Soldado denuncia: EUA usaram bomba nuclear no Iraque
O veterano Jim Brown, ex-militar americano com dez anos de experiência, revelou a dois jornalistas italianos esta semana que os EUA lançaram uma bomba atômica contra a cidade iraquiana de Basra, em 27 de fevereiro de 1991, durante a operação Tempestade
Publicado 09/10/2008 16:43
Jim Brown conta que a bomba nuclear lançada, de cerca de cinco quilotons, é chamada pelos militares americanos de ''bomba nuclear de potência variável''. A notícia também foi repercutida pelo jornal espanhol El País em sua capa desta quinta-feira (9).
Se confirmada a denúncia, essa bomba seria a terceira lançada por um governo contra outro país em situação de guerra, após os lançamentos de agosto de 1945, contra Hiroxima e Nagasaki.
''Basicamente trata-se de uma bomba de penetração de alta eficiência. Uma vez lançada, penetra dentro do objetivo, neste caso dentro da terra, onde explode. É utilizada também para que se evite o acesso a certas áreas, já que a região inteira emite radiações, o que é uma mensagem muito eficaz se você deseja que alguém se mantenha longe desse lugar. Ela se chama Bunker Booster''.
Os jornalistas entrevistaram também um médico iraquiano que trabalhou em Basra em seguida à Guerra do Golfo. Jawal al Ali contou que os índices de pessoas que apresentaram câncer, após a Guerra, aumentaram de forma surpreendente. Al Ali exibiu também fotografias de casos raros de câncer em crianças da região.
Os jornalistas procuraram também o Departamento de Estado americano, que negou, por meio de uma comunicação escrita, que tivesse utilizado armas não convencionais durante o conflito. Segundo o comunicado, apenas uma bomba, a BLU-82, excederia os 2 mil quilos de massa de capacidade explosiva. Mas os jornalistas afirmam que ela não teria condição de produzir um tremor sísmico como o verificado na região de Basra no dia do suposto lançamento da arma nuclear.
Leia abaixo parte da entrevista:
Apresente-se, por favor.
Me chamo Jim Brown. Sou um veterano do exército americano com dez anos de experiência.
Quando esteve no Iraque?
Me enviaram à Arábia Saudita para apoiar as tropas que deveriam intervir no Iraque. Entrei em serviço em 25 de setembro e deixei a Arábia Saudita em 16 defevereiro de 1991.
O que ocorreu ali que ainda não é conhecido?
Os militares americanos, junto com seus aliados, lançaram uma bomba nuclear de cerca de cinco quilotons de potência na zona de Basrá, no Iraque.
Onde a lançaram?
Entre a cidade de Basra e a fronteira com o Irã.
Quem a lançou?
O serviço foi feito por militares americanos. É uma bomba nuclear de cinco quilotons que recebe o nome de ''bomba nuclear de potência variável''.
Que tipo de arma era?
Basicamente trata-se de uma bomba de penetração de alta eficiência. Uma vez lançada, penetra dentro do objetivo, neste caso dentro da terra, onde explode. É utilizada também para que se evite o acesso a certas áreas, já que a região inteira emite radiações, o que é uma mensagem muito eficaz se você deseja que alguém se mantenha longe desse lugar. Ela se chama Bunker Booster.
Segundo a acusação do veterano Jim Brown, durante a primeira guerra do Golfo se lançou uma pequena bomba nuclear de cinco quilotons, entre a cidade iraquiana de Basra e a fronteira com o Irã. Se isso aconteceu, se trata da terceira bomba nuclear usada durante uma guerra, após as de Hiroxima e Nagasaki.
Uma bomba nuclear de cinco quilotons é uma bomba relativamente pequena, menor que a de Hiroxima, que era de 16 quilotons e a de Nagasaki, que era de 22. Entretanto, os efeitos da radioatividade são igualmente terríveis.
Tivemos conhecimento do testemunho de Jim Brown graças a William Thomas, um jornalista canadense que trabalhou muito com veteranos do exército dos EUA.
Não tem medo de falar disso?
É preciso entender o que é o medo. Há um ponto em que deve dizer: Basta! E quando você supera essa linha, não é por estar muito certo de si. Você faz ou não faz. Quando estava servindo, levantei a mão direita e fiz um juramento, afirmando ''Isso é o que defenderei''.
Quem é Jim Brown:
Nascido em 1965, entra no exército aos 22 anos e se forma engenheiro mecânico na Décima Divisão de Fort Drum. Participa na operação Tempestade no Deserto, na Arábia Saudita desde 25 de setembro de 1990 a 16 de fevereiro de 1991. Regressou por problemas familiares e começou a acusar alguns problemas estranho.
Como outros veteranos, começa uma longa batalha para que sua doença seja reconhecida. Segundo ele, sua enfermidade teve início após tomar uma vacina contra o antraz, que lhe deram quando estava na Arábia Saudita.
