Pan: Operários recebem diploma de “participação”

A Prefeitura do Rio de Janeiro anunciou nesta segunda-feira (2) que vai homenagear os operários que trabalharam na construção do Estádio Olímpico Municipal João Havelange, o Engenhão, e da Arena Multiuso, na Cidade dos Esportes.

Todos eles vão receber um diploma oficial, comprovando sua participação no preparo da cidade para os Jogos Pan-americanos.



A distribuição do documento, que identifica nominalmente o operário, começa nesta terça-feira, no Engenhão. A partir da próxima semana, operários de outros equipamentos receberão o diploma via correio.


 


A ação da prefeitura tenta minimizar as críticas que recebeu com as condições insalubres e arriscadas em que trabalham os operários que constróem as instalações do Pan.


 


“Eu sonho em ver as pessoas correndo aqui, no estádio que eu construí. Mas do jeito que as coisas são, acho que não vou conseguir assistir nada, não. Peão é assim. Constrói o prédio com todo o luxo, mas quando fica pronto, não deixam a gente nem chegar perto”, afirma o piauiense Cláudio Arruda, 42.



O cenário é o mesmo em todos os canteiros para o Pan, seja no autódromo de Jacarepaguá (onde estão sendo construídos a Arena Multiuso, o Velódromo e o Parque Aquático Maria Lenk), na Vila Pan-Americana, no Complexo do Maracanã ou nas sedes de tiro, hipismo e pentatlo moderno de Deodoro.



“Não sei direito quais são os esportes que vão ser disputados aqui, mas seria bom poder assistir. Começar a entender de alguma coisa nova. Nós, os peões, somos os primeiros atletas do Pan. Bem que a gente podia se encontrar com os atletas que vão usar isso depois”, cogita o também carioca Luciano dos Santos Oliveira, de 20 anos.



Além dos sonhos, os operários do Pan também dividem a vida sofrida do trabalho na construção pesada. Semanalmente, são mais de 60 horas sob sol e chuva, bebendo água muitas vezes quente e comida ruim. “A gente até reclama, mas o que mais ouve é o chefe dizendo que a gente é peão e tem que comer isso mesmo”, lamenta Tiago.



Para ir e voltar do trabalho, são viagens longas, dos lugares mais distantes. Luciano, por exemplo, acorda todo dia às 5h da manhã e sai de Anchieta, na zona norte do Rio. “Pelo menos, eu moro perto do trem e o Engenhão é do lado da estação aqui. Mesmo assim, é uma hora para ir e uma hora para voltar, com o trem lotado”, conta.



A situação de Tiago é ainda pior. Ele mora em Magé, cidade da Grande Rio. Ele cruza a cidade por duas horas e meia pela manhã para chegar ao Engenhão, onde trabalha, e volta a enfrentar essa maratona à noite.



“É difícil, tenho filhinho de um ano e sete meses em casa, e ele sente falta. Eu saio de casa todo dia às 4h para trabalhar e só volto à noite, bem tarde. Quando o serão vai até tarde, eu fico na casa da minha tia, que é aqui perto. Mas não gosto. Dou despesa para minha tia, que ainda tem que pagar a casa e tenho que ajudar, mas o dinheiro é pouco”, relata o operário.



Outros conseguem ficar ainda mais longe do lar. É o caso do ajudante Siélio de Brito Lima, de 24 anos. Ele mora em Salvador, na Bahia, e migrou para o Rio para trabalhar. Ele quer juntar dinheiro para construir a sua casa própria, no Nordeste. Enquanto isso, vive na casa de parentes próximo do canteiro de obras.



“Não vejo a hora de voltar para a Bahia. Lá que é bom. Não tem esse ar poluído da cidade grande, a gente respira normalmente, não sente toda essa sujeira entrando”, diz. “Meus primos vieram primeiro, depois mandaram me buscar. Cheguei aqui sem conhecer nada. Quero voltar. Minha mulher e meus filhos estão lá, em Salvador, e não me agüento de saudade”, completa.



Siélio deve voltar para a Bahia. Mas a maioria dos operários fica no Rio. E a esperança é que, com a experiência obtida, o contracheque engorde nas futuras empreitadas. Atualmente, o piso da categoria, segundo o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Construção Pesada do Rio de Janeiro, é de R$ 539,00 para os ajudantes e R$ 739,20 para trabalhadores em geral.



“Estou nesse caminho para seguir o meu pai. Que é mestre-de-obras. Quem sabe eu não chego um dia? Comecei aqui depois que um tio meu chamou e estou na luta, aprendendo para crescer. Assim vou poder ajudar minha família, criar o meu filho como o meu pai me criou”, diz Tiago.


 


Mesmo achando que não serão convidados na grande festa, o sentimento geral dos “primeiros atletas do Pan” é de orgulho. “Olha, nunca construí nada tão bonito. Se você entrar lá hoje, vai ver os vestiários, como estão bonitos. Até as torneiras têm aquele desenho do Pan. Tenho muito orgulho de ter ajudado a erguer isso aí”, orgulha-se Cláudio, com lágrimas nos olhos.



“Eu não tenho como falar o que eu sinto sempre que penso no que estou fazendo. Eu estou preparando um serviço que vai mostrar do que o nosso país é capaz. Eu estou mostrando que o brasileiro é um povo forte e brigador”, vangloria-se Luciano.



A frase de maior impacto, porém, é de Tiago: “Minha mãe e minha mulher choram toda vez que a gente fala do Pan. Foram esses Jogos que me deram emprego, me deram comida para sustentar a minha família. Fiquei um ano sem trabalho e foi muito difícil passar isso com meu filhinho”.


 


Com informações da Folha de S. Paulo