Sem categoria

Escalada golpista em Honduras ameaça embaixada do Brasil

Depois de divulgar um ultimato de 10 dias para a embaixada brasileira definir o status do presidente Manuel Zelaya, o regime golpista de Honduras disse neste domingo (27) que, caso o prazo não seja cumprido, "a embaixada vai perder sua condição diplomática". A ameaça é do secretário de Relações Exteriores do governo de fato, Carlos López Contreras, em entrevista coletiva. Ela integra uma escalada de endurecimento dos golpistas.

Por Bernardo Joffily

"Se o status de Zelaya não for definido dentro de dez dias, a embaixada vai perder sua condição diplomática", disse o chanceler do presidente fantoche Roberto Micheletti (o segundo em três meses; o primeiro foi defenestrado depois de chamar o presidente Barack Obama de "negrinho ignorante"). "O título e o privilégio do Brasil de ter uma missão em Honduras acaba em dez dias", agregou ele.

Uma ameaça explícita

Contreras ainda agregou que passado o prazo a embaixada "passa a ser um escritório privado". E prosseguiu: "Isso não quer dizer de forma alguma que, por cortesia e pela relação de civilidade que o governo possui, vá invadi-la".

A ameaça é explícita. Só a "cortesia" e "civilidade" os golpistas (a mesma que os levou a impedir que Zelaya trocasse o pijama por outros trajes, antes de ser sequestrado para a Costa Rica) impedirá uma invasão.

Outras formas de agressão já estão em uso. A missão diplomática está cercada por policiais e soldados, portanto armamento pesado. Estes impedem a livre circulação de pessoas. O próprio chefe da Polícia Nacional hondurenha admitiu que usou um "canhão de dor" que emite ultrassons contra a legação brasileira. No dia 22, uma bomba de gás atingiu a missão. E a quinta-feira (24), Zelaya denunciou o uso de gases tóxicos.

Escalada da linha dura

Neste fim de semana, os golpistas recrudesceram. O despropositado ultimato ao Brasil não foi um ato isolado.

Os golpistas também expulsaram três diplomatas da OEA (Organização dos Estados Americanos), que desembarcaram em Tegucigalpa para preparar uma possível visita do secretário-geral da organização, o chileno Miguel Insulsa. Encheram o aeroporto da capital de policiais, para prender funcionários do governo derrubado que estariam para voltar ao país. E ainda romperam na prática as relações diplomáticas do país com a Espanha, México, Argentina e Venezuela, embora recorrendo a uma argumentação tortuosa para fazer parecer o contrário. Neste domingo, reestabeleceram o toque de recolher, entre as 21 e as 5 horas.

Os sinais de preliminares de um diálogo entre as duas partes que se enfrentam, visíveis para vários observadores até o sábado, eclipsaram-se bruscamente. O regime de fato imposto pelos militares e por eles entregue a Micheletti parece ter optado por quebrar mas não ceder.

Um bispo tenta o diálogo

Como solitária iniciativa em favor de uma solução conciliatória, ainda neste domingo o bispo auxiliar da Arquidiocese de Tegucigalpa, Dom Juan José Pineda, relatou que, "por decisão pessoal", chegou a "bater em portas para que se abrisse o diálogo".

"Como ninguém quis dar o primeiro passo e ninguém quis se expor, como filho deste país e desta Igreja, quis assumir a responsabilidade de dar o primeiro passo e abrir essa porta para o diálogo", disse o bispo. Ele se reuniu com Zelaya e Micheletti, dizendo que os contatos foram "positivos", mas concluiu que, caso as partes "não se sentem à mesa", "seremos todos perdedores".

Dom Pineda tem um vínculo pessoal com o cardeal Oscar Andrés Rodríguez, que jogou um sujo papel no acobertamento político, ideolíogico e moral dos golpistas do 28 de junho. Porém não se exclui que suas gestões indiquem que o campo dos golpistas não está unido. O comportamento de quatro dos seis candidatos às eleições presidenciais marcadas para novembro (os outros dois se retiraram em protesto contra o golpe) aponta no mesmo sentido.

Resta o "presidente" Micheletti, e, por trás dele, o chefe do Exército, general Romeo Vasquez, que deu o golpe e sustenta o regime de fato. Ao menos na aparência, eles continuam a apostar na linha dura.

Teste de força nos três meses do golpe

Como se trata de um conflito, é preciso observar o lado da Resistência antigolpista. Outro sacerdote católico, o padre Andrés Tamayo, anunciou neste domingo que foi feita "uma convocação nacional para que os camponeses e outros setores se concentrem em Tegucigalpa". O objetivo é fazer uma grande demonstração de força política dos hondurenhos pró-Zelaya, nesta segunda-feira (28), quando se completam três meses do golpe.

A mobilização da Resistência tem ocorrido por ondas, embora sem cessar em um só destes 91 dias. Ela alcançou um auge no dia 4 de julho, quando Zelaya tentou retornar de avião, mas os militares bloquearam o aeroporto com blindados. Teve outro ascenso no dia em que o presidente eleito abrigou-se na embaixada brasileira. A mulher de Zelaya, Xiomara, avaliou em 100 mil os manifestantes naquele dia, logo dispersados por jados de água e bombas de gás. O protesto nos três meses do golpe será outro teste de força.

Veja também:

Candidatos hondurenhos veem diálogo no horizonte

Golpistas hondurenhos dão ultimato de 10 dias ao Brasil

Lula não tolera "ultimato de governo golpista" de Honduras