Em 1997 o repreenderam oficialmente por algumas discussões e o rebaixaram de Engenheiro de Nível 4 a Engenheiro de Nível 3. Ao reduzir a sua graduação, o impedem também de desempenhar a tarefa para a qual havia sido designado. Finalmente o exoneram do cargo, mas ''com honra''.
Sua atividade na organização dos veteranos do exército americano o tornou conhecido pelos principais meios de comunicação dos EUA, quando escreveu um artigo publicado em 2003 no The New York Times. Foi convocado então pelo Comitê de Assessores da presidência dos Estados Unidos sobre enfermidades de Veteranos da Guerra do Golfo. Ao regressar da operação Tempestade no Deserto fundou a Organização de Veteranos Gulf Watch Intelligent Networking System.
Jim Brown fala pela primeira vez do uso de uma pequena bomba nuclear sob pseudônimo, no site do jornalista canadense Thomas William. Esta é a primeira entrevista de Jim Brown, na televisão, sobre este assunto.
Por que a utilizaram?
A melhor explicação que pude chegar até o momento é que se tratou de mandar a Saddam Hussein a mensagem de que estavamos determinados a terminar a guerra e acabar com o conflito.
Como se pode comprovar seu testemunho? Comprovamos que no Banco de Dados Online do Centro Sismológico Internacional, na área próxima da cidade de Basra no Iraque, foi registrado um fenômeno sísmico de força equivalente a cinco quilotons, que corresponde a uma magnitude de 4,2 aproximadamente na escala Richter.
Vimos que a única atividade sísmica detectada durante os 43 dias da operação Tempestade no Deserto foi um fenômeno de magnitude 4,2 na escala Richter e que isso foi detectado precisamente na área assinalada por Jim Brown, entre a cidade de Basra e a fronteira com o Irã.
A atividade está catalogada com o número 342793 e aconteceu em 27 de fevereiro de 1991, exatamente o último dia do conflito, às 13h39, hora local. Nove centros sísmicos detectaram o abalo: 2 no Irã, 4 no Nepal, um no Canadá, um na Suécia e um na Noruega. Estes dois últimos mediram inclusive a intensidade da explosão, equivalente a aproximadamente 4,2. Em relação a sua profundidade, foi classificado como superficial, que vai de 0 a 33 km.
Pode-se recolher mais informações por meio de análises das ondas sísmicas registradas nas estações de vários países, mas, diante do trabalho colossal que certemante resultaria este trabalho, pedimos aos organismos internacionais que efetuem controles antinucleares, e aos centros sísmicos nacionais citados, que nos ajudem a recolher dados seguros que permitam estabelecer que se tratou de uma explosão ou de um terremoto.
Em qual contexto histórico e político se poderia usar uma arma como essa de que falou o veterano?
Repassemos então uma breve cronologia dos fatos:
2 de agosto de 1990: Saddam Hussein invade o Kuwait.
16 de janeiro de 1991: O presidente George H. W. Bush anuncia ao mundo que tem início a operação Tempestade no Deserto, a maior operação bélica desde 1948. 28 países realiza a intervenção, apoiando os Estados Unidos.
Como reagiria o mundo islâmico?
Declaração de James Baker (secretário de Estado dos EUA na época):
''Queremos assentar as bases que nos permitam ter uma opção segura de uso da força (nuclear), o que é o mesmo que dizer que o presidente tomou a decisão de agir nesse sentido. Gostariamos de lançar uma mensagem muito clara — e está muito claro — e indiscutível: quando o presidente diz que não deseja descartar essa possibilidade, é porque não a descartamos como opção, e que a consideramos uma opção segura''.
Se Saddam tivesse usado armas químicas ou bacteriológicas, o Pentágono poderia ter respondido com uma bomba atômica. Em qualquer caso, sobre o uso da bomba nuclear, tentou se mostrar uma ambigüidade calculada. O mesmo secretário de Estado, James Baker, cunhou a expressão ''Doutrina de ambigüidade calculada''.
Jim Brown: a questão central é que, acontecesse o que acontecesse, os EUA iriam obter um resultado positivo: podiam jogar essa bomba em uma das zonas mais desertas disponíveis imediatamente ao longo do conflito, podiam reconhecer esse fenômeno como o que era na realidade ou não podiam reconhecê-lo, pois foi realizado em parte sob a terra, podia ver-se uma versão menor do típico cogumelo atômico, mas a certa distância, não iria entender-se o que estava acontecendo. Os efeitos poderiam ser imediatos e também a longo prazo.
Em 1991 foi inaugurado o uso de outra arma no campo de batalha: a munição com urânio empobrecido. Durante a Tempestade no Deserto se usaram projéteis de urânio empobrecido. Por que?
