Elio Gaspari:: “Vavá está sendo linchado”

O jornalisa Elio Gaspari, que mantém uma coluna aos domingos no jornal Folha de S. Paulo, não é, nem de longe, o que se poderia considerar um aliado do governo Lula. Pelo contário, refere-se ao presidente, de forma pejorativa, como “Nosso Guia”. Aind

“Vavá está sendo linchado”


 


Genival Inácio da Silva, o Vavá, está sendo covardemente linchado porque é irmão do presidente da República. Ele é acusado de tráfico de influência sem que até hoje tenha aparecido um só nome de servidor público junto ao qual tenha traficado qualquer pleito que envolvesse dinheiro do erário. Um fazendeiro paulista metido numa querela de terras queria reverter uma decisão unânime do Superior Tribunal de Justiça. Vavá recomendou-lhe um advogado. Isso não é tráfico de coisa alguma. Um empreiteiro queria obras e encontrou-se com ele num restaurante. Ninguém responde se Vavá conseguiu favorecer esse ou qualquer outro empreiteiro.


 


A divulgação cavilosa e homeopática de trechos de gravações telefônicas envolvendo parentes de Nosso Guia tornou-se um processo intimidatório e difamador capaz de fazer corar generais do Serviço Nacional de Informações, o SNI da ditadura. No caso de Vavá, as suspeitas jogadas até agora no ventilador não guardam nexo com os fatos. Não há proporção entre as acusações que lhe fazem e o grau de exposição a que foi deliberadamente submetido.


 


A Polícia Federal vasculhou sua casa (um imóvel de classe média em São Bernardo do Campo). A diligência foi apresentada como parte de uma Operação Xeque-Mate, destinada a desbaratar uma quadrilha envolvida em contrabando, tráfico de drogas e máquinas caça-níqueis. Não era pouca coisa. Pelo que se sabe até agora, coletaram cinco papéis. Entre eles, duas cartas que não foram entregues. Vavá tentou alavancar dois casos com empresas privadas (Vale e CSN). Nenhum dos pleitos chegou à direção das companhias.


 


Os grampos policiais estabeleceram um vínculo entre Vavá e dois mercadores de casas de jogo e atravessadores de negócios. Um deles, Nilton Servo, ameaçou “trucidar” a família de um desafeto. O outro, Dario Morelli, compadre de Lula, julgava-se protegido pelas suas amizades e disse que a polícia pensaria “duas vezes em fazer qualquer coisa”. Foi preso. Os dois planejavam maracutaias e contavam com a ajuda do irmão do presidente, a quem dizem ter dado algo como R$ 15 mil nos últimos meses. Nas palavras de Servo, “o Vavá é para ser usado”.


 


Numa conversa, Vavá fez-lhe um pedido: “Ô, arruma dois pau pra eu?”


 


Lula tem 15 irmãos e algo como cem parentes. Desde que Tomé de Souza chegou a Salvador, nenhuma família de governante teve tão poucas relações com o Estado como a dos Silva. Mais: nenhuma veio de origem tão modesta e continuou a viver em padrões tão modestos. (Noves fora o Lulinha da Gamecorp.)


 


Vavá meteu-se por sua conta e risco com os negócios de Servo e do compadre Morelli. Desqualificá- lo por lambari, deseducado ou pé-de-chinelo é parte do linchamento. Ele é um cidadão, ponto. Seus atos vêm sendo investigados e serão levados à apreciação da Justiça. Podia ser membro da Academia Brasileira de Letras, dava na mesma. Antes da conclusão do inquérito policial, Vavá foi irremediavelmente satanizado a partir de indícios, suspeitas e manipulações. Seu linchamento não busca o cidadão metido com vigaristas. Busca a jugular do irmão.


 


Durante a última campanha eleitoral, quando o comissariado petista chafurdou na compra de um dossiê contra os tucanos, demonizou-se a figura de Freud Godoy, um assessor de Lula, conviva de sua panelinha. Durante três dias ele pareceu encarnar toda a corrupção nacional. Freud foi arrolado em dois processos, um criminal e outro eleitoral. Dizer que foi inocentado é pouco. Ele nem sequer foi indiciado.


 


O pessoal do século 21 sabe que Jimmy Carter é um ex-presidente dos Estados Unidos (1977-1981), Prêmio Nobel da Paz de 2002. Passará para a história como um exemplo de retidão. Isso agora. Quando estava na Casa Branca, Carter foi atazanado pela exposição de seu irmão Billy, caipira alcoólatra que se tornou lobista (registrado) do governo líbio. Criou-se o neologismo Billygate. Morreu em 1988, aos 51 anos, falido. Virou poeira da História.


 


Ninguém quer a jugular de Vavá, como não se queria a de Billy Carter. O negócio é outro.


 


Fonte: Folha de S. Paulo