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Economia e futebol vivem de chutes

Copa do Mundo é muito bom, mas tem umas coisas ruins. Quem gosta de futebol – e vou logo avisando que é o meu caso – tem a chance de acompanhar, num período concentrado, três vezes ao dia, o estágio em que se encontram os carinhos e os maltratos dedicados à bola – desta vez uma dama manhosa e arisca –, nos quatro cantos do mundo. É um programão.

Mas, para isso, a gente tem de pagar uns pedágios. Por exemplo, aguentar manifestações idiotizadas de torcidas “nacionais”, quando as equipes de TV, nos bares e praças da vida, entram ao vivo (ou nem tanto), desta vez com um infernal zumbido de cornetas ao fundo.

É ridículo, mas há outras coisas ridículas, com gancho na bela e empolgante festa do futebol. É o caso das análises “sociológicas” que tentam explicar o fanatismo de torcedores por sua seleção – a “pátria de chuteiras”, com 200 milhões em ação. Ou as análises “políticas” e “econômicas” do fenômeno global que, de quatro em quatro anos, invade o cotidiano dos terráqueos.

No campo da economia, que é o meu, mais do que irritantes ou aborrecidas, o que não deixam de ser, vicejam hilariantes projeções “econométricas” sobre o resultado da Copa. Grandes bancos de investimento globais, aparelhados com equipes AAA de profissionais formados nas melhores escolas de economia, se prestam ao papel e não há indicação de que se trata de brincadeira. O Goldman Sachs aposta no Brasil, o JP Morgan na Inglaterra. Querem besteirol maior?

Mais do que reforçar a arrogância descabida neles geralmente reconhecida, os autores dessas “análises” mostram o quanto economistas podem ser, de fato, politicamente ingênuos. Nem tanto pelo altíssimo risco que assumem, ao divulgar previsões que, rapidamente, poderão ser contestadas pela realidade. Mas, antes de tudo, pela auto-denúncia da fragilidade de seus métodos preditivos, naquilo em que são elaborados e usados a sério: formulação de políticas públicas e decisões privadas de investimento.

Pensando bem, os economistas que usam o melhor de seus métodos de previsão para pagar o mico de indicar, por antecipação, um campeão do mundo que logo pode ser outro, prestam um serviço relevante. Deixam claro que eles e os jogadores de futebol têm tudo a ver: uns e outros vivem de chutes.

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Tratar de temas econômicos em época de Copa do Mundo é dureza. Ninguém quer, vamos falar em português claro, saber muito dessas coisas importantes, mas difíceis e chatas, enquanto a bola rola. Mesmo que role meio quadrada, como já está rolando e – tomara que não –, parece nos prometer o nosso Dunga.

Vou abrir, a partir deste post, uma Tribuna Livre da Seleção. A proposta é debater o futebol que está sendo jogado na África do Sul e, obviamente, em especial o da seleção brasileira. Espero que seja uma conversa de botequim, mas com a classe dos craques – que, aliás, pelo que já estamos na vendo na África, andam escassos.

Fonte: blog de José Paulo Kupfer