O urânio empobrecido e o urânio não empobrecido mostravam uma espécie de assinatura radioativa que permitia confundi-los, não distingui-los. Além disso, com o urânio empobrecido, os efeitos imediatos provocados nos indivíduos, nos edifícios e nos veículos, imitam de maneira semelhante os efeitos provocados por uma explosão nuclear maior, como a evaporação imediata dos corpos, a destruição inaudita das ruas, a perda de sangue pelos olhos e nariz.
As radiações que emitem estes pequenos projéteis de urânio empobrecido permanecem eternas, mas se estes projéteis forem utilizados de forma repetida, como por exemplo no canhão do avião-bombardeiro A-10, provocam um impacto forte de radiação, não só por meio do pó liberado, mas também pela propagação causada pela explosão dos projéteis.
O uso desse tipo de arma pode ser útil para encobrir uma bomba?
Na realidade, poderia acobertar tudo o que acontecia.
Se a denúncia do veterano Jim Brown tiver fundamento, que poderia ter levado o governo americano a lançar uma pequena bomba atômica, justo no último dia de guerra?
Só podemos especular a respeito de um fato: dois dias antes da suposta decisão de lançar uma bomba atômica, em 25 de fevereiro, um míssil Scud dos iraquianos alcançou a base americana de Dhahran, na Arábia Saudita, com um saldo de 28 militares mortos e 99 feridos. Isso provocou uma forte reação americana: na noite de 26 para 27 de fevereiro uma coluna de carros de fugitivos iraquianos foi destruída por completo bem na fronteira do Kuwait. É possível que não tenha sido a única ação de represália. É uma hipótese ventilada, mas a política do governo americano no ano de 1991 foi calculadamente ambígüa.
Há testemunhas?
Sim, há. Eu mesmo falei com pessoas que estavam no lugar quando a explosão aconteceu. Conheço outros que também souberam da explosão por meio de testemunhas oculares. Sei que pode parecer estranho, mas é assim como funciona a ''comunidade da informação'': um indivíduo proporciona uma informação, coteja com outro e, no fim, detalhe por detalhe, a história é reconstruída, de forma completa. Quando o governo está implicado, jamais admitirá ter feito algo assim.
Como soube do caso?
A organização que criei se chama Gulf Watch Intelligence Networking System (Sistema Integrado de Inteligência e Observação do Golfo, tradução livre). Durante muitos anos reunimos informações para revelá-las e impedir que possam ocorrer novamente, porque posso te assegurar que, se conseguiram encobrir isso em 1991, também encobriram em 2002 e seguirão encobrindo os fatos enquanto puderem ou enquanto deixemos que façam. Isso tem de acabar.
Antes de publicar esta entrevista informamos ao Departamento de Defesa americano de que um veterano de seu exército nos contara que, durante a operação Tempestade no Deserto teria sido lançada uma pequena bomba nuclear. Nos perguntaram o dia e, depois, nos enviaram o seguinte comunicado:
''Durante a Guerra do Golfo, de 1991, somente armas convencionais foram utilizdas. Os EUA possuem munições com uma capacidade explosiva de mais de 5.000 pounds (2 mil toneladas). Não pudemos confirmar o incidente concreto ao que se referiram, mas se naquele lugar tivesse sido lançada uma bomba potente, é razoável supor que a detonação teria sido registrada nos aparatos de detecção sísmica (sismógrafos). Ratificamos que, durante a Guerra do Golfo, de 1991, somente foram utilizadas munições convencionais''.
Em uma carta posterior, o Departamento de Defesa nos informou que poderia se tratar da bomba BLU-82, que tem uma capacidade explosiva de 7 mil toneladas, e volta a dizer que ''somente foram usadas armas convencionais''. Entretanto, a detonação da bomba BLU-82, apelidade de ''mãe de todas as bombas'', ou ''cortadora de margaridas'', que explode no ar (e não sob o solo) o oxigênio, o hidrogênio e outros elementos, alcança uma magnitude de 3 na escala Richter, não de 4,2, como aparece nos dados colhidos pelos siosmógrafos naquela região.
Jim Brown: Estas bombas eram usadas junto com outras; as FI, as bombas de aerossol explosivo, também conhecidas como MOAB (mãe de todas as bombas, em inglês). A principal diferença entre ambas é que a MOAB, ou bomba FI, têm os mesmos efeitos que uma bomba nuclear, podem inclusive formar um cogumelo nuclear igual ao atômico, nas não deixam contaminação radioativa. O problema da bomba nuclear é que, quando explode, além da detonação, há contaminação radioativa. Não é algo que acontece e logo passa, é algo que acontece e fica.
