Professora alerta para riscos da publicidade para crianças

“Estamos colocando uma tela entre o mundo e as crianças. Estamos treinando-as para recusarem a vida”. O alerta é da professora da Universidade de Harvard e autora do livro “Crianças do Consumo – A infância Roubada”, Susan Linn.


 


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A pesquisadora veio ao Brasil para participar do 2º Fórum Internacional Criança e Consumo, que aconteceu em São Paulo (SP). Ela tratou sobre a influência da propaganda e da mídia na construção da personalidade das crianças e adolescentes. “O bombardeio da publicidade em cima das crianças é prejudicial, gerando problemas de alimentação, estresse da família, delinqüência e erotização precoce”, afirmou.



Segundo Susan, nos Estados Unidos existem empresas que trabalham com propaganda dentro das escolas. O mercado publicitário do país investe cerca de US$ 15 bilhões de dólares anuais nesse mercado.



Para a professora, a infância está sendo minada pelo tempo exagerado que as crianças passam na frente da TV. “As crianças brincam com menos criatividade, pois esse momento, além de ser cada vez menor, é roteirizado por programas infantis ditos educativos”. Dessa forma, a infância está sendo diminuída, com um espaço lúdico menor. “As crianças estão se transformando em pequenos adultos”.



Inserida nessa realidade, a escola também compartilha parte da culpa. “A escola não é mais um local onde as crianças podem brincar. É cada vez mais um lugar de competição e onde se dissemina a cultura de que devemos ter medo de tudo. A brincadeira é essencial para a saúde, o desenvolvimento e o bem-estar da criança”, afirmou.



Segundo Susan, a falta da brincadeira criativa é extremamente prejudicial ao desenvolvimento da criança. “Hoje, a criança brinca apertando botões e acaba ficando entediada, desejando sempre mais para suprir sua necessidade de brincadeira. A idéia de que o objeto traz felicidade limita a oportunidade de aprendizado. A brincadeira criativa é fundamental para o desenvolvimento da criança, pois é assim que ela aprenderá a resolver seus problemas”, explicou.



Mídia como corpo docente



“O mundo que vamos deixar para os nossos filhos depende muito dos filhos que deixamos para o mundo. A questão central é: o que estamos deixando marcado em nossas crianças?”. O questionamento foi colocado pelo filósofo e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Mario Sergio Cortella, que também participou do fórum.



Para Cortella, a propaganda sem responsabilidade não afeta só as crianças, mas também o adolescente que apesar de ter uma maior noção do objetivo da publicidade, se deixa seduzir pelas marcas, com a idéia de que só assim ele pode ser aceito entre os outros adolescentes. “Os jovens têm substituído a noção de direito por desejo. Estamos formando personalidades ego-narcisitas. É nossa tarefa impedir que as gerações a seguir não sejam alienadas, voltadas para dentro de si mesmas”, colocou.



Apesar do impacto negativo que a mídia tem atingido, Cortella afirma que demonizá-la não é o correto. “É preciso cuidado quando se fala da mídia como se devêssemos higienizá-la, pois ela possui um papel pedagógico muito importante e pode ser um grande instrumento para favorecer a idéia de cooperação mútua.”, defende. “Não é só a escola que educa, assim como não só é a mídia que destrói.”



Nesse contexto, Cortella colocou que os pais devem estar junto aos filhos quando eles estiverem diante da televisão ou da Internet. “A mídia é cada vez mais convidada para entrar em nossa casa. Nós abrimos as portas para ela. Estamos em um processo de construção, precisamos de senso crítico”, disse.



Responsabilidade de todos



Os pais, a escola e a religião, todos os meios e agentes sociais têm papel fundamental quando se trata de educar as crianças não só no que diz respeito ao consumismo, mas também em outros fatores como a erotização precoce e a violência. “Somos todos responsáveis pela educação e pelo consumo de nossas crianças. A grande questão é como educar os adultos que educam as crianças?”, afirmou Solange Jobim, psicóloga e conselheira do projeto Criança e Consumo.



“A família, a escola e a religião também têm responsabilidades, pois não é só o consumo que prejudica, mas também toda a lógica social”, complementou Susan Linn.



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