Paul Krugman: Teoria da ressaca no Fed
A matéria de Jon Hilsenrath sobre o Fed é uma peça de reportagem impressionante. Ao que parece, alguém está falando do que não sabe. E como diz Tim Duy, isso é deprimente também para quem acredita, como eu, que estamos escorregando consistentemente para uma armadilha de baixo crescimento prolongado e desemprego alto, e que é urgente uma ação agressiva do Fed.
Por Paul Krugman*
Publicado 24/08/2010 20:59
Uma outra coisa me chocou, contudo: pelo menos alguns membros do Fomc (Comitê Federal do Mercado Aberto) compraram a teoria da ressaca – a versão moderna de liquidacionismo em que um desemprego em massa às vezes é necessário depois de um estouro de bolha:
Narayana Kocherlakota, presidente do Fed de Minneapolis, argumentou que uma grande parte do problema atual do desemprego é causada por questões que o Fed não pode resolver, como o descompasso entre as competências dos trabalhadores desempregados e as competências que os empregadores desejam.
Eis o que Kocherlakota disse num pronunciamento após a reunião:
Seja qual for a fonte, porém, é difícil ver como o Fed pode fazer muito para solucionar o problema. O estímulo monetário forneceu condições para que as empresas manufatureiras contratassem novos trabalhadores. Mas o Fed não tem meios para transformar trabalhadores da construção civil em trabalhadores manufatureiros.
Eu tentei explicar, naquele antiga matéria sobre teóricos da ressaca, o que está errado nessa visão em geral. Entre outras coisas,
essa história tem pouca semelhança com o que realmente ocorre numa recessão, quando cada setor – e não apenas o setor de investimento – normalmente se contrai.
E isso está nitidamente se passando desta vez. Kocherlakota gostaria de nos fazer acreditar que há um grande problema de descompasso porque o setor manufatureiro está tentando contratar, enquanto o da construção está em recessão. Mas isto não tem a ver com a realidade do emprego.
O emprego na indústria manufatureira despencou, e não cresceu – aliás, ele caiu mais que o emprego na construção civil. O problema é de falta de demanda geral, e não de descompasso do trabalhadores.
Infelizmente, não estamos fazendo uma discussão acadêmica aqui: neste momento, uma má teoria – uma teoria complemente discrepante da experiência real – está tendo um efeito real de bloquear a ação.
*Economista, colunista do New York Times