O relato de Jim Brown gera alguns calafrios mas é, até agora, desprovido de confirmações que possam certificar a veracidade de sua hipótese, como a de que o uso de urânio empobrecido pode camuflar a explosão de uma bomba atômica de baixa potência.
Segue sendo uma mera hipótese, que publicamos seguindo a um ''princípio de precaução'': quando uma hipótese não é manifestamente falsa e têm uma importância social tão grande, é muito melhor falar dela que não dizer nada à espera de confirmação. São muitas as pessoas, principalmente muitas crianças, que adoeceram depois da Tempestade no Deserto na área de Basra.
Contatamos, durante uma conferência em Istambul, com o doutor Jawad al Ali, diretor do Instituto Oncológico do hospital de Basra, autor de várias investigações sobre a radioatividade na cidade:
A história das radiações em Basra começou durante a primeira Guerra do Golfo, em 1991, quando foram lançadas sobre a cidade cerca de 300 toneladas de projéteis com urânio empobrecido, o que elevou demasiadamente o nível das radiações, que em Basra era muito baixo.
O ano de 1991 foi marcado pelo ataque mais agressivo, quando foram destruídas por completo as infraestruturas do país. Todas as pontes foram destruídas e não se podia viajar de Basra a Bagdá. A história se repetiu em 2003, quando também foram lançadas centenas de toneladas de projéteis com urânio empobrecido sobre a população civil em áreas onde só vivia gente comum, o que provocou novos problemas: aumento dos tumores, aumento das mal-formações congênitas. Como vocês sabem, o tempo de decaimento da radioatividade do urânio é de 4,5 milhões de anos, de modo que se trata de uma tentativa de matar a população iraquiana envenenando o solo e os recursos hídricos do Iraque durante milhões de anos.
É difícil fazer investigações sobre a radioatividade em Basra?
Não permitem a ninguém falar disso, salvo os porta-vozes oficiais, e nós não temos essa função. Podemos fazer investigações sobre a difusão do câncer, mas não podemos fazer estudos sobre fatores de risco, não nos concedem fundos para nenhuma dessas investigações. Se pode fazer estudos epidemiológicos ou clínicos, mas não sobre radiações ou relativos a este campo.
Investigar sobre as radiações no Iraque é difícil, não só no Iraque, mas também na Itália. Vejamos a experiência de Gianni Mattioli, que na época era ministro do Meio Ambiente:
Gianni Mattioli: Em janeiro de 2001 o ministro de Saúde do Iraque, Mubarak, solicitou uma reunião comigo. Durante o encontro Mubarak apresentou dados de uma situação verdadeiramente grave em áreas que tinham sido bombardeadas com munições de urânio empobrecido, A petição do ministro Mubarak é que a Itália colaborasse em uma investigação epidemioloógica para por em evidência a dimensão do problema, e para localizar seus focos, mas também para tomar medidas de proteção. Com o desenrolar do projeto topamos com uma objeção concreta, uma verdadeira proibição da administração atlântica, da Otan.
Mesmo assim, apesar da proibição de investigar os efeitos das armas utilizadas em Basra, com o passar do tempo, esse efeitos passaram a ser conhecidos de forma dramática.
Jawad al Ali: Há um gráfico que mostra o aumento da mortalidade devido a tumores em Basra, que foi significativo e em 2001 superou o número de 600 mortos anualmente por câncer. Em 1989, apenas 34 pessoas morreram de câncer. Em relação às fotos, guardei as dos casos mais raros, como o histiocitoma fibroso maligno. São tumores muito raros, estritamente associados às radiações, ou seja, são causados por radiações, de modo que documentei com fotografias esses tumores.
Arquivei fotos de crianças com tumores, porque parece que os tumores mudaram de grupos de idade. Alguns tumores, que se manifestavam em pacientes de idade avançada agora aconteciam em pacientes muito jovens, de seis anos, ou seja, houve um deslocamente de tumoreas das faixas de idade de paciente maduros para crianças de até dez anos. É algo raríssimo, o mesmo que a aparição de um tumor no aparelho linfático de crianças com menos de dez, anos, que só acontecem em casos extremamente raros.
Jim Brown, acredita que lançaram essa bomba outras vezes?
No Afeganistão, em 2002.
Pode dizer a data?
De 1 a 3 de março.
Convidamos nossos colegas jornalistas de todo o mundo e as organizações internacionais dedicadas ao controle da atividade nuclear no planeta a colaborar, então, na verificação destas notícias.
Fonte: Rai News 24, emissora estatal italiana.
Veja a íntegra (em italiano):
http://www.rainews24.it/ran24/
rainews24_2007/inchieste/08102008_bomba/
A fonte contém links do texto original em italiano, do vídeo original em italiano e uma apresentação feita pelo doutor Jawal al Ali, no programa Power Point, com fotografias de crianças e recém-nascidos portadores de mal-formações causadas por tumores.