Serra enfrenta mau tempo e só tem três opções
A política tem seu tempo mas também seu "microtempo", feito de circunstâncias mais passageiras. O governador tucano José Serra, enfrenta um microtempo dos piores com a pressão de correligionários e aliados para que decida logo se é candidato a presidente daqui a pouco de 11 meses. O que era para ser um grande gesto, hoje, poderia parecer um anticlímax. No entanto, não mais de três alternativas imediatas se abrem ao presidenciável paulista.
Por Bernardo Joffily
Publicado 04/11/2009 01:00
Examinemos cada um dos caminhos possíveis para Serra:
1. Serra mantém seu prazo: março
A primeira opção: Serra resiste à pressão e só se decide em março, conforme o cronograma que se fixou. É hoje a opção mais remota. Seu concorrente tucano, o governador Aécio Neves, não aceita.
Aécio disse que em fevereiro se lançaria a senador por Sua Minas Gerais, depois encurtou o prazo e anunciou que só espera até o fim de dezembro. "Ou Serra assume ou devolve a bola para o Aécio", argumenta Domingos Sávio, líder do governo Aécio na Assembléia Legislativa mineira.
Caso Serra mantenha a protelação e Aécio cumpra seu ultimato, seria o pior dos mundos para o governador paulista. Ficaria sendo o presidenciável por default, tomando uma 'decisão' já 'decidida' de antemão pelos fatos.
Se o único a cobrar pressa fosse Aécio, nem seria tão problemático. Mas o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), exige publicamente a definição do candidato, angustia-se com a demora e até anunciou preferência por Aécio para aumentar a pressão. E o próprio presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), disse em entrevista no domingo que "o nosso tempo é urgente".
Não se encontra um só oposicionista satisfeito com a protelação. Nenhum exceto José Serra. Este, pessoalmente, gostaria de medir melhor o passo, estudar como evoluem as pesquisas. Mas todos no seu campo, a começar pelos montadores dos palanques estaduais, cobram uma definição já.
2. Serra se lança em dezembro
Segunda opção: Serra cede à pressão e sai para presidente. É o que todos esperam que aconteça. A começar pelo presidente de honra do PSDB, Fernando Henrique Cardoso, que neste domingo publicou um alarmado artigo no Estadão – Para onde vamos? – pintando em cores tenebrosas uma possível vitória da petista Dilma Rousseff:
"Dilma ganhar as eleições sobrará um subperonismo (o lulismo) contagiando os dóceis fragmentos partidários, uma burocracia sindical aninhada no Estado e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão", vaticina FHC. E termina "dizendo que é mais do que tempo de dar um basta ao continuísmo, antes que seja tarde".
O ex-presidente se empenha em ver seu correligionário e conterrâneo como candidato presidencial, em uma "chapa dos sonhos" com Aécio na vice. Aécio não se cansa de negar. Logo se saberá se a costura fernando-henriquista terá meios para dobrá-lo. Se assim for, será um ponto para a oposição. Se não, um ponto contra.
3. Serra se lança… para a reeleição
Terceira opção: o governador refaz os cálculos, repassa as pesquisas e conclui, como em 2006, que é melhor disputar a mais amena reeleição para governador de São Paulo, e deixar para Aécio (que não tem essa opção, por já ter cumprido dois mandatos) a tarefa de enfrentar Dilma e seu cabo eleitoral número um, Luiz Inácio 'o Cara' Lula da Silva.
É a única explicação real – um segredo de Polichinelo – para a demora em decidir. Será também talvez a alternativa mais prudente do ponto de vista da carreira política pessoal de José Serra, que assim trocaria o duvidoso pelo (quase) certo. Mas seria uma quase traição do ponto de vista dos interesses coletivos da oposição conservadora.
Nesse caso, caberia a Aécio a condição de presidenciável por default. Este veria obedecido o prazo que pediu, mas teria que correr contra o tempo para conquistar os aliados e montar os palanques que promete. Pior, ver-se-ia na obrigação de explicar a cada passo que, sim, venceu a contenda com Serra e pode vencer a eleição, e, não, não foi deixado para o sacrifício na disputa com a candidata de Lula.
Desgraça pouca é bobagem
A escolha de Serra se fará em um microtempo hostil. Não há nenhum escândalo contra o governo na mídia. A CPI da Petrobras agoniza aos poucos, eclipsada pelas boas notícias do pré-sal e a polêmica positiva sobre como distribuir seus royaltes. A crise global, no Brasil, pode não ter sido uma 'marolinha' mas não chegou a muito mais que isso; mais importante, passou, e prenuncia um crescimento que segundo Lula pode bater nos 7% na hora da campanha eleitoral. O Rio venceu Chicago na contenda pela Olimpíada de 2016. Até a coragem de abrigar Miguel Zelaya na embaixada brasileira em Honduras – que Serra descreveu como "uma grande trapalhada" – revelou seus frutos ao abrir caminho para o acordo de sexta-feira passada, de ainda incerta aplicação pelo regiem golpista.
Como desgraça pouca é bobagem, a oposição enfrenta dificuldades para montar os palanques estaduais. "A indefinição da candidatura presidencial do PSDB deixou os partidos de oposição à beira de um ataque de nervos e ameaça causar divisões políticas internas com efeitos nas campanhas regionais", noticia o Estadão.
O jornal aponta " graves focos de insatisfação" em Minas, no Rio e em São Paulo. E "problemas" em pelo menos mais nove Estados: Rio Grande do Sul, Paraná, Pará, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Ceará, Amazonas e Maranhão.
O caso do Rio é emblemático. Até setembro o palanque local parecia resolvido com a candidatura do tucano do bico verde Fernando Gabeira. Mas a candidatura presidencial de Marina Silva pelo PV, somada à conquista dos Jogos de 2016 pelo Rio, derrubou esse palanque. Gabeira agora diz que pensando bem talvez concorra ao Senado; e se disputar o governo será em dobradinha com Marina e não com Serra. Sérgio Guerra desembarca nesta quarta-feira na Cidade Maravilhosa com a missão de fazer o rescaldo do desastre.
Em São Paulo os tucanos Geraldo Alckmin (melhor nas pesquisas) e Aloysio Nunes Ferreira (preferido de Serra), assim como o prefeito paulistano Gilberto Kassab, do DEM, desejam ser os indicados para concorrer ao governo. A completa catástrofe para Serra seria perder a eleição presidencial para Dilma.. e ainda ter de passar o governo paulista para seu desafeto Alckmin – hipótese que o leva a levar muito a sério a terceira alternativa.
A cobrança irritada da mídia
Há ainda a cobrança irritada, quase colérica, da mídia. Esta denuncia incompetências e covardias por parte dos oposicionistas em geral e de Serra em particular. "O Brasil tem governo demais e oposição de menos", foi a melancólica conclusão da colunista Miriam Leitão, do Globo, acompanhada no diagnóstico por vários outros articulistas.
Até o marqueteiro de Serra, Luiz González, entra no rol dos discensos oposicionistas e pode ser defenestrado. "Não ouve ninguém, não entende de Brasil. Há uma insatisfação geral no PSDB. Só o Serra gosta dele", disse um senador tucano, sob compromisso do anonimato, para o Estado de S. Paulo, que é insuspeito de simpatias por Lula mas tem sido revelador sobre as fraquezas tucano-demistas.
Um microtempo é volátil por natureza e o atual pode se desvanecer. É o que José Serra deve estar implorando aos deuses que aconteça. Do contrário, qualquer que seja a sua escolha entre as três possíveis, o anúncio da decisão dificilmente soará como um prenúncio de vitória.