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Antonio Neto: por que é possível reduzir a jornada de trabalho já

Recentemente, tivemos a oportunidade de participar de uma Comissão Geral promovida pela Câmara dos Deputados com o objetivo de discutir a Proposta de Emenda Constitucional que reduz a jornada semanal de trabalho de 44 para 40 horas. Os trabalhadores, através das Centrais Sindicais e demais entidades, demonstraram grande unidade e mobilização na defesa dessa que constitui, hoje, a principal bandeira do movimento sindical.

Por Antonio Neto*

Alguns segmentos empresariais, no entanto, continuam resistindo à proposta, utilizando, como fizeram durante a Comissão Geral, argumentos pouco ou nada consistentes, muito parecidos com os que eram apresentados à época da Constituinte de 88, quando afirmavam que as empresas e a economia nacional iriam quebrar. O tempo passou e nada disso aconteceu, muito pelo contrário.

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann, demonstrou recentemente, com dados técnicos, que, se a carga horária oficial de trabalho for reduzida das atuais 44 horas semanais para 37 horas, o país teria condições de dar ocupação para toda a população. Mas ele ressaltou que isso só seria possível caso fossem mantidos os investimentos, a produção e, também, aumentada a capacidade produtiva do País.

Segundo Pochmann, mais fácil seria alterar a distribuição do tempo de trabalho no Brasil, uma vez que o estudo registrou que o país tem uma grande parcela de trabalhadores com carga horária bastante reduzida, de um lado, e, do outro, quase a metade de seus trabalhadores com jornadas acima de 44 horas semanais. Uma melhor redistribuição dessa jornada permitiria mais pessoas ocupadas do que a simples redução da jornada oficial.

Outro estudo divulgado pelo Ipea mostra que, da promulgação da Constituição Federal, em 1988, até 2007 a carga horária média de trabalho da população brasileira apresentou tendência de queda. Segundo o Ipea, desde o final da década de 80 do século passado houve redução nas horas médias tradicionalmente trabalhadas pelo conjunto de pessoas ocupadas no Brasil.

O país como um todo registrou, no período estudado (de 1988 a 2007), diminuição em 10,7% na carga horária média semanal trabalhada pelos ocupados. Em resumo, a redução foi de 44,1 para 39,4 horas médias semanais de trabalho.

Os dados consolidados pelo Ipea revelam, porém, que é crescente o percentual de trabalhadores ocupados no Brasil que cumprem jornada acima de 44 horas, com a realização de horas extras. Esse percentual era de 30,6%, em 1988, e pulou para 43,6%, em 2007.

A jornada de trabalho média foi fortemente influenciada pelo aumento do tempo mínimo de trabalho. Mas houve também aumento da jornada extra. O Brasil não só reparte mal sua riqueza mas também seu tempo de trabalho. A nossa jornada de trabalho é mal distribuída, conclui o Ipea. Para o órgão, o fraco desempenho da economia no período elevou o grau de informalidade, o que explica a redução de 10,7% da jornada, pois as cargas horárias reduzidas são exercidas, em geral, por informais.

Outro argumento importante exposto por Pochmann é que o aumento da expectativa de vida no Brasil — que hoje é de 72,3 anos — justifica a entrada tardia no mercado de trabalho. "Não há razão técnica para alguém começar a trabalhar no país antes dos 25 anos de idade. Especialmente porque estamos para entrar na fase em que a expectativa de vida ultrapassará os cem anos."

Seu argumento para reduzir a jornada é o acúmulo de capital pelo sistema financeiro internacional, que ele chamou de "produtividade imaterial". "Essa produtividade justifica a razão pela qual não há, do ponto de vista técnico — pasmem —, motivo para alguém trabalhar mais do que quatro horas por dia durante três dias por semana."

Outro dado, dessa vez apresentado pelo Dieese, reforça a tese da redução da jornada: a produtividade cresceu 23% no Brasil entre 2002 e 2008, mas esse ganho não foi compartilhado com os trabalhadores. O Dieese calcula ainda que a redução da jornada poderia gerar cerca de 2,5 milhões de novos empregos.

Apenas essas razões, abalizadas tecnicamente, seriam suficientes para justificar a mudança constitucional. A redução da jornada para 40 horas semanais não apenas estimularia a geração de mais empregos, diferentemente do que sustentam seus opositores, como também moldaria a lei ao que ocorre atualmente no país e seria um importante instrumento para impedir ou reduzir drasticamente determinadas práticas, como a das horas extras (o Brasil é um dos países que mais adota esse expediente em todo o mundo) e do banco de horas que tanto precarizam o trabalho em nosso país.

Entidades empresariais argumentam que a redução da jornada pode ser estabelecida pelos acordos e convenções coletivas. Trata-se de um grande engodo, pois a realidade demonstra, de forma cabal, que as categorias profissionais menos organizadas e destituídas de poder de pressão jamais conseguiriam esse objetivo pela via da negociação. A Constituição e as leis do país é que devem estar a serviço, em todos os seus aspectos, principalmente, dos mais fracos e necessitados.

Por todos esses motivos, reiteramos a importância de o Congresso Nacional votar imediatamente a redução da jornada de trabalho, permitindo ao país mais um salto significativo no seu desenvolvimento econômico e social.

* Antonio Neto, presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI)