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CTB defende projeto soberano para exploração do pré-sal

O pré-sal pode se constituir no passaporte para que o Brasil se torne uma nação desenvolvida, dono de uma economia pujante e de um cenário social mais justo. Essa análise já virou praticamente um ponto comum em diversas esferas da sociedade. A falta de consenso se dá no modo como será feita a exploração de toda essa riqueza.

A CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) tem sua opinião formada e bem fundamentada nessa discussão. Divanilton Pereira, dirigente da entidade e da Federação Única dos Petroleiros (FUP), entende que qualquer modelo exploratório do pré-sal deve garantir, prioritariamente, a soberania do Brasil, tanto no aspecto político quanto energético.

“Mesmo reconhecendo que o pré-sal fortalecerá nossa soberania energética e será fundamental para a constituição de um novo projeto nacional de desenvolvimento, isso não significa que essa descoberta nos levará automaticamente à redenção social nacional”, afirmou Divanilton, em entrevista a Fernando Damasceno, do Portal CTB.

Atualmente tramitam no Congresso quatro projetos de lei elaborados pelo governo federal sobre a regulação da produção do petróleo da camada do pré-sal. Os PL 5.938 e 5.941/2009 instituem o regime de partilha dessa riqueza, substituindo o sistema de concessões estabelecido na lei 9.478/97, de cunho neoliberal e elaborado durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso.

Divanilton entende que a proposta do governo Lula é um avanço em relação à lei estabelecida por FHC, mas não é o bastante, por “ser limitada e ter algumas contradições”.

Leia abaixo a entrevista:

Portal CTB – Qual seria o melhor modelo para a exploração do pré-sal?
Divanilton Pereira – Estamos em uma disputa pela escolha da legislação para esse modelo. O que está em curso, elaborado no período FHC, não garante a soberania nacional. A CTB e o movimento de trabalhadores apresentaram no Congresso, junto com os movimentos sociais, um projeto de lei alternativo — tanto ao neoliberalismo quanto em relação à nova proposta apresentada pelo governo. Nosso projeto garante a soberania. Apresentamos essa proposta a partir de debates diversos, numa grande aliança política, e nossa avaliação é a de que o governo tem um projeto importante, com avanços em relação a FHC, mas limitado e com algumas contradições.

Portal CTB – Esse projeto de lei estabelece a Petrobras como a única empresa a realizar a extração do pré-sal?
DP – Sim, isso é fundamental, não apenas no que diz respeito a operar, mas também no que se refere ao impacto do controle das reservas. Uma empresa não republicana, mercadológica, vai explorá-lo de qualquer jeito, diminuindo a vida útil dessa reserva, como aconteceu na Argentina. A Petrobras dá essa garantia e também mostra que o Brasil não pode produzir apenas o óleo bruto, sem uma cadeia produtiva que seja capaz de dotar material humano e alavancar nossa indústria, de modo a agregar valor ao petróleo bruto.

Portal CTB – E quais devem ser as prioridades da União a respeito dos recursos obtidos com o pré-sal?
DP – O pré-sal é a grande oportunidade para financiar um projeto nacional de desenvolvimento para o Brasil. Dessa maneira, o petróleo deve estar integrado e subordinado aos interesses maiores da nação, para evitar que o destino dado às nossas riquezas se repita. Não podemos aceitar que o petróleo beneficie apenas uma minoria, como já aconteceu com a mineração, o pau-brasil, a cana-de-açúcar e o café. Para isso, é importante a criação de um fundo social, para desenvolver de forma articulada a educação, a ciência e tecnologia e as alternativas renováveis para o desenvolvimento do país.

