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Stédile, Felício e Oded debatem concepções do FSM

Após o debate que se estabeleceu entre diferentes concepções e opiniões acerca dos rumos do Fórum Social Mundial na manhã desta segunda-feira (25/1), no debate de abertura do Seminário “10 anos depois: desafios e propostas para um outro mundo possível”, o Vermelho fez três perguntas idênticas a João Felício (CUT), João Pedro Stédile (MST) e Oded Grajew (Cives – Associação Brasileira de Empresários pela Cidadania). Confira o resultado.


- Luana Bonone

Vermelho: Uma agenda de ações mais unitárias do FSM poderiam colocar em risco a pluralidade e a diversidade que o caracterizam?

Foto: Luana Bonone
João Felício, da CUT

João Felício – Não, em absoluto. Porque eu tenho certeza absoluta que as centenas de movimentos sociais e ONGs que participam deste processo concordam em vários aspectos. Eu acho que dá para tirar o que é consenso. A luta contra o imperialismo, pela paz, a luta por democracia, a luta contra o pagamento de dívida externa, pelos direitos da mulher, pelo direitos dos povos negros, a luta contra a financeirização da riqueza, por um certo controle do setor financeiro… quer dizer, tem tanta coisa que dá para você botar no papel e atuar em função daquilo lá, cada movimento com a sua estratégia, com o seu jeito de ser. Não é você fazer uma plataforma minima onde você exclui. Você tem que estabelecer ações onde você inclui, o que eu acho que está faltando é isso. Porque todo mundo, todos os movimentos que participam aqui, desenvolvem suas ações. Mas não seria melhor se todos fizessem no mesmo período ações unitárias em função do deste outro mundo possível? Aquela marcha que nós fizemos em 2003 contra a guerra do Iraque não foi espetacular, bonita? E que todo mundo atuou em função daquilo lá… Então tem tanta coisa, meio-ambiente, concepção de desenvolvimento… eu acho que dá. Com um pouco de boa vontade dá para conceber uma ação unitária.

João Pedro Stédile – De jeito nenhum. A fortaleza do Fórum é justamente que, nessa diversidade, nós ainda podemos encontrar algum ponto consensual, como o Felício da CUT disse, que seja o mínimo que nós podemos fazer juntos. Eu acho que a assembleia que nós vamos fazer sexta nós vamos construir uma agenda comum, pelo menos um calendário que nos leve a ter alguma agenda comum. Isso nós vamos fazer pelo menos aqui no Brasil.

Oded Grajew – Não, não, são complementares. É melhor que as unitárias se juntem a outras, porque assim tem mais chance de ter sucesso, mas elas são complementares. O FSM não deve organizar, mas estimular. A marcha de 2003, por exemplo, foi uma das ações mais bem sucedidas que o Fórum estimulou. Estimular ações como esta certamente pode ser um caminho.

Vermelho: Ainda sobre concepção: o FSM tem que servir para o empoderamento do povo ou não é esse o papel dele? De que forma ele contribui na disputa de ideias na sociedade?

João Felício – Eu diria que esse não é o papel dele. O papel do FSM é atuar em função de mudanças sociais, mas você não pode estabelecer um programa mínimo que exclua. Você tem que apontar caminhos em que você diminua a injustiça social, onde você distribua renda, a sociedade que a gente quer é a que consiga fazer isso. Mas sem propor algo pronto e acabado, senão você pode excluir, você pode ter alguém ou algum movimento social que diga “nesta concepção eu não caibo”. Eu acho que é você elencar um conjunto de questões… um exemplo é a garantia de direitos das mulheres, de autodeterminação: é unitário. Agora, se você coloca a questão do aborto, aí pode ser que tenha divergência, então vamos colocar o que é consenso.

Oded Grajew – O FSM serve para empoderar a população, as pessoas, e para dar força

Foto: Luana Bonone
Oded Grajew, da Associação Brasileira de Empresários pela Cidadania (Cives)

política para levar adiante suas ideias, suas propostas. Nós somos aquilo que fazemos, aquilo que pensamos. Então é fazer aquilo que você quer fazer.

Vermelho: O que, na sua opinião, seria uma mudança de método importante no FSM?

João Felício – Eu acho que o Conselho Internacional do FSM poderia estabalecer alguns assuntos, alguns temas sobre os quais todos debateriam. Cada movimento social tem a sua agenda, seu método, suas ações, o seu conteúdo. Mas seria bom que o CI do FSM, à luz da conjuntura daquele momento, analisar quais são os temas centrais, que exigem uma tomada de posição. Por exemplo, não seria interessante que nós tivéssemos tido a oportunidade de, em Belém, tirarmos uma ação contundente em função da crise econômica? Então eu acho que nós perdemos a oportunidade. Porque o FSM está muito fragmentado, muito disperso. Por exemplo, eu concordo com aquilo que o Olívio Dutra falou: buscar a centralidade sem centralismo. Porque não dá para você perder a oportunidade quando você coloca 100 mil pessoas num mesmo espaço, num mesmo ambiente, para debater o futuro da Terra, da humanidade, e você não aproveitar isso para debater assuntos que tem a ver com essas 100 mil pessoas, que certamente representam milhões e milhões e milhões. Independente de qualquer coisa, nós vamos continuar acreditando no Fórum. Eu não conheço, na história, um espaço que se tenha criado que tivesse tanta gente, tanta democracia, tanta diversidade, tanta participação política. Eu acho que nós estmoas no caminho certo. Não conheço outro espaço que tenha sido construído na história que tenha sido tão expressivo quanto o FSM.

João Pedro Stédile – eu acho que o Fórum tem que continuar sendo como ele é. Que

Foto: Luana Bonone
João Pedro Stédile (MST)

aqui dentro todas as tribos, como dizem os jovens, tenham espaço para se articular… se a juventude quer fazer suas articulações, que faça, os movimentos sindicais, da via campesina. Evidentemente que o evento aqui da grande Porto Alegre ainda não é o Fórum Mundial… aqui nós estamos os brasileiros e mais os nossos vizinhos. Aqui foi um seminário planejado para fazer reflexão política e teórica. Mas o Fórum Mundial, como ele é concebido, os grandes eventos mundiais e os eventos continentais, aí sim eu acho que tem que ter ???, e que as redes continuem se organizando e debatendo. As redes, enquanto redes, precisam dar um passo à frente, precisam ter formas de levar o movimento às ruas. Pois o que muda o resultado do jogo não é o vestiário, é o campo.

Oded Grajew – Esse seminário é exatamente para refletir tudo isso. Eu acho que devemos reforçar o processo, fazer com que a articulação entre as entidades possa realmente acontecer, talvez ser mais enfático nessas convergências e estabelecer metas e processos, por exemplo na ação junto a governos, no debate de desenvolvimento sustentável. Eu acho que é reforçar o FSM dentro de um eixo político.

De Porto Alegre, Luana Bonone