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Sanções econômicas não abatem os iranianos

Enquanto o Irã lida com as sanções internacionais que tentam frear seu programa nuclear, um indicador não oficial que ainda está para ser medido é a grande confiança dos consumidores.

Por Jason Rezaian, na agência IPS

Em março, durante seu discurso pelo Ano Novo persa transmitido pela televisão para todo o país, o líder supremo do Irã, Ali Khamenei, disse que este ano de 1390 era o da “jihad econômica”. E acrescentou que “estas sanções que os inimigos da nação iraniana estão planejando ou implementando buscam desferir um golpe ao progresso de nosso país”.

De fato, as sanções, juntamente com um alto desemprego e inflação, bem como com um escândalo bancário generalizado, fazem com que a população esteja indignada e nervosa quanto ao futuro, e os analistas estrangeiros estão convencidos de que a qualquer momento haverá um protesto no Irã. A moeda iraniana, o rial, sofre uma desvalorização histórica em comparação com as principais divisas mundiais, e é provável que nos próximos meses continue em queda livre.

Para a maioria dos países, a sucessão de más notícias financeiras seria desastrosa, mas o Irã não é a maioria dos países. Reduzir seus hábitos de consumo é algo que aparentemente nem se propõe aos iranianos, já que o comércio é parte integral de sua identidade e de suas tradições.

Um exemplo que pode parecer trivial a um estrangeiro, mas que está profundamente arraigado nesta cultura ancestral, é a importância de presentear. Na maioria dos casos considera-se inaceitável chegar à casa de alguém com as mãos vazias. Daí floriculturas e confeitarias prosperarem enquanto para os dentistas é difícil ganhar a vida. Além disso, enquanto o preço da maioria dos bens e serviços aumentaram mais rapidamente este ano desde a implantação de reformas aos subsídios, o iraniano médio não está nem perto de ir para a cama com fome.

O plano do senador norte-americano Mark Kirk para “ferir economicamente o Irã, e seu prognóstico de que sancioná-lo reduziria o rial à sua mínima expressão, parece, neste momento, uma demonstração de pensamento mágico.

Para compensar a carestia de bens e serviços antes subsidiados, o governo fez depósitos diretos em dinheiro nas contas bancárias de todo iraniano que se inscreveu no programa. Para Kevan Harris, pesquisador da Universidade Johns Hopkins, que visita o Irã com frequência, estes depósitos mensais “somam fluxos de dinheiro às vidas de todos, não apenas dos ricos”. Isto não só torna muito improvável que ocorram distúrbios por falta de alimentos, como também levou, nos últimos meses, a já conhecida tendência consumista dos iranianos a um grau sem precedentes.

Fazendo compras em um dos principais bazares de Teerã, Golnaz, uma contadora de 27 anos, não duvidou em gastar US$ 6 de seu salário mensal equivalente a US$ 500 para comprar menos de 230 gramas de frutas secas. “Este é o preço. Estamos acostumados com as coisas custando mais. É assim para minha geração”, afirmou.

Proliferam empreendimentos de venda varejista em centros urbanos, especialmente restaurantes. Para um país que supostamente está à beira da bancarrota, as longas filas diante de muitos locais de venda de comida mostram um cenário muito diferente do que circula nas capitais do Ocidente.

Restaurantes com todo tipo de especialidade, desde o sushi japonês até os burritos mexicanos, pululam por toda a capital, e sua clientela não parece muito preocupada em gastar o que resta em seus bolsos apesar do futuro incerto. Nesta terra, onde os bares e os clubes não existem, é comum se pagar US$ 7 por um café com leite, e as lojas que os servem prosperam mais do que nunca.

“Há duas coisas com as quais os iranianos não deixarão de gastar. Uma é comida, e a outra são os produtos luxuosos. Novas roupas, novos celulares, novos automóveis, se podem pagar. Pode não ser sábio, mas nos preocupa muito o que os outros pensam a nosso respeito”, disse Shabnam, um jornalista local.

Entretanto, um problema cada vez maior é que muitos dos bens que alimentam este auge do consumo não são produzidos no país. A dependência das importações aumenta. A carne nacional, por exemplo, custa quase US$ 20 o quilo, enquanto a congelada e importada do Brasil e do Uruguai está em torno dos US$ 6.

Ao contrário do Irã, a Turquia trabalha duramente para desenvolver uma produção interna, provendo simultaneamente sua economia de mercadorias suficientes para atender as necessidades nacionais, além de criar milhões de postos de trabalho nas indústrias exportadoras. Com uma política recíproca que não requer visto para entrar no país vizinho, os consumidores iranianos afluem maciçamente à Turquia para aproveitar os preços menores e as mercadorias que, normalmente, são de melhor qualidade. As exportações turcas também apostam em ficar com uma fatia mais suculenta do mercado iraniano, à custa dos produtores desse país.

De modo semelhante, a China se converteu no principal fornecedor de produtos para o Irã. Segundo Harris, “o problema no caso do Irã não é falta de dinheiro, mas muito dinheiro que não está dirigido a esforços produtivos”. Junto com suas exportações, a quantidade de viajantes chineses que chegam ao Irã aumentou drasticamente nos últimos meses. Enquanto boa parte do mundo acordou deixar de fazer negócios com o Irã, Pequim parece ansiosa para preencher esse vazio com o que possa desejar esse mercado voraz.

A indústria na qual o Irã tem certo êxito nos últimos tempos é a produção de automóveis. De fato, é o principal produtor e exportador de automóveis na região. Entretanto, esta não é a impressão que se tem ao se dirigir em Teerã, onde disparou o número de carros de luxo estrangeiros, apesar dos altos impostos sobre as importações, que podem passar dos 100%. É comum ver Maseratis, Porsches, BMW e Mercedes Benz circulando pela capital, onde há apenas um ano era difícil encontrar um veículo que não tivesse sido fabricado ou montado no país.

Fonte: Envolverde