O drama que rola na Grécia ainda está muito longe do fim
A crise que sacode a Grécia, causada pela crescente dívida externa, ainda promete render muito, na opinião do economista norte-americano Paul Krugman, que publicou um artigo sobre o tema reproduzido nesta quinta (6) pelo jornal “O Estado de São Paulo”.
Publicado 06/05/2010 15:00
Articulista do New York Times, Krugman acha que pelo andar da carruagem “é bastante provável que a crise grega e doméstica entre numa espiral e o país seja forçado a adotar medidas de emergência”, o que lembra a Argentina em 2001.
A saída que o país sul-americano encontrou para a crise foi a moratória, alternativa corajosa, oposta às receitas neoliberais, que resultou numa guerra entre o governo de Nestor Kirchner e a oligarquia financeira internacional, mas reconduziu a Argentina ao caminho da prosperidade.
O acordo que o FMI e a cúpula da União Europeia querem impor aos gregos tem o sentido de evitar a suspensão do pagamento da dívida, mas custará caro à nação helênica, pois vedará o caminho do desenvolvimento e cobrará anos, senão décadas, de depressão e estagnação da economia, além de desmantelar o chamado Estado de Bem Estar Social.
Leia abaixo o artigo de Paul Krugman intitulado Calote, desvalorização ou o quê?
“Alguma coisa mais a se dizer no caso da Grécia? Na verdade acho que sim.
“Observadores como Charles Wyplosz, para quem o ajuste que está sendo exigido da Grécia é excepcional e difícil de ser cumprido, estão certos. Mas um aspecto do problema que não tem sido destacado de modo suficiente é que a reestruturação da dívida, ou mesmo uma interrupção completa do seu serviço, não ajudaria em nada para aliviar o ônus.
“Pense no que a Grécia obterá se deixar simplesmente de pagar os juros ou o principal da sua dívida. Tudo o que teria de fazer seria, então, administrar um déficit primário zero – arrecadando impostos enquanto gasta em outras coisas que não os juros da dívida. Mas eis a questão: a Grécia contabiliza atualmente um déficit primário enorme, de 8,5% do PIB em 2009. Assim, mesmo um calote total da dívida não salvará o país da necessidade de uma austeridade fiscal feroz.
“Podemos deduzir, assim, que uma reestruturação de dívida não ajudaria muito – a menos que você acredite que o perdão de uma grande parte da dívida existente possibilitaria ao país contrair uma nova, substancial, o que não parece provável.
“O problema é que a única maneira de aliviar seriamente as dificuldades do país é encontrar um meio que possa limitar os custos da austeridade fiscal para a economia. E uma reestruturação de dívida não seria a solução.
“Uma desvalorização poderia ajudar, se houvesse essa possibilidade. Vejo que a Vox republicou o clássico documento assinado por Barry Eichengreen sobre por que não é possível. Já escrevi que o argumento, que considerei extremamente convincente ao ser apresentado pela primeira vez, hoje, não me parece tão irrefutável.
“Tentarei ser mais específico.
“Da maneira como as coisas vêm ocorrendo, é bastante provável que a crise grega e doméstica entre numa espiral e o país seja forçado a adotar medidas de emergência. O que me lembra a Argentina em 2001. Na época, os argentinos tinham tinha uma lei de conversibilidade, que em princípio manteria o peso atrelado permanentemente ao dólar – e se supunha irreversível pelas mesmas razões que o euro hoje é considerado irreversível. Ou seja, revogar a lei exigiria uma extensa discussão legislativa que iria provocar corridas destrutivas aos bancos, portanto não havia nenhuma maneira de anular a taxa cambial fixa.
“Mas, no final de 2001, a Argentina estava em total desordem, com muitas medidas de emergência implementadas para tentar conter a situação. Entre elas o corralito, que estabeleceu severas restrições às retiradas bancárias de modo a impedir uma corrida aos bancos – e uma consequência inesperada de tudo isso foi que o argumento usado da corrida aos bancos contra um fim da conversibilidade começou a ser questionado.
“É realmente impossível ver algo similar ocorrendo na Grécia?
“Em caso positivo, não poderia a adesão de outros países à eurozona ser questionada?
“O drama está longe de acabar.”