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Grafiteiro que rouba grafiteiro tem quantos anos de perdão?

Artigo recente da revista Travel + Leisure elegeu Buenos Aires a nona cidade do mundo mais amigável aos grafiteiros (a primeira é Los Angeles). Mas não precisava ranking nenhum para saber que aqui grafite é coisa “séria”.

Os portenhos possuem uma relação de afeto e orgulho com suas paredes ilustradas e os artistas que as colorem muitas vezes expõem também em museus, estudam no Instituto Universitário Nacional de Arte e vendem em galerias de arte.

Recentemente surgiu um tour que apresenta a capital argentina a partir da chamada “street art”.

Criado por duas inglesas, o Graffitimundo é sucesso entre turistas europeus e americanos, e já ganhou resenhas no New York Times, The Guardian, BBC e Washington Post.

O recorrido dura três horas, custa 45 reais e é feito pelo bairro de Palermo e arredores. Parte a pé, parte de carro. Por enquanto, apenas em inglês, tendo em vista que este é o idioma mais demandado. Normalmente um artista acompanha o grupo.

Os turistas passam por diversas paredes e terminam no único bar de estêncil da cidade, o Hollywood in Cambodia, onde não há um milímetro de espaço disponível para novos desenhos. No local funciona também uma galeria, que vende reproduções dos trabalhos que a gente vê nas ruas.

No trajeto se aprende muita coisa. Principalmente que não dá para confundir Pum Pum com Gualicho ou Jaz, por exemplo. Todos são artistas com traços e técnicas muito diferentes.

Para muita gente pode parecer uma bobagem saber quem é quem no mundo grafiteiro, mas para o mercado de arte já não é.

Olhem bem a foto publicada acima, com desenho principal do trio do coletivo Triangulo Dorado, e reparem que no lado esquerdo há um pedaço “descascado”. Não é descascado. É um pedaço roubado.

Um artista peruano chamado José Carlos Martinat usou as mesmas técnicas de restauradores de murais para arrancar pedaços de grafites portenhos e expor na galeria de arte Liprandi, aqui mesmo em Buenos Aires. Dizem que algumas peças foram vendidas por 20 mil dólares! Não sei se é verdade.

Os artistas locais se sentiram lesados e, com tubos de spray e extintores de incêndio fizeram certo barulho na inauguração. Abriu-se a polemica sobre o direito ou não de “vandalizar o vandalizado”.

O que não está em discussão é que Buenos Aires é uma galeria a céu aberto, pronta para ser visitada num final de tarde de verão, com curadoria e comentários de quem entende do assunto. Ou mesmo sozinho.

Gisele Teixeira é jornalista. Trabalhou em Porto Alegre, Recife e Brasília. Recentemente, mudou-se de mala, cuia e coração para Buenos Aires, de onde mantém o blog Aquí me quedo, com impressões e descobrimentos sobre a capital portenha