Pesquisas não captam vontade do eleitor, dizem especialistas
São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte são algumas das cidades nas quais os resultados das urnas contrariaram o que vinham apontando as pesquisas de intenção de voto. Segundo especialistas, as pesquisas conseguiram indicar apenas as tendências dess
Publicado 08/10/2008 18:28
A boca de urna realizada pelo Instituto Ibope, em São Paulo, indicou Marta Suplicy (PT) indo para o segundo turno 4 pontos à frente de Gilberto Kassab (DEM). A apuração dos votos, no entanto, mostrou Kassab com 33,87% dos votos válidos, contra 32,35% da petista.
Para Carlos Montenegro, presidente do Ibope, não houve erro de metodologia. “Eu tenho de parar a pesquisa às 14h para passar os dados para a televisão. Só que as pessoas continuam votando. O erro não é de metodologia, e sim de falta de pessoal para espalhar mais os pontos de entrevista. Para captar a vitória de Kassab, eu teria de fazer 10 mil entrevistas em vez de 6 mil, espalhar mais os pontos e combinar com a televisão para que a pesquisa fosse feita até as 17h [quando a votação se encerra]”, afirmou, em entrevista ao iG.
Sobre a virada de Kassab em São Paulo, Jefferson Goulart, pesquisador e professor da Universidade Estadual Paulista (UNESP), afirma que “é possível que uma parte do eleitorado de centro e de direita tenha percebido, por conta das pesquisas, que Alckmin não era mais o candidato que podia rivalizar com a Marta e tenha decidido migrar para Kassab”. Para ele, quando as pesquisas erram isso geralmente acontece porque a metodologia ou o critério de mensuração dos dados escolhido não foi a melhor opção.
No entanto, segundo Marco Villa, historiador e professor da UFSCar, a diferença entre as pesquisas e as urnas mostra que “há problemas metodológicos sérios” na realização dos levantamentos. “Qualquer pesquisa vai ser duvidosa daqui para a frente”, diz Villa. “Para não cair em uma visão conspirativa, nada melhor do que os institutos explicarem o que aconteceu e mudarem suas metodologias porque, caso contrário, não precisa de pesquisa”, argumenta ele.
“Acreditar em pesquisa agora é acreditar em conto de fadas. Fiquei até meia-noite esperando um milagre acontecer, todos os votos irem para Marta para que ela passasse o Kassab. Afinal, eu acreditei nas pesquisas”, acrescenta o historiador.
O presidente do Ibope afirma que o único problema do instituto foi na boca-de-urna em São Paulo. Já o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, disse que “as pesquisas foram tão precisas como sempre”.
Para o pesquisador Jefferson Goulart, as regras restritivas para as campanhas eleitorais, adotadas nos últimos anos, têm feito com que o eleitor se envolva menos e deixe sua escolha para a reta final da eleição.
“Também tivemos um período curto de campanha por causa das Olimpíadas e de outros fatores político-econômicos, o que levou o eleitor a fazer sua escolha mais tarde”, explica Goulart. “Esse movimento as pesquisas conseguiram mensurar apenas como tendência, mas nenhuma pesquisa tem aparato técnico para medir pontualmente essa manifestação.”
O presidente do Ibope concorda com o pesquisador e diz que os institutos não têm como acompanhar essa mudança de costumes políticos da população. “O eleitorado, a cada eleição, passa a decidir mais na última hora e a pesquisa não tem condição de indicar essa decisão de última hora.” Além disso, Montenegro assevera que, na eleição municipal, as pessoas mudam mais de opinião do que numa eleição presidencial, dificultando a atuação dos institutos.
O diretor-geral do Datafolha afirma que a escolha de última hora não atrapalha as pesquisas. “Isso não atrapalha as pesquisas, atrapalha a análise dos números das pesquisas”, diz Paulino. “Quem continuar analisando os números das intenções como prognósticos para eleição vai continuar errando.” Ele afirma ainda que “nós, pesquisadores, devemos deixar isso mais claro, não chamar as pesquisas de prognóstico, mas como as intenções daquele dia apenas, senão podemos induzir a erros”. Para ele, “onde há movimentos, as pesquisas não vão bater com o dia da eleição porque esse movimento continua a alterar o cenário depois da pesquisa”.
Tendências
Goulart não vê grandes erros nos números indicados pelas pesquisas para a sucessão municipal. “As pesquisas conseguiram captar as tendências em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, todas as pesquisas no período mais recente conseguiram identificar a subida de alguns candidatos e indicaram essas tendências, no entanto, elas não conseguiram mensurar o volume”, explica.
Rubens Figueiredo, cientista político da Universidade de São Paulo (USP), afirma: “As pesquisas não estiveram tão erradas, porque se você pegar a tendência que elas indicavam, a tendência de Marta e Crivella era de queda, a tendência de Kassab, Gabeira e Quintão era de alta”. Para ele, “os institutos podem não ter acertado o resultado, mas indicaram a tendência correta”.
Para Mauro Paulino, “é errado comparar a última pesquisa com o resultado da urna, o que deve ser considerado válido é se a tendência apontada foi coerente”.
Regulamentação
O professor Jefferson Goulart afirma ter dúvidas sobre a utilidade pública das pesquisas divulgadas na véspera da eleição e é a favor da criação de normas para regular o setor. “Eu defendo uma regulamentação intermediária, limitando as pesquisas na véspera da eleição, mas que não tenha componentes de censura. Veja como é uma coisa contraditória, a legislação proíbe a divulgação de pesquisas boca-de-urna até o fim da votação e faz isso porque reconhece que a pesquisa tem algum grau de influência na escolha do eleitor e pode ser prejudicial. Se isso já é reconhecido, por que não regulamentar toda a divulgação de pesquisa?”, argumenta.
Marco Villa, ao contrário, se diz “favorável à divulgação de pesquisas até no dia do pleito, porque cabe ao cidadão ter o discernimento para escolher seu voto e não se deve controlar o eleitor”. Mauro Paulino, do Datafolha, comenta que em uma democracia as pessoas têm o direito de escolher dar um voto útil, com base nas pesquisas.
Fonte: iG / Último Segundo