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Greve geral pode ser estopim de novas mobilizações no Reino Unido

Uma nova geração de britânicos redescobriu a greve geral, na quarta-feira (30). Depois de três décadas em que essa prática havia quase desaparecido, entre 1 e 2 milhões de funcionários públicos paralisaram o trabalho, em protesto contra a reforma da previdência e as medidas de austeridade. É a maior greve geral desde janeiro de 1979.

Greve Inglaterra - Chris Helgren/Reuters

A greve repercutiu em todo o Reino Unido. Quase 75% das escolas na Inglaterra, 80% no País de Gales e 99% na Escócia foram fechadas, pelo menos parcialmente. Nos hospitais, um quarto das cirurgias de pequeno porte foi cancelado. Em toda parte, funcionários aderiram às dezenas de manifestações: 25 mil pessoas no centro de Londres, 30 mil em Birmingham, 20 mil em Manchester…

No centro de Londres, grande parte dos manifestantes estava fazendo greve pela primeira vez na vida. Era o caso de Mike Ansell, que trabalha na Goldsmith University: “Eu e minha mulher, que é professora, não tínhamos vontade de entrar em greve; mas a vida está cada vez mais difícil por causa dos preços que não param de subir. A reforma da aposentadoria foi a gota d’água”.

Lise, uma fonoaudióloga de 39 anos, não esconde sua ira: “Nunca pensei que um dia entraria em greve, mas o governo parece estar querendo atacar todo o funcionalismo público, e precisamos nos defender.” Como muitos outros, ela acredita que as reformas conduzidas por David Cameron, o primeiro-ministro, são ideológicas. “Ele nunca frequentou escola pública, e seu governo é composto por milionários”, diz Lisa, que trabalha como professora-assistente.

A revolta é geral entre os 6 milhões de servidores públicos britânicos que vivem há um ano as consequências de um plano de austeridade sem precedentes: 150 mil empregos já foram cortados. A isso se soma uma drástica reforma da previdência: os funcionários públicos deverão aumentar em 50% suas contribuições (passando de 6% de seu salário para 9%), para receber uma pensão menor (calculada sobre a média dos salários, e não mais sobre os últimos anos), ao mesmo tempo em que só poderão se aposentar mais tarde (progressivamente até os 67 anos, a partir de 2024).

As pessoas estão dispostas a lutar

No entanto, apesar dessa greve de dimensão incomum para o Reino Unido, o país não parou. Quase todos os transportes funcionaram, uma vez que são geridos por empresas privadas e que a greve só teve a adesão do funcionalismo público. Os aeroportos, que deviam ficar fortemente bloqueados com a greve dos agentes alfandegários, não tiveram perturbações.

Como não havia uma manifestação centralizada, mas centenas de eventos em todo o país, é difícil de avaliar a verdadeira extensão da mobilização. Abriu-se uma guerra de números: havia 2 milhões de grevistas, como anunciado inicialmente, segundo os sindicatos; pouco mais de 1 milhão, responde o governo, que no entanto não foi capaz de apresentar um número total. Isso permitiu que David Cameron, o primeiro-ministro, afirmasse que o movimento foi “fogo de palha”.

Diante das manifestações, a Downing Street (sede do governo britânico) optou pela firmeza. Provocador, o ministro da Fazenda, George Osborne, anunciou, às vésperas das manifestações, que os salários dos funcionários não aumentariam mais do que 1% ao ano em 2013 e 2014, além do congelamento imposto em 2011 e 2012. O governo está apostando no fato de que os novos grevistas, embora revoltados, não estão prontos para um movimento de longa duração.

Jason Bonning, professor e sindicalista bastante ativo e assíduo em greves, parece concordar: “Infelizmente acho que David Cameron não precisará fazer grandes concessões para conseguir dividir os sindicatos e os funcionários”. Outros, pelo contrário, acreditam no despertar de um grande movimento. “Isso é só o começo”, pensa Nicholas Dobson, professor desempregado. “Já existem os indignados da City (centro financeiro de Londres) e os milhões de jovens desempregados muito revoltados: as pessoas estão dispostas a lutar”.

Se ele tiver razão, esse dia de ação poderá ser um ponto de virada para o Reino Unido. Se não, o governo levará a cabo seu plano de austeridade sem precedentes: meio milhão de empregos no funcionalismo público serão cortados até 2017.

Fonte: Le Monde
Tradução: Lana Lim