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Luís Carapinha: Agenda da guerra

Inebriados pelo sucesso da barbárie em terras líbias, os paladinos da guerra imperialista miram novos horizontes. O militarismo ganha mais urgência no quadro quase inevitável de dupla recessão e do espectro de um colapso econômico que assombra o centro capitalista mundial.

Por Luís Carapinha, no jornal Avante!

Desde o quartel-general da Otan, Rasmussen exalta as virtudes das “operações multinacionais” e exige mais sacrifícios aos “parceiros” europeus dos EUA em prol da preservação dos orçamentos bélicos. Na capital líbia, entregue ao arbítrio das hordas do CNT, o senador McCain, candidato republicano derrotado por Obama nas últimas presidenciais norte-americanas, dá largas ao destempero reacionário da agenda dos EUA, ameaçando com novas cruzadas pela liberdade e democracia a Síria, o Irã, a China e a Rússia (Ria-Novosti, 29.09.11).

Um contratempo nesta insana engrenagem constituiu o duplo veto da China e Rússia na votação do Conselho de Segurança (CS) da ONU da moção anti-Síria, coapresentada pelo governo vassalo de Passos Coelho e Portas. Brasil, Índia, África do Sul e o Líbano optaram pela abstenção numa votação que, contrariamente à sinistra resolução 1973 que abriu caminho à agressão e divisão da Líbia, estava condenada à partida pela oposição dos dois principais países fundadores da Organização de Cooperação de Xangai.

Não obstante e contrastando com a atitude dilatória face à declaração de independência da Palestina, os EUA e UE insistiram em levar ao CS a moção apontada à soberania e integridade da Síria, esperando vir a tirar partido de uma nova campanha midiática assestada contra Moscou e Pequim.

Por detrás das pias declarações dos responsáveis dos EUA e da UE e da imprecação do presidente Bashar al-Assad, esconde-se a implacável agenda imperialista que tudo faz para impedir uma saída soberana e democrática para os problemas enfrentados pela Síria e empurrar o país, historicamente baluarte das forças da resistência no Oriente Médio, para o abismo da desestabilização. Já depois do veto de 5 de outubro na ONU, o arco intervencionista, onde proeminentemente se alinham EUA, UE, Turquia e Arábia Saudita, deixou reiterada a ameaça velada de que continuará a recorrer a todos os métodos subversivos para fazer vingar a criminosa linha de ingerência que coloca em causa a própria existência da Síria como Estado.

Ao mesmo tempo, o duplo veto na ONU deixou um travo amargo entre os aliados da Otan e cúmplices da desestabilização, agitando os receios em torno da Rússia e das perspectivas de relacionamento estratégico deste país com a China.

Depois da recente confirmação de Putin como candidato presidencial do “partido do poder”, Rússia Unida, já quase ninguém ousa falar em reset nas relações entre Washington e Moscou. “Medvedev é agora o símbolo supremo da fraqueza, os liberais odeiam-no mais do que Putin”, afirma um analista de política russa citado pela agência Reuters (30.9.11). O anúncio da rotação de cadeiras no Kremlin e a demissão, às mãos do “liberal” presidente russo, do poderoso ministro das Finanças, Kudrin, discípulo de Gaidar e figura grata aos interesses da grande finança internacional, equivalem para já ao estrondoso desmoronar das esperanças e intentos dos “parceiros” de Moscou do G8 em novamente tomar de assalto a direção política do regime russo.

No xadrez mundial da correlação e rearrumação de forças, há que esperar novos passos de pressão e reforço da política de animosidade e contenção em relação à China e Rússia por parte dos EUA e da Otan. Inviabilizar uma eventual agenda própria, ainda que limitada, dos chamados países emergentes é outra prioridade conexa (veja-se o convite à Índia para o escudo antimíssil dos EUA, a que acabaram de se juntar a Turquia e Espanha).

Na sua sanha agressiva, McCain ignora porém a resistência líbia. E contudo, apesar da brutal desproporção de meios, a determinação e coragem dos patriotas líbios lembra que caberá à ação dos povos, das grandes massas e dos trabalhadores ditar a última palavra.

Fonte: Jornal Avante!