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Dólar perderá papel importante no controle da inflação

A medida anunciada hoje pelo Banco Central (BC) visando limitar a posição vendida dos bancos no mercado à vista de dólar pode ser encaixada dentro de um contexto de mudança de paradigma na política econômica brasileira.

A observação é do diretor-executivo da NGO Corretora, Sidnei Mouta Nehme, para quem o BC está abandonando a estratégia de utilizar a taxa de câmbio como auxiliar da política monetária. Estratégia perceptível aos olhos do especialista, mas que jamais seria confirmada pela autoridade monetária.

Segundo Nehme, apesar de o BC se mostrar desconfortável com o tamanho das posições vendidas em dólar, foi ele mesmo quem estimulou a formação desse estoque ao comprar dólares em quantidade superior ao fluxo cambial.

Os números esclarecem isso. Em 2010, o fluxo cambial foi positivo em US$ 24,35 bilhões, mas as compras do BC somaram US$ 41,41 bilhões no mercado à vista, ou seja, além do fluxo ele absorveu outros US$ 17 bilhões.

Se o BC compra, alguém vende. E, no caso, são os bancos que ofertaram moeda, fechando o ano vendidos em US$ 16,8 bilhões. Quem está vendido em dólar não tem interesse de ver as cotações avançarem, pois perde dinheiro com isso.

No fim das contas, forma-se uma relação vantajosa para as duas partes. Os bancos conseguem captar reais de forma barata, pois levantam dólares no mercado externo sabendo que o BC vai comprar, depois investem os reais no mercado doméstico, ganhando o diferencial de juros. Já o BC conta um aliado na manutenção de um dólar baixo, o que reduz o impacto da inflação importada e permite menos uso de taxa de juros.

Com a medida anunciada hoje, de cobrar compulsório de 60% sobre as posições que excederem US$ 3 bilhões ou o capital de referência da instituição, o Banco Central está mandando um recado para o mercado, ou seja, esse “acordo” vai acabar. “O recado é que esse dólar induzido vai acabar”, diz Nehme.

Segundo o diretor, o mercado tinha pleno conhecimento do que o governo estava querendo, mas agora cai a certeza de que o BC será o comprador de última instância, pois ele está forçando uma redução na posição vendida.

Para o especialista, o BC passa a acenar que o dólar não será mais instrumento de controle da inflação. Esse papel caberá à redução dos gastos públicos e à contenção do consumo. Algo já sinalizado por outras medidas em gestão e já implementadas recentemente.

Agora, para que tal “estratégia de saída” dê certo, o BC terá de reduzir o ímpeto de compra no mercado à vista, para ajudar os bancos a cobrir as posições sem gerar nenhuma disparada de preço do dólar.

Fonte: Eduardo Campos, do Valor