defendem que o aumento é apenas circunstancial. Os ativistas também criticam debate

Pesquisas de opinião recentes comprovaram em números aquilo que há tempos permeia a sensação da população: a violência é cada vez mais uma preocupação dos brasileiros e brasileiras. Em março, o tema apareceu, para 31% dos entrevistados, como o maior problema do país, em um levantamento do Datafolha. Nesta terça (10), divulgação da pesquisa da CNT/Sensus revelou que, para 90,9% da população, a violência cresceu nos últimos anos.


 


Em paralelo a esta constatação – sem que se possa afirmar que um dado é conseqüência do outro – também cresceu o número dos que são favoráveis à pena de morte. No estudo da CNT/Sensus, nos últimos quatro anos, o percentual subiu de 46,7% para 49%. Já entre os entrevistados do Datafolha, 55% apóiam a prática, proibida no Brasil. Em pesquisa anterior feita em agosto do ano passado, o número era de 51%. Segundo a Folha de S.Paulo, o total de favoráveis apresentado agora se iguala ao índice obtido em 1.993 como maior desde que o instituto de pesquisa investiga o tema.


 


Apoio circunstancial


 


Na opinião do jurista Oscar Vilhena, diretor-executivo da organização não-governamental Conectas Direitos Humanos e professor da Fundação Getúlio Vargas, esta variação se deve a uma função circunstancial. Historicamente, a média de brasileiros que defendem a pena de morte girou em torno dos 50%. O número é semelhante em países que registram altos índices de violência, como o Brasil. Para Vilhena, a subida mais recente é fruto do impacto do assassinato do menino João Hélio no Rio de Janeiro, em fevereiro passado. E, mesmo diante do barbarismo do crime praticado, a mudança na opinião pública não foi grande.


 


“Não enxergo este aumento como algo que represente, de fato, uma tendência de alta significativa. É algo circunstancial. O assassinato de João Hélio afetou a todos, mas não removeu a opinião contrária à pena de morte de grande parte dessas pessoas. Acredito que, se não tivesse havido um crime tão bárbaro como este, a média da população teria se mantido”, avalia.


 


Para organizações defensoras dos direitos humanos, o modo como a imprensa tem atuado diante das discussões sobre as políticas de segurança pública também influencia no resultado das pesquisas.


 


“A questão está aflorada, mas está claro que o debate tem se dado apenas em cima das medidas repressivas e ilusórias, como se isso fosse resolver o problema da criminalidade de um dia para o outro. A discussão se faz em cima do endurecimento de penas, da redução da maioridade penal e da implantação da pena de morte. Não vemos, nos meios de comunicação e no discurso dos políticos, reflexões sobre a ausência de políticas para a juventude, por exemplo. Isso, e o sensacionalismo feito em cima de determinados crimes, principalmente quando a violência atinge a classes média e a classe alta, influencia nos resultados”, acredita Ariel de Castro Alves, coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos e membro do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente).


 


Segurança pública


 


No largo espectro, a avaliação das entidades que atuam no campo é a de que o aumento da defesa da pena de morte é conseqüência do Estado brasileiro não ter enfrentado, com a devida competência, o problema da segurança pública. Ainda que algumas regiões tenham apresentado reduções nos índices de violência, o problema permanece e se disseminou para além das grandes capitais.


 


“A persistência de uma vontade e intenção bastante significativa em favor da pena de morte é uma resposta a essa ausência de políticas consistentes e eficientes de combate à criminalidade. A pena de morte é uma resposta mais intuitiva de que algo deve ser feito, algo com equivalente peso ao sofrimento das pessoas, mas é algo natural, que demonstra a incompetência do Estado de enfrentar os problemas”, avalia Oscar Vilhena.


 


“Em vez de tomar medidas efetivas de enfrentamento da violência, os políticos acabam entrando no clamor popular – até para tentar recuperar a imagem desgastada do Parlamento brasileiro – e apelam para discursos demagógicos, sem tratar dos problemas centrais do campo”, acredita Alves.


 


“No meu entendimento, hoje, o principal problema é a própria polícia, tanto pela corrupção, que é generalizada, endêmica, quanto pela falta de estrutura de trabalho. No Brasil, ao todo, no máximo 3% dos crimes são solucionados. Não há prioridade para a área de inteligência. Então, enquanto não houver uma reformulação das polícias – algo que vem sendo falado no país desde 1997, quando eclodiu o caso da Favela Naval em São Paulo, mas que nunca saiu do papel – e enquanto não houve políticas de enfrentamento ao crime organizado, infiltrado em várias instituições do Brasil, a defesa do endurecimento das penas continuará presente”, conclui o representante do Conanda.