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Angel Guerra Cabrera: A Celac e a imensidão do sonho bolivariano

A cúpula constitutiva da Comunidade de Estados da América Latina e Caribe (Celac), celebrada em Caracas nos dias 2 e 3 de dezembro é fato de uma inquestionável dimensão histórica. Neste caso cabe usar o qualificativo sem temer exageros.

Por Angel Guerra Cabrera*

A reunião superou as expectativas mais otimistas pelo espírito democrático com que foi preparada pelos anfitriões venezuelanos em permanente consulta com os demais governos, pelo ambiente de irmandade em que se desenvolveu, pela sustância de seus documentos de fundação que transpiram espírito e léxico e emancipadores, independentes e latino-americanistas. A partir de agora, a América Latina e o Caribe falarão com voz própria na arena internacional multipolar, acelerada pela débâcle do capitalismo neoliberal e as fracassadas guerras de agressão de Washington.

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Apesar de na Celac existirem países com políticas neoliberais e outros que as questionam frontalmente, a cúpula marca a ruptura da região com a Doutrina Monroe. Tal como prova a experiência prévia, estas diferenças não devem impedir seu funcionamento. Sim, convém reiterar que o caminho a seguir não estará isento de obstáculos endógenos e principalmente ameaças exógenas. Em todo caso, a magnitude de seus objetivos de integração econômica, cultural e política com inclusão social, cuidado pela natureza e participação cidadão são inerentes à magnífica imensidão do sonho de Simón Bolívar e de San Martín. Tal como é corroborado pela Declaração de Caracas, o procedimento para o funcionamento da Celac, o plano de Ação de Caracas e os outros 20 documentos adotados.
 

Quando Bolívar enunciou este ideal, logo atualizado por Martí, alguns não acreditaram que fosse viável, ainda que tenham considerado nobre e maravilhoso; para outros foi diferente; outros ainda — os impérios e as oligarquias — se ergueram contra seus inimigos jurados e fizeram o que estava a seu alcance para afogá-lo no berço quando se transformou em proposta política. Mas sempre, até nas circunstâncias mais adversas, houve quem os defendessem e foram fiéis, tal como pôde ser apreciado no interessante debate sobre a história latino-americana protagonizado nas vésperas da cúpula pelos presidentes Cristina Kirchner e Hugo Chávez na televisão venezuelana.

Ainda que o espaço não me permita mencionar nomes, a criação da Celac nos obriga a recordar os lutadores sociais, revolucionários e estudiosos que mantiveram o sonho vivo e o enriqueceram ao longo dos anos, muitos deles vinculados à Universidade Nacional Autônoma do México. Mas se me pedissem para mencionar apenas um nome de alguém que, nos séculos 20 e 21 acreditou, pregou e atuou fecundamente a favor da necessidade de unir a América Latina e o Caribe, esse nome seria Fidel Castro. Citando um fato pouco conhecido, o líder da Revolução Cubana é a única personalidade não pertencente à Comunidade dos Estados do Caribe (Caricom) que por decisão de todos os seus líderes recebeu a Ordem Honorária do organismo, “homenagem ao fervor e sacrifício que acompanharam Fidel durante toda a vida de serviço dedicada a seu país, à sua região e ao resto do mundo em desenvolvimento”, reza o acordo.

É evidente que é impossível explicar a Celac sem o trabalho do Grupo do Rio, primeiro mecanismo de acordo político claramente latino-americano e as cúpulas da América Latina e do Caribe para o desenvolvimento do Brasil e do México. Formam parte de seu acervo, como se proclama nos documentos de sua fundação. Assinalo como indispensável evocar que na etapa compreendida entre os anos 1990 e a atualidade, Hugo Chávez foi o maior impulsionador e articulador de alianças, dos grandes entendimentos e consensos, um dos forjadores principais das instituições e os conteúdos solidários nas relações latino-caribenhas que fizeram possível a exitosa criação da Celac. Entre eles tem grande valor a restauração das relações entre os governos da Colômbia e da Venezuela graças a uma louvável vontade mútua.

Há 17 anos — quatro antes de ser eleito presidente — Chávez afirmou na Universidade de Havana: “O século seguinte, para nós, será o século da esperança, é nosso século, é o século da ressurreição do sonho bolivariano, do sonho de Martí, do sonho latino-americano”. A história está lhe dando razão.

* Angel Guerra Cabrera é jornalista cubano residente no México, colunista do La Jornada.

Fonte: CubaDebate
Tradução: da redação do Vermelho,
Vanessa Silva