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Artigo do NYT: 'Obama comete graves erros na América Latina'

Houve muita esperança na América Latina quando o presidente Barack Obama foi eleito. A reputação dos Estados Unidos na região fora profundamente abalada sob George W. Bush e todos os governos de tendência esquerdista manifestaram otimismo, acreditando que Obama seguiria outro rumo. Essas esperanças desabaram. O presidente Obama continuou as políticas de Bush e, em alguns casos, fez pior.
 

Por Mark Weisbrot*, no The New York Times

A derrubada militar do presidente democraticamente eleito de Honduras, Manuel Zelaya, em 28 de junho, tornou-se um claro exemplo da omissão de Obama no hemisfério. Houve sinais de que algo estava errado em Washington desde o início, quando a primeira declaração da Casa Branca não chegou nem mesmo a criticar, e muito menos a condenar, o golpe.

Foi a única declaração de um governo a adotar uma posição neutra. A Assembleia Geral das Nações Unidas e a Organização dos Estados Americanos votaram com unanimidade pelo "retorno imediato e incondicional" do presidente Zelaya.

Declarações conflitantes da Casa Branca e do Departamento de Estado surgiram nos dias subsequentes, mas na última sexta-feira o segundo órgão deixou clara sua "neutralidade" entre a ditadura e o presidente democraticamente eleito de Honduras.

Em carta ao senador Richard Lugar, o Departamento de Estado afirmou que "nossa política e estratégia para o engajamento não se baseia no apoio a nenhum político ou indivíduo em particular", e pareceu culpar o presidente Zelaya pelo golpe: "A insistência do presidente Zelaya em adotar ações provocadoras contribuiu para a polarização da sociedade hondurenha e levou a um confronto que desencadeou os eventos que resultaram em sua remoção".

A carta se espalhou por toda a mídia hondurenha, controlada pelo governo golpista e seus simpatizantes, e mais uma vez os fortaleceu politicamente. Congressistas republicanos que apoiam o golpe imediatamente cantaram vitória.

Na segunda-feira, o presidente Obama repetiu sua declaração anterior de que Zelaya deveria retornar. Desta vez, contudo, ninguém se deixou enganar.

Obama disse que "não pode apertar um botão e de repente reinstaurar Zelaya". Mas ele não apertou os botões que tem à disposição, como o congelamento dos bens nos Estados Unidos dos líderes do governo golpista e seus simpatizantes ou o cancelamento de seus vistos (o Departamento de Estado cancelou o visto diplomático de cinco membros do governo golpista, mas eles ainda podem entrar nos Estados Unidos com um visto normal. Esse gesto não teve nenhum efeito).

Com aliados de Hillary Clinton, como Lanny Davis e Bennett Ratcliff, conduzindo a estratégia do governo golpista, o Pentágono de olho em sua base militar em Honduras e os republicanos ideologicamente ligados aos líderes do golpe, não deveria surpreender o fato de Washington estar mais interessado em proteger seus amigos na ditadura do que em princípios como democracia ou respeito à lei.

Mas isso não torna a política de Obama mais justificável ou menos infame. E Washington mantém um silêncio sintomático diante de atrocidades e abusos dos direitos humanos cometidos pela ditadura: o assassinato de pelo menos dez ativistas da oposição, a detenção e intimidação de jornalistas, o fechamento de emissoras de TV e rádio independentes e outras medidas de repressão condenadas pela Anistia Internacional, Human Rights Watch e outras organizações de direitos humanos no mundo todo.

Além da omissão no caso de Honduras, o governo Obama motivou na semana passada expressões públicas de preocupação de líderes como os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, e Michelle Bachelet, do Chile – além de outros mandatários -, com sua decisão de aumentar a presença militar norte-americana em sete bases na Colômbia.

Washington aparentemente não consultou com antecedência os governos sul-americanos, fora o da Colômbia. O pretexto para a expansão é, como sempre, a "guerra contra as drogas". Mas a lei no Congresso que financiaria essa expansão permite um papel muito mais amplo; não é a toa que a América do Sul está desconfiada.

Obama tampouco reverteu a decisão do governo Bush de reativar a Quarta Frota da Marinha dos Estados Unidos no Caribe pela primeira vez desde 1950 – uma decisão que causou apreensão no Brasil e em outros países.

O presidente Obama também deu continuidade às sanções comerciais do governo Bush contra a Bolívia, vistas em toda a região como uma afronta à soberania nacional boliviana. E, apesar do aperto de mãos mundialmente famoso entre Obama e o presidente Hugo Chávez, o Departamento de Estado manteve praticamente o mesmo nível de hostilidade à Venezuela – principalmente na forma de denúncias públicas – praticado pelo presidente Bush nos dois últimos anos de mandato.

As políticas de Obama têm motivado uma censura na maior parte moderada, pois ele ainda desfruta de uma espécie de lua de mel, e não é Bush. E a mídia quase sempre lhe concede carta branca. Mas Obama está prejudicando gravemente as relações entre os Estados Unidos e a América Latina e as perspectivas de democracia e progresso social na região.

* Mark Weisbrot é co-diretor do Centro de Pesquisa Econômica e Política, de Washington e autor, com Dean Baker, de Social Security: The Phony Crisis (Seguridade Social: a Falsa Crise) e escreveu numerosos ensaios sobre política econômica. É também presidente do grupo Política Externa Justa. Este artigo foi publicado em The New York Times Online e International Herald Tribune em 11 de agosto de 2009.