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Comitiva brasileira visita Haiti e planeja ações de solidariedade

Uma comitiva brasileira visitou o Haiti no dia 3 de fevereiro e participou de diversas agendas no sentido de prestar solidariedade e planejar ações efetivas de ajuda ao país, assolado por um terremoto de magnitude 7, em 12 de janeiro e outros dois, de menor escala, subsequentes. Compuseram a comitiva: um brigadeiro, um embaixador, cinco deputados federais e um diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE).


- Arquivo UNE

A comitiva foi formada pelo brigadeiro Araújo, da Aeronáutica, pelo embaixador Sérgio Danese, do Itamaraty, pelos deputados federais Raul Jungmann (PPS/PE), Janete Pietá (PT/SP), Emiliano José (PT/BA), Couber Martins (PMDB/BA), e Cláudio Cajado (DEM/BA), e pelo diretor de Relações Internacionais da UNE Daniel Iliescu. Seu objetivo foi averiguar a situação do Haiti após a tragédia e o trabalho das Forças Armadas brasileiras na liderança da missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU), assim como no apoio aos esforços de reconstrução do país.

De acordo com o deputado Raul Jungmann, “a Constituição brasileira determina uma co-responsabilidade entre Executivo e Legislativo para o envio de tropas e recursos para fora do Brasil. A iniciativa é do Executivo, mas a decisão final cabe ao Legislativo”.

O embarque foi às 3h da manhã do dia 3 de fevereiro, da Base Aérea Militar, em Brasília (DF). Após uma parada em Boa Vista (RR), para abastecimento, o avião da Força Aérea Brasileira (FAB) pousou em solo haitiano às 7h, pelo horário de Porto Príncipe (10h de Brasília).

Foto: Arquivo UNE
Homem segue em direção à imensa fila, ao fundo da foto

Do aeroporto, a missão dirigiu-se ao Batalhão Brasileiro (Brabatt), onde foi recebida pelo embaixador do Brasil no Haiti, Igor Kipman, pelo Coronel Bernardes, Comandante do Brabatt naquela data, e pelo Coronel Ajax Porto Pinheiro, Comandante do Brabatt a partir deste mês de fevereiro, segundo o rodízio de seis meses implementado pela missão brasileira.

A visão imediata com que a comitiva se deparou foram as enormes filas à espera de comida e água, as grandes aglomerações de haitianos entorno das embaixadas e nas ruas, e pessoas caminhando longas distâncias com cestas ou baldes de água na cabeça.

Foto: Arquivo UNE
Cidadão haitiano veste camisa da seleção brasileira

Brasil, país amigo

Por outro lado, outra percepção imbuiu de certo orgulho os participantes da missão: a de como o Brasil é bem visto pelos haitianos. Vários cidadãos trajavam camisas da seleção brasileira e a referência aos soldados era de pessoas que dedicam suas vidas a ajudar as vidas de um povo muito semelhante ao brasileiro.

Os parlamentares e o diretor da UNE acompanharam palestras sobre a ação do Brasil no país desde 2004 e sobre a situação do Haiti após o terremoto de 12 de janeiro, bem como as operações da Engenharia militar e dos Hospitais de Campanha no atendimento à população.
Logo após, a missão foi à instalação provisória do Legislativo haitiano, aonde encontrou-se com deputados, dentre os quais, o presidente do Congresso, Lucian Coeur.

Foto: Arquivo UNE
A comitiva se reuniu com o presidente do Congresso haitiano, Lucian Coeur (ao lado esquerdo, segundo de baixo para cima)

A proposta apresentada pela UNE aos parlamentares haitianos foi a de enviar, a médio prazo, estudantes concluintes dos cursos de Medicina, Enfermagem, Engenharia, Arquitetura, Agronomia, entre outros, para passar períodos de três ou seis meses para trabalhar na reconstrução do país e intercambiar conhecimento com os estudantes haitianos. Várias escolas e universidades do país foram destruídas.

Encontro com o presidente

A próxima agenda foi o encontro com o presidente do Haiti René Préval, que recebeu a comitiva também em sua sede provisória, em uma delegacia de Polícia. O presidente abriu o encontro falando sobre a situação do povo haitiano pós-terremoto e as condições que o Estado Haitiano tem de coordenar o atendimento emergencial à população e de reconstruir o país. Agradeceu o esforço do Brasil na ajuda humanitária e a cooperação da missão de paz da ONU (Minustah).

Em referência à fala da comitiva brasileira de que nossa ajuda estava submetida à coordenação e à soberania do Estado haitiano, Préval respondeu: “Não acho que os Estados Unidos (EUA) tenham o propósito de ocupar o Haiti e não percebo no Brasil nenhuma ambição imperialista”.

Foto: Arquivo UNE
Daniel Iliescu (UNE) com o presdiente do Haiti, René Préval

René Préval apresentou e pediu apoio brasileiro a três bandeiras importantes para a reconstrução do Haiti que devem ser abraçadas pela comunidade internacional das Nações Unidas: perdão da dívida externa haitiana; não-taxação pelas nações de qualquer produto haitiano durante um período de 20 anos; criação de um fundo único de ajuda ao Haiti sob gerência do Estado haitiano.

