Paul Krugman: Por que a deflação é ruim?
Alguns leitores me pediram para explicar por que a deflação é ruim; na verdade, apesar de já ter feito alusões a este assunto várias vezes, não sei se cheguei a explicar a questão toda. Vamos lá.
Paul Krugman*
Publicado 04/08/2010 19:44
Há três motivos diferentes para se preocupar com a deflação, dois deles do ponto de vista da demanda e um do ponto de vista da oferta.
Em primeiro lugar: quando as pessoas esperam uma queda nos preços, elas se tornam menos dispostas a gastar e, principalmente, menos dispostas a solicitar empréstimos. Afinal, quando os preços estão em queda, permanecer simplesmente sentado sobre o dinheiro torna-se um investimento de rendimento real positivo – os depósitos nos bancos japoneses são um excelente negócio quando comparados a seus equivalentes nos Estados Unidos – e quem quer que esteja pensando em solicitar empréstimos, mesmo que sejam para um investimento produtivo, deve levar em consideração que a dívida terá de ser paga em dólares que valerão mais do que os dólares tomados de empréstimo. Se a economia vai bem, tudo isso pode ser compensado com o simples recurso de manter os juros baixos; mas se a economia vai mal, até um juro igual a zero pode não ser insuficiente para se chegar ao pleno emprego.
E, quando isso ocorre, a economia pode continuar deprimida porque as pessoas esperam a deflação, e a deflação pode continuar porque a economia permanece deprimida. Esta é a armadilha deflacionária que tanto nos preocupa.
Um segundo efeito: mesmo independentemente das expectativas de deflação futura, preços em queda prejudicam a posição dos endividados, pois aumentam o fardo real de suas dívidas. Poderíamos pensar que se trata de uma questão de soma zero, já que os credores vivenciam um ganho correspondente. Mas, como destacou Irving Fisher há muito tempo, é provável que os endividados sejam obrigados a cortar seus gastos quando o fardo de sua dívida se tornar mais pesado, ao passo que é improvável que os credores aumentem seus gastos na mesma proporção. Assim, a deflação tem como efeito uma depressão nos gastos decorrente do maior peso do fardo das dívidas – o que, como aponta Fisher, pode levar a outro tipo de círculo vicioso, no qual gastos deprimidos por um aumento real no endividamento podem levar a uma deflação ainda mais acentuada.
Finalmente, numa economia em deflação, salários e preços são muitas vezes obrigados a recuar – e, infelizmente, é muito difícil cortar salários nominais -, criando uma rigidez descendente nos salários nominais. Isso significa que, em geral, as economias não conseguem promover uma queda nos salários a não ser que haja também um desemprego em massa, de modo que os trabalhadores estejam desesperados o bastante para aceitar tais declínios no pagamento. Basta ver o caso de Estônia e Letônia.
Os leitores mais atentos já devem ter reparado que nenhuma dessas explicações torna-se imediatamente válida quando a inflação passa de 0,1% para -0,1%. Mesmo com uma inflação baixa, mas positiva, o limite inferior zero pode ser determinante; uma inflação inferior à esperada pelos solicitadores de empréstimos torna o fardo de seu endividamento mais pesado do que o esperado, mesmo se a inflação for positiva; e como os salários relativos mudam o tempo todo, alguns salários nominais terão de recuar mesmo se a inflação geral for pouco superior a zero. Assim, os argumentos segundo os quais a deflação é algo ruim mostram também que alguns problemas econômicos se tornam mais graves conforme a inflação cai, e que uma inflação baixa demais pode na verdade ter efeitos negativos sobre a economia. É por isso que o fato de a inflação, apesar de positiva, estar abaixo da meta do Fed é uma má notícia; e é por isso que pessoas respeitáveis como Olivier Blanchard sugeriram que uma meta mais alta, algo como uma inflação de 4%, pode fazer mais sentido.
Antes que alguém pergunte, uma inflação de 4% não vai transformar os Estados Unidos no Zimbábue. Lembro-me de quando havia uma inflação estável de aproximadamente 4% – e todos diziam que raiava um dia de prosperidade no país.
*Economista estadunidense, articulista do New York Times