Leon Cakoff: a crise do quarto poder e as novas mídias
O jornal francês Libération de 19 de maio trouxe uma triste revelação — a entrevista do seu repórter com Penélope Cruz teria sido cancelada no último minuto sob o pretexto de que ela estaria com uma forte dor de cabeça. Em seguida a reportagem
Publicado 02/06/2009 20:22
A assessoria de imprensa do filme de Pedro Almodóvar, no qual ela é endeusada como personagem e como atriz, teria preferida trocado o horário da entrevista para o jornal com outras para emissoras de televisão. A televisão, mais fugaz e menos reflexiva, necessita de menos tempo para os seus registros. A imprensa escrita precisa de mais tempo…
Libération , em outro artigo, de 14 de maio, reflete a crise pela qual passa a imprensa mundial. O “quarto poder”, como por muito tempo se define a imprensa e o jornalismo, justamente para vigiar e manifestar-se livremente num estado democrático sobre os outros três poderes — o legislativo, o executivo e o judiciário — , estaria vivendo uma crise de identidade, sem poder acompanhar a velocidade e as atrações dos infinitos sítios de notícias e pesquisa na internet. Desde 2000 a imprensa americana estaria perdendo entre 2 a 10% de leitores por ano, com 15 mil jornalistas americanos desempregados só em 2008.
Abalado pelo fechamento do Rocky Mountain News, de Denver; a situação falimentar do Chicago Tribune e do Los Angeles Times, as dificuldades financeiras conhecidas por seus dois maiores ícones The New York Times e o Washington Post, fez o senador democrata John Kerry prognosticar que “o jornalismo é uma espécie em via de extinção” ao abrir os trabalhos sobre “O Futuro do Jornalismo“ na subcomissão senatorial que preside, sobre comunicação.
Visto que está descartado o socorro aos jornais americanos como se socorreu bancos e montadoras, Benjamin Cardin, de Maryland, outro senador democrata, chegou a sugerir que os jornais se reorganizem como sociedades sem fins lucrativos, para não pagar impostos como igrejas, hospitais e escolas. Mas nem tudo está perdido de acordo com Le Journal du Dimanche de 24 de maio.
“A imprensa escrita não está morta!”, começa dizendo o artigo de Pierre-Marie Cristin, referindo-se ao recente sucesso do diário The Daily Telegraph ao denunciar as despesas abusivas dos deputados britânicos. Em 11 dias seguidos de matérias sobre este novo escândalo britânico, o Daily Telegraph teria ganhado 100 mil novos leitores. Na Alemanha, Die Zeit estaria escalando um progresso de 4% de novos assinantes graças à qualidade e à originalidade de seus artigos.
Segundo o Le Journal du Dimanche o sucesso do jornal britânico seria devido à integração da sua redação para artigos impressos e de internet. E o descrédito da americana ao fato de não ter duvidado ou afrontado a política belicista na administração Bush. O que está claro neste debate é também a credibilidade dos jornais impressos contra a leviandade de muitos textos distribuídos na internet, sem nenhuma responsabilidade com a verdade.
Seja como for, a lamúria do Libération por ser preterido na entrevista com Penélope Cruz, denuncia sobretudo o seu próprio papel durante o Festival de Cannes. Em 1981, quando o crítico Serge Daney largou a revista Cahiers du Cinéma para ser o editor de cinema do Libération, o jornal era como que leitura obrigatória no Festival de Cannes e um exemplo a seguir de jornalismo moderno e inventivo.
Em 1987, uma manchete do jornal para falar de Crônica de uma Morte Anunciada (Chronicle of a death foretold), do italiano Francesco Rosi, teve o poder de destruiu a carreira do filme e espalhou mal-estar entre todos os jornalistas que cobriam o festival. A manchete cruel da matéria do critico Gérard Lefort: “Crônica de uma merda anunciada”.
Como vemos, Libération não é mais assim indispensável. A sua própria redação sabe disso. No dia em que o jornal refletia sobre a crise mundial da imprensa, a sua edição de 40 páginas traria apenas duas páginas de anúncio.
No dia 21 de maio, diante do meu espanto ao descobrir na banca que naquele dia o Libération não circulava por ser feriado nacional na França, a resposta da jornaleira foi lapidar: “C’est la France, monsieur!”. No mesmo dia sem o jornal impresso nas bancas da França, recebo por e-mail uma edição digital do mesmo Libération.