Brasil recusa tratado de privilégios com Santa Sé

O Vaticano não conseguirá um dos seus principais objetivos da viagem do papa Bento XVI a partir de quarta-feira (9): a assinatura de um acordo com o Estado brasileiro garantindo à Igreja todos os seus direitos no território nacional, inclusive a consolida

A embaixadora do Brasil na Santa Sé, Vera Machado, negou na segunda-feira (7) em Brasília que o governo brasileiro já tenha tomado qualquer decisão sobre o assunto. “O acordo está em negociação e não há nenhuma posição pré-fixada em não assinar”, afirmou.



Amorim não irá ao encontro



O Brasil se recusou a assinar o acordo proposto no final do ano passado. No seu lugar, sugeriu outro tratado, apenas citando as boas relações entre o Vaticano e o Estado brasileiro e remetendo todas as questões à Constituição e ao Código Civil.
A Agência Estado antecipa que o chanceler Celso Amorim nem sequer irá ao encontro entre o papa Bento XVI e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele usará uma desculpa protocolar: como o encontro ocorrerá apenas entre o papa, Lula e o secretário de Estado do Vaticano, Tarcisio Bertoni, não haveria motivo para a presença do chanceler. O Vaticano não enviará seu responsável pelas Relações Exteriores, Dominique Mamberti, já que se trata de uma viagem pastoral.



Apenas Vera Machado estará presente e segundo ela o acordo não está na agenda do encontro. A embaixadora reafirmou que essa é uma visita pastoral do papa e não serão discutidos assuntos de governo. “O acordo será discutido em outra ocasião''.



Com Portugal, ''educação católica''



O Vaticano alega que vários governos contam com acordos similares com a Santa Sé. Entre eles, a Itália e Portigal, que recentemente, em 2004, renovou seu acordo.
O acordo com Portugal reconhece a personalidade jurídica da Igreja, os feriados religiosos e isenta o clero de deveres judiciais. Mas inclui temas mais delicados: pela concordata, o casamento religioso é equiparado ao casamento civil, o divórcio passa a ser algo “grave” e ainda estabelece a “educação moral e religiosa católica”.



No caso do Brasil, diversas leis garantem certos privilégios à Igreja Católica, como isenção fiscal e reconhecimento da estrutura de poder, apesar do dispositivo constitucional que proclama o caráter laico do Estado.  Mas o  Vaticano queria a união de todas essas leis em um documento único. Isso engessaria o governo para o futuro em relação a qualquer mudança. Além disso, o governo teme que a bancada evangélica no Congresso (10% dos parlamentares) se mobilize para obter acordo similar para suas igrejas.



O acordo ainda poderia servir como mais um mecanismo para que o Vaticano garantisse o ensino religioso nas escolas públicas. A Igreja, em sua proposta inicial, fala de “ensino católico”; resolveu amenizar os termos para tentar um acordo, mas mesmo assim o governo brasileiro recusou.



Apesar de a proposta do Vaticano não falar diretamente de aborto, o governo teme que o acordo possa ser usado no futuro pela Igreja para pressionar contra reformas da lei que descriminalizem a interrupção voluntária da gravidez.



Com informações da Agência Estado