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Jornal de Murdoch fraudou tiragem

Grampos telefônicos e compras de informações de oficiais da polícia britânica pelo extinto jornal News of the World não foram as únicas violações éticas e morais do grupo News Corporation, de propriedade do australiano Rupert Murdoch.

As falcatruas das empresas de comunicação do magnata ganharam, nesta terça-feira 11, sobrevida com a renúncia de Andrew Langhoff, diretor administrativo europeu do jornal Dow Jones, após denúncia de fraude nas tiragens da versão europeia do conceituado Wall Street Journal, ambos da NC, e da interferência editorial externa.

Segundo o diário britânico The Guardian, o WSTJ europeu elaborou em 2008 um esquema secreto para aumentar as vendas. A estratégia consistia em parcerias com empresas do continente, que financiavam seminários para universitários vistos como possíveis líderes no futuro – o Wall Street tem muita dificuldade em entrar no mercado que é dominado pelo britânico Financial Times.

Em troca do “apoio”, as mesmas tinham seus nomes publicados em um painel especial do jornal e pagavam a publicidade com a compra de edições do WSTJ a um preço simbólico não superior a cinco centavos de libra esterlina por unidade, inflando a tiragem e enganando leitores e anunciantes. O jornal era então distribuído gratuitamente aos estudantes.

Havia inclusive contratos formais, incluindo a publicação de artigos de tais empresas promovendo suas atividades. O fato gerou reclamações internas de jornalistas do WSTJ sobre a violação da ética, ignoradas pelo grupo.

Organizado em Londres com a anuência da Agência de Audição de Circulação do Reino Unido, o esquema representava 41% das vendas europeias diárias do jornal em 2010, ou seja, 31 mil das 75 mil unidades.

Os executivos seniores de Nova York, incluindo o braço direito de Murdoch, Les Hinton, foram avisados dos acordos. Isso leva a crer que o “chefão” da NC sabia, assim como no caso dos grampos telefônicos, das políticas antiéticas adotadas por seu grupo de comunicação.

O Dow Jones afirmou, após a renúncia de Langhoff, que iniciou uma investigação sobre o caso no final de 2010. Por outro lado, defendeu a legalidade dos acordos, sem importar-se que os mesmos violavam a confiança de leitores e anunciantes. No entanto, para tentar enterrar o assunto, disse não manter mais laços com os responsáveis pelos acordos.

Destacou também não saber das violações editoriais até a última semana, quando adotou “atitudes imediatas”. A justificativa não convence e os contratos são a prova.

Colapso

O esquema começou a enfrentar problemas no início de 2010, quando a companhia holandesa Executive Learning Partnership (ELP) ameaçou deixar o esquema por falta de retorno. A mesma financiava 16% das vendas, ou 12 mil cópias por dia, a um centavo de libra cada.

A pressão resultou em um novo acordo, ainda mais abusivo aos leitores. O acerto definia que a ELP teria publicidade gratuita no jornal em troca da produção de vídeos sobre liderança para os seminários que organizaria em parceria com o WSTJ, enaltecendo a empresa.

Ficou acordado também a publicação de ao menos três artigos especiais com base em pesquisas de mercado europeu realizadas pela ELP e o jornal de Murdoch. Tudo sem informar aos leitores sobre a parceria, despertando novamente a insatisfação dos profissionais do veículo. Em julho de 2010, editores chegaram a questionar a ética do processo e a qualidade das pesquisas em que as matérias se baseavam.

O esquema, porém, ganhou ares mais inescrupulosos quando no final de 2010 a ELP ameaçou não pagar as edições de abril a dezembro por não estar satisfeita com a execução do acordo. A medida tornaria impossível registrar oficialmente as vendas do período e provocaria uma queda de 16% na tiragem, despertando a desconfiança de anunciantes e leitores.

Por isso, Langhoff elaborou uma forma de canalizar dinheiro de outras empresas parceiras do jornal para quitar o valor antes comprometido pela ELP com o dinheiro do próprio WSTJ. Ele, segundo o Guardian, pediu a uma empresa indiana, responsável por financiar com 16 mil libras a organização de um evento em Londres, que pagasse o valor a uma empresa intermediária. Esta direcionou o dinheiro a ELP e as demais companhias acabaram colaborando involuntariamente com o plano.

A maquiagem das vendas do WSTJ escancara a perda total do apresso pela ética por parte da News Corporation e municia os seus acionistas contra as políticas adotadas pelo grupo. Nos EUA, alguns abriram processos contra os Murdochs após o escândalo dos grampos e outros acusam subsidiarias da NC de roubar informações e clientes de competidores.

A era midiática dos “infocapitalistas”, termo do especialista em mídias Manuel Castells, citado pelo jornalista britânco Will Huntton, define perfeitamente as ações descontroladas de Murdoch. O magnata autraliano se encaixa na categoria daqueles que controlam os meios de comunicação, reforçam suas redes de negócios e interferem na política por deterem a produção de informação e conhecimento.

Uma categoria capaz de enquadrar ainda o primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, que altera leis do país para acomodar o crescimento de sua gigante da comunicação, a Mediaset. Por meio desta, favorece o seu partido e difama adversários políticos.

Murdoch, porém, não é político, mas possuía poder e influência suficientes para ajudar a escolher quem governava. Resta saber se permanecerá o mesmo após tantos escândalos.

Fonte: Carta Capital, colaborou Fernando Vives