Norval Baitello Jr: mídia fez criminoso se ver como um herói

Na cobertura do caso Eloá, a mídia “exacerbou a psicopatia que estava em jogo” e fez com que o captor se visse como herói. Esta é a opinião de Norval Baitello Jr, professor da pós-graduação da PUC-SP, doutor em distúrbios da imagem e estudioso do assunto

Em depoimento concedido ao repórter Vinícius Queiroz Galvão e publicada na Folha de S.Paulo desta terça-feira (21), o acadêmico tenta responder a uma pergunta que, passado o cárcere privado, se volta aos próprios meios de comunicação: até que ponto a veiculação de entrevistas ao vivo com o criminoso contribuiu para o desfecho trágico do caso?


 


Como o sr. analisa o papel desempenhado pela mídia no cárcere privado de Santo André?
Acho que foi bastante equivocado, desde o começo. Mas isso talvez se deva a um equívoco básico, que é o de que a mídia tem de informar a qualquer custo. E esse fetiche da informação coloca qualquer notícia no mesmo patamar.


 


Até que ponto a veiculação de entrevistas ao vivo e declarações do seqüestrador contribuíram para o desfecho trágico do caso?
Acredito que esse fetiche da informação a qualquer custo não passa de espetacularização. Se confunde espetacularização com informação — porque a espetacularização vende mais do que a notícia.


 


A mídia realçou os traços emocionais da tragédia?
A mídia exacerbou a megalomania, a psicopatia e a loucura que estava ali em jogo.


 


Os repórteres e apresentadores não saíram do seu papel, que é informar, ao negociar e falar diretamente com o criminoso?
Todo mundo colocou os pés pelas mãos.


 


Qual o limite para a cobertura dos meios de comunicação?
Não existe um limite. Os meios de comunicação têm de cuidar também da sua própria imagem. Esse caso foi péssimo para a sustentabilidade dos próprios veículos.


 


As TVs e os jornais não fizeram uma glamourização da atividade criminosa?
Uma vez que ele aparece na televisão, passa a se ver como um herói.


 


A mídia não aprende com seus próprios erros?
Falta um acordo tácito da própria mídia. Na medida em que há uma escalada, em que o concorrente mostra cenas fortes, o jornal é coagido. É preciso estabelecer limites.


 


Isso parece ser o modelo americano de cobertura.
O modelo europeu tem sido muito mais cuidadoso. Isso é totalmente americano. Por isso se vê lá uma escalada da violência.