Ao propor a não-taxação dos produtos haitianos, o presidente Préval citou a fala do ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, no Fórum de Davos. Já a proposta do fundo único foi inspirada em fala do presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick.

A UNE apresentou sua proposta também ao presidente do Haiti. O Presidente Préval, na fala de encerramento do encontro, valorizou o oferecimento dos estudantes brasileiros: “Recebo com muita satisfação a proposta do representante da UNE. Vamos junto ao Embaixador Igor pensar formas de desenvolver este projeto.

Foto: Arquivo UNE Foto: Arquivo UNE
Foto: Arquivo UNE
Coronel Ajax Porto Pinheiro com Daniel Iliescu (UNE) Haitiana com blusa do Projeto Viva Rio, ONG brasileira Daniel Iliescu (UNE) com estudante haitiano, que disputa vaga em programa para estudar no Brasil

Minustah

Foto: Arquivo UNE
Após o terromoto, o único comércio existente no Haiti é o de rua

De volta ao Brabatt, a comitiva brasileira reuniu-se com o chefe da Minustah, o guatemalteco Edmond Mullet. O ex-chefe da Minustah, o tunísio Hedi Annabi, morreu no terremoto, assim seu adjunto brasileiro, Luiz Carlos da Costa. O guatemalteco era o chefe da missão de paz antes de Hedi Annabi, e reassumiu imediatamente após o terremoto. Neste rápido encontro, Mullet expôs a fundo questões da sociedade haitiana, além de dados históricos sobre o país, citando os golpes de Estado, as ocupações e ditaduras a que o povo já esteve submetido.

Antiga colônia francesa, o país é a primeira república negra do mundo, sendo fundada em 1804 por antigos escravos. Marcada por uma série de governos ditatoriais e golpes de estado, a população haitiana presenciava uma guerra civil e muitos problemas socioeconômicos até o terremoto. O Haiti já era, antes da tragédia, o país economicamente mais pobre da América, seu Índice de Desenvolvimento Humano estava em 0,532; aproximadamente 60% da população era subnutrida e mais da metade vivia com menos de 1 dólar por dia. Estes eram os dados que davam o retrato do país mesmo antes dos terremotos.

Ainda segundo Mullet, 86% de quem forma-se no ensino superior sai do país. Os destinos mais comuns são EUA, Canadá, França e República Dominicana. Além disso, o Haiti perdeu milhares de quadros técnicos, teóricos, políticos etc.

Crescimento demográfico e violência contra a mulher

5,2 filhos por mulher é a altíssima taxa de natalidade haitiana. Conversando com uma brasileira residente no Haiti, a comitiva ouve o relato de uma dramática realidade, que revela um dos motivos: “São os únicos nove meses em que a mulher não apanha”.

Foto: Arquivo UNE
Os acampamentos se espalham por toda a capital de Porto Príncipe

Em visita ao Centro da Cidade, ao Bel Air (bairro mais afetado pelo terremoto), à Petit Village, os brasileiros observaram os efeitos destruidores da tragédia. Dos 15 ministérios do país, 13 foram completamente destruídos. O Palácio do Governo, tido como a mais bela construção do país, o Palácio da Justiça, o Hotel Montana, principal hotel do país, e uma infinidade de prédios públicos, residências, estabelecimentos comerciais foram reduzidos a pó, pedra e ferragens.
Em Bel Air, Daniel Iliescu e os parlamentares visitaram a sede da ONG Viva Rio, maior ação civil brasileira no Haiti. Projetos como aulas de capoeira e futebol, além de distribuição de alimentos e água são as principais ações da Vivo Rio por lá. A UNE tratou com a ONG sobre a realização de campanhas e ações conjuntas de doações e voluntariado. Por fim, uma visita breve à embaixada brasileira, também em instalação provisória.

Estima-se que o Haiti tenha entre 9 e 10 milhões de habitantes, sendo cerca de 4 milhões na capital, Porto Príncipe. E tratam-se apenas de estimativas mesmo, pois não há registro civil no país, devido à fragilidade da institucionalidade do Estado haitiano.

Foto: Arquivo UNE
Haitianos carregam baldes, andam longas distâncias e enfrentam filas gigantescas em busca de água e mantimentos

Calcula-se que até um milhão de pessoas estejam desabrigadas, 600 mil feridos e quase 200 mil mortos, dentre os quais 18 militares brasileiros, o chefe adjunto da Minustah Luiz Carlos Costa e a ativista Zilda Arns, irmã do arcebispo Dom Evaristo Arns.

Os deputados brasileiros que voltaram do Haiti na quinta-feira (4/2) defenderam a realização de uma comissão geral da Câmara para discutir a reconstrução do país caribenho. A intenção é debater o tema com os ministros da Defesa, Nelson Jobim; e das Relações Exteriores, Celso Amorim, entre outras autoridades, em busca de ações duradouras que permitam ao Haiti reerguer-se como nação.

De São Paulo, Luana Bonone, com informações da UNE, do Brasil Escola e da Agência Câmara

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