Argemiro Ferreira: As razões de Powell para apoiar Obama
Ele foi o negro – ou africano-americano – que chegou aos mais elevados cargos na história dos EUA. Primeiro, o mais alto da hierarquia militar: chefe do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas. Depois o de secretário de Estado, terceiro na linha da su
Publicado 20/10/2008 11:25
Mas Colin Powell, que em 1995 era o candidato potencial preferido pela maioria dos americanos (republicanos, democratas e independentes) à Casa Branca, viu a própria imagem ser destroçada antes de deixar o governo Bush ao fim do primeiro mandato. Arrependeu-se publicamente do discurso na ONU, onde o pretexto das inexistentes armas de destruição em massa foi usado para justificar a guerra.
Desde então tem tido papel discreto, relativamente fiel ao partido ao qual se filiou em 1995, o republicano. Até ontem, quando reapareceu no centro do palco, como convidado do Meet the Press da NBC, e anunciou em entrevista que dará seu voto em 2008 ao democrata Barack Obama. Seria apenas mais um apoio, mas Powell foi mais longe – e fundamentou muito bem seus argumentos.
Um conjunto de motivos fortes
Como ex-chefe militar e ex-secretário de Estado, seu respaldo contribui, em primeiro lugar, para desautorizar a alegação tão repetida pela campanha rival de que Obama está insuficientemente preparado para ser comandante em chefe. Powell foi enfático ao dizer que conhece John McCain há 25 anos e passou a conhecer Obama muito bem nos últimos dois.
“São ambos americanos dedicados e patriotas. (…) Qualquer um dos dois pode ser um bom presidente. (…) Preocupo-me com o rumo tomado pelo Partido Republicano nos últimos anos. Foi mais para a direita.” Quanto a Obama, Powell acha que passou bem pelo teste sobre a dúvida levantada sobre uma suposta falta de experiência.
Depois do agravamento da crise econômica, disse, teve uma boa medida dos dois candidatos. McCain inseguro, quase com um enfoque diferente a cada dia sobre como enfrentar a situação. “E fiquei apreensivo ainda com a escolha de Sarah Palin para vice”, disse o ex-secretário de Estado. “Minha conclusão foi de que ela não está preparada para ser presidente. E vice tem de estar. Tal detalhe levanta dúvida ainda sobre a capacidade de julgamento de McCain”.
Quanto a Obama, Powell observou “uma firmeza, uma curiosidade intelectual, conhecimentos profundos e o enfoque adequado de problemas como esse, da escolha do vice-presidente. Para mim, ele está perfeitamente preparado para exercer a presidência. Mostra vigor intelectual, não fica mudando a cada dia, daqui para ali.”
Um rumo estreito e perigoso
Com base na sua observação das últimas sete semanas, Powell também achou que a conduta do Partido Republicano e do próprio McCain tornou-se cada vez mais estreita. Obama, ao mesmo tempo, mostrava visão mais inclusiva e mais ampla sobre as necessidades e aspirações do povo americano, buscando superar as divisões étnicas, raciais e de gerações.
Para o candidato democrata, segundo o ex-secretário, “toda aldeia tem seus valores, todas as cidades têm valores. Não são apenas as cidades pequenas que têm valores”. A referência é ao discurso que passou a ser adotado na campanha republicana, principalmente pela candidata Palin.
“E, francamente, também estou desapontado com alguns dos enfoques recentes que passaram a aparecer nos anúncios de McCain. Sobre coisas que nada têm a ver com os problemas do país. Como o caso Bill Ayers, que passou a ser o centro da campanha (republicana). Por que essa insistência nisso? E porque os robocalls em todo o país insinuando ligações inexistentes de Obama com terrorismo?”
A última referência é aos telefonemas gravados de ataques aos democratas, feitos por centrais automáticas. Powell não chegou a dizê-lo explicitamente, mas indicou que isso e o papel da vice Palin são parte do novo rumo direitista republicano. Ele vê ainda com preocupação o fato de que o futuro presidente terá de indicar mais dois juízes para a Suprema Corte e McCain na certa escolheria mais dois conservadores.
Contra o preconceito anti-islâmico
Há coisas que McCain não chega a dizer, mas Powell ouve de pessoas do partido. “A campanha permite que seja dito, por exemplo, que Obama é muçulmano. Ora, ele não é muçulmano. É cristão, sempre foi. E se fosse islâmico? O que há de errado em ser muçulmano neste país? (…) Ouvi altos membros do meu partido dizerem: ‘É muçulmano e pode estar ligado a terroristas’. Não se pode fazer isso na América”.
Ao reagir com firmeza, Powell citou ensaio fotográfico que viu numa revista. Incluía a foto de uma mulher com a cabeça junto ao túmulo do filho no cemitério de Arlington. A lápide citava condecorações por bravura. Morrera no Iraque, aos 20 anos. “Não havia cruz cristã, nem estrela de Davi, mas a crescente e a estrela da fé islâmica. (…) O nome dele era Kareem Rashad Sultan Khand”, disse.
Powell negou na entrevista estar apoiando Obama por ser negro como ele. E indignou-se mais de uma vez com as alegações absurdas e de má fé da campanha de McCain sobre o caso Ayers. Disse que Obama conhece bem os problemas do país, fala com autoridade sobre eles, sabe os desafios a enfrentar e está cercada por gente muito qualificada, terá excelente assessoria. “Está pronto a agir já no primeiro dia”, garantiu.