Portal CTB – Esse fundo social pode ser comprometido de alguma forma por essa polêmica em torno da partilha dos royalties?
DP – Os trabalhadores defendem que os recursos do pré-sal devem ser usufruídos por todos os brasileiros, de todas as regiões — embora seja justo que os estados produtores tenham algum diferencial nessa partilha, mas sem a exorbitância de hoje. A preocupação da CTB e do movimento sindical está no rumo que essas discussões estão tomando, pois toda mediação que vem sendo feita nesse sentido recai sobre a União, de modo a esvaziar o fundo social que garantirá ao país a implementação de projeto nacional de desenvolvimento.

Portal CTB – E de que maneira esses projetos e suas emendam vêm tramitando em Brasília? Entidades como a CTB vêm interagindo com os parlamentares sobre o assunto?
DP – Neste momento, há quatro projetos tramitando em sete comissões na Câmara e no Senado. Essa tramitação está sob a chamada “urgência urgentíssima”. Com a emenda feita pelo Ibsen Pinheiro, cerca de 80 novas emendas foram apresentadas. Nesse cenário, nós entendemos que tem faltado uma mediação maior por parte do governo, pois da forma como está, essa discussão não será definida antes das eleições — e talvez nem mesmo em 2010, algo que não vemos como interessante, ao contrário da oposição, que não quer mudar nada.

Diante disso, a CTB, a FUP e outras entidades ligadas aos movimentos sociais têm trabalhado em Brasília no sentido de sustentar as emendas que garantam a soberania do Brasil. Também temos trabalhado, com a devida assessoria jurídica, sobre outras emendas, como por exemplo, a que garante ao Nordeste os recursos necessários para seu desenvolvimento. Temos dialogado e apresentado nosso ponto de vista em diversos fóruns, como nas comissões no Congresso e nas audiências públicas, tentando evitar que o debate se restrinja simplesmente à partilha dos royalties.

Portal CTB – Passada a fase mais aguda da crise econômica, ela ensinou algo que pode ser aproveitado para o planejamento da extração do pré-sal?
DP – Talvez seja cedo para tratar disso, pois são fatos que ainda estão em desenvolvimento. O Brasil vinha num crescimento superior a 5% em 2008 e no ano seguinte, por conta da crise, viu esse índice cair para um nível negativo. Felizmente o impacto aqui não foi tão grande porque estávamos mais protegidos. Qual foi o diferencial? O Brasil reencontrou o papel impulsionador do Estado. O governo Lula garantiu, por meio dos bancos públicos, o financiamento necessário para estimular a economia.

Portal CTB – Em nível internacional, como o Brasil poderá emergir com o advento do pré-sal?
DP – Há um dado bastante interessante nisso: tudo que a Petrobras descobriu até hoje, em 50 anos de trabalho, equivalem a 14 bilhões de barris. Um terço do campo de Tupi, onde se encontra o pré-sal, equivalem a esses 50 anos. O Brasil, assim, se apresentará ao mundo em outro patamar. Nossa autonomia nesse processo dependerá de como for elaborada sua regulamentação.

Portal CTB – Ainda nesse campo internacional, é um exagero dizer que o Brasil passará a ser um país visado por nações imperialistas?
DP – É ingenuidade achar que há uma paz mundial em curso. Não é mera coincidência a reimplantação da IV Frota marítima dos Estados Unidos, exatamente no momento em que o Brasil descobre tamanha riqueza. A camada do pré-sal está quase nos limites de nossa fronteira marítima. Diante desse cenário, temos que ter esse controle e financiar nossas Forças Armadas, para dar a segurança necessária ao desenvolvimento de todo esse processo

Portal CTB – Sob FHC ou qualquer outro governo com o mesmo viés neoliberal seria possível a descoberta do pré-sal?
DP – Felizmente a tradição nacionalista do povo brasileiro impediu a privatização da Petrobras. Como Fernando Henrique não teve condição de atacar a empresa frontalmente, seu governo tentou desmobilizá-la e enfraquecê-la de todas as formas. Talvez seja possível dizer que alguma multinacional tivesse descoberto essa riqueza em algum momento, mas certamente o uso que seria feito dela teria outra natureza.