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Milhares de uruguaios vão às ruas pelo fim da 'lei da impunidade'

A campanha para revogar a Lei de Anistia chegou ao fim no Uruguai, nesta terça-feira (20), com uma marcha que lotou o centro de Montevidéu. Apenas um dia após a Suprema Corte do país declarar a inconstitucionalidade da norma que impediu o julgamento de militares e policiais acusados de violações dos direitos humanos durante a ditadura (1973-1985), cerca de trinta mil pessoas se mobilizaram, sob o lema "o último 20 com a Lei da Impunidade".

Marcha no Urugai

"Se está fechando um ciclo em que todos os poderes do Estado estão decidindo que a Lei da Caducidade é inconstitucional", disse Luis Puig, secretário de direitos humanos da central de trabalhadores PIT-CNT, uma das principais defensoras do referendo.

É que o tempo urge. No próximo domingo, ao lado das eleições presidenciais, os uruguaios terão que decidir se querem ou não revogar a lei da impunidade através de um referendo. A decisão de inconstitucionalidade do Tribunal de Justiça, publicada na mesma semana da eleição, só se aplica ao caso analisado. Mas abre a porta para todos os possíveis julgamentos, mas é um processo mais longo que ganhar a consulta.

Ontem, na marcha, a cédula cor-de-rosa, que identifica o "Sim" se fez visível ao longo de dois quilômetros no centro da cidade. O Prêmio Nobel da Paz argentino, Adolfo Perez Esquivel; neta do escritor Juan Gelman e filha de desaparecidos, Macarena Gelman; e o escritor uruguaio Eduardo Galeano, entre outros, estiveram presentes.

No entanto, para que a lei seja revogada, é necessário conquistar a metade dos votantes mais um. Segundo as últimas pesquisas, o "sim" chegava a 47% dos votos e havia quase 12% de indecisos. Por isso, ontem, a Associação Filhos do Uruguai passou à ofensiva e lançou-se para convencer os cidadãos a votarem no "sim". "Uma oportunidade única para evitar futuras violações dos direitos humanos pelo Estado", foi o título da convocatória. Os pedidos dos filhos dos desaparecidos foram contundentes.

Macarena Gelman instou a sociedade uruguaia a colocar-se no lugar das vítimas. "Si não entendemos que o que se passou, se passou a todos, ao menos teríamos que nos colocar no lugar de quem de fato vivenciou", reclamou. Em seguida, elogiou a decisão da Corte. "A decisão é um ponto de partida e um antecedente mais que importante em um momento em que todas as partes do Estado estão de acordo sobre esta questão. Mas, além da declaração de inconstitucionalidade, é fundamental a expressão do povo uruguaio em favor da anulação da lei ", disse.

Victoria Julien, outra integrante da associação, destacou a importância histórica de revogar a regra. "Cancelar esta lei tem a ver com solidariedade, é uma oportunidade para reivindicar a nossos pais e à sociedade", disse a ativista. "Seria uma grande mudança cultural no país", insistiu.

Amaral Garcia lançou finalmente seu pedido afirmando que é tempo de justiça. "Eu estou cansado de que isso tenha aconteceu há tantos anos e ainda se tenha feito justiça. Acabar com essa lei envolve a todos nós, embora alguns tenham sido vítimas da repressão mais diretamente que outros ", disse ele. "A anulação da lei permitirá que os violadores dos direitos humanos depor perante a Justiça. Eu não estou defendendo desforra ou comutação da pena, digo que têm direito a pedir desculpas ", disse o membro da associação.

Já o escritor uruguaio Eduardo Galeano afirmou que a lei da impunidade é uma "triste herança da ditadura militar, que nos condenou a pagar suas dívidas e esquecer seus crimes". Os manifestantes marcharam levando fotografias em preto e branco com os rostos dos desaparecidos, assim como bandeiras rosadas, em alusão à cor do "sim"

A Lei de Anistia foi promulgada em 1986 e ratificada por um plebiscito em 1989. A decisão do Tribunal na segunda-feira foi a primeiro na história do país a declará-la inconstitucional. Os juízes, para emitir a sua decisão, levaram em conta o caso de Nibia Sabalsagaray, militante comunista seqüestrada e torturado até a morte em 1974.

Com Página 12

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