Sem categoria

Washington quer que o mundo a tire da crise

Na cerimônia de graduação de cadetes da academia militar de West Point, no dia 22 de maio, o presidente estadunidense deu a conhecer as características da nova ordem mundial que seu país buscará impor.

Por Camila Carduz*

Na realidade não é algo muito novo, trata-se bem mais de recuperar o papel hegemônico que os estadunidenses têm perdido nos últimos anos, o que deve ser um alerta para todos os que, de forma paralela, têm afiançado sua independência, sua liberdade e sua democracia, se desenvolvendo política, econômica, cultural e socialmente.

Em uma definição sintética, é possível dizer que Barack Obama expôs um plano para o qual o resto do mundo deve contribuir, porque, segundo colocou, "o ônus deste século não pode recair só em nossos soldados, não pode recair só sobre os ombros dos estadunidenses".

Cada país tem seu próprio ônus e a obrigação de assumi-lo, mas este cria outros adicionais, declara guerras, invade territórios alheios, intervém em assuntos internos de outras nações e busca apoderar-se de riquezas que não lhe pertencem. Não pode pretender que outros paguem o ônus.

Estes anúncios do propósito de reconstruir o poderio dos Estados Unidos não são mais um discurso, são parte de um projeto elaborado pelo estamento militar, ao qual estão sujeitos os governos desse país.

Se forem comparados os ditos de Obama durante sua campanha eleitoral com os atuais e inclusive com suas intervenções nos primeiros meses como presidente, serão vistas claras diferenças.

E isto não é novo, há várias décadas que o Pentágono é quem fixa o rumo.

Fundar o "poder americano"

Após as propostas de rigor nestes casos, Obama assinalou em West Point que a novidade deveria ser "a fundação do poder americano", porque nenhuma nação cuja vitalidade econômica está diminuída mantém a supremacia militar e política. Junto a isso disse que seu país deve "renovar compromissos" para apoiar, por exemplo, a agricultura afegã ou aos africanos para que produzam seus alimentos.

Mas, expôs também, os Estados Unidos precisam que suas agências de inteligência trabalhem com suas contrapartes de outros lugares para desbaratar os complôs que vão desde as montanhas do Paquistão às ruas das cidades estadunidenses, por isso é necessário reforçar as leis que fortaleçam os sistemas judiciais em outras nações para que assim o país do norte esteja protegido.

Como estas e outras necessidades não podem ser enfrentadas por eles somente, precisam de alianças como as da Segunda Guerra Mundial ou da Guerra Fria.

Assim, chega a propor que os Estados Unidos busquem uma ordem mundial que resolva os desafios atuais, que são controlar o extremismo e a insurgência, frear o acesso a armas nucleares, combater a mudança climática, sustentar o crescimento global, ajudar os países a se auto-alimentar, cuidar de sua saúde e prevenir conflitos.

Pareceria inquestionável, se não fosse o fago de que a origem da maioria destes problemas que agora afetam também aos Estados Unidos está nas políticas desenvolvidas por eles mesmos e o que em definitivo quer Washington é que o resto do mundo a tire da crise.

Por isso o discurso de Obama buscou deixar a impressão de que seu país se propunha ir em auxilio dos demais e, por isso mesmo, tinha que encabeçar a nova ordem mundial. O que não explicou é porque se precisaria uma terceira guerra mundial para respaldar a guerra estadunidense pelo petróleo.

Neste discurso, mais para a exportação que para os cadetes, houve muitas menções aos amigos e aos aliados e promessas de serem a voz dos silenciados, de abrirem espaços à discussão das idéias perseguidas e de respaldarem a democracia onde quer que tenha sido fragilizada, como se a história recente e os fatos atuais se apagassem com palavras.

Este discurso é considerado uma antecipação de um documento que o governo de Obama deve apresentar ao Congresso nos próximos dias informando de sua estratégia de segurança nacional, o que se requer de todos os presidentes.

Pequenos detalhes

Enquanto Obama buscava justificar as guerras, o panorama internacional mostrava outra realidade.

Revelou-se que enquanto o Departamento de Estado busca aumentar as sanções contra o Irã, sob o pretexto de que esse país tenta fabricar armas nucleares, as forças especiais estadunidenses já foram autorizadas para efetuarem missões de espionagem nesse país, de modo a criarem as condições que permitam dar um golpe militar nessa nação. Esses comandos ingressarão no território iraniano para estabelecerem possíveis alvos nucleares e fazerem contatos com dissidentes.

A notícia é do jornal inglês The Times, que assinala que a ordem foi dada pelo general Petreaus, que é o chefe das operações dos Estados Unidos nessa região. Uma informação similar foi publicada no The New York Times.

No contexto do discurso de Obama em West Point, isso estaria justificado.

No Panamá têm reaparecido militares estadunidenses de uniforme pela primeira vez desde que Washington teve que retirar suas bases em cumprimento dos Tratados do Canal Torrijos-Carter.

Estão-se instalando 11 bases em diferentes pontos desse país, apresentadas como reabilitação de construções arruinadas para reservar esses lugares ao combate ao narcotráfico.

Os trabalhos são financiados com cinco milhões de dólares entregues pelos Estados Unidos no marco do Plano Mérida.

Enquanto isso, o Pentágono conclui os preparativos de seu primeiro comando cibernético, que como qualquer outro responderá e executará ataques e missões secretas e adotará medidas preventivas quando o Presidente assim o decidir, e, óbvio, também realizará ações ofensivas.

O general Keith Alexander é o designado para encabeçar este Comando.

No Texas, houve uma mudança nos currículos das escolas que estabelece, entre outras coisas, que o imperialismo estadunidense não existe.

Fala-se no guia de estudos do expansionismo e os imperialistas são os outros países que fazem o mesmo.

Em geral, as mudanças representam a reivindicação de um conservadorismo retrógrado de características similares ao racismo que se está expressando em legislações como a do Arizona com respeito aos emigrantes.

Nada disto favorece a imagem que quis projetar Obama em West Point e também não responde às expectativas que criou durante sua campanha eleitoral.

Pior ainda, no plano interno seu gerenciamento governamental tem provocado reações que favorecem os setores ultraconservadores.

O pior é que a crise econômica européia tende a revitalizar a economia estadunidense, o que contribuiria a que esse país recuperasse a hegemonia perdida.

(*) A autora é jornalista chilena radicada no México e colaboradora da Prensa Latina