Sem categoria

UE deve aprovar novos tratados para salvar euro e evitar recessão

Em 2012 o euro e a UE estão em jogo. A maioria dos prognósticos dos analistas e das instituições aponta que este novo ano será o mais difícil na história do euro e do projeto europeu. Esperemos que os mesmos especialistas que não viram chegar a crise se equivoquem também desta vez.

Por Andreu Missé

A UE aborda 2012 com diversos desafios: salvar o euro, sanear seus bancos, enfrentar uma segunda recessão econômica e um desemprego maciço e estancado que afeta mais de 23 milhões de pessoas, das quais um quinto se encontram na Espanha. Para enfrentar esses desafios, a UE se envolveu em uma arriscada reforma institucional, através de dois novos tratados internacionais, promove um plano para recapitalizar seus bancos, cuja paralisação mantém a economia europeia estagnada por falta de financiamento, e embarcará em um plano de reformas econômicas para estimular o crescimento, de efeitos incertos. Austeridade e cortes do Estado do bem-estar são por enquanto os remédios predominantes. A seguir detalhamos as principais tarefas previstas e suas principais dificuldades.

Acordo internacional

O novo ano começa com uma corrida contra o relógio para estabelecer um acordo internacional dos 17 países do euro. A decisão de estabelecer um novo tratado internacional foi a resposta da UE à negativa do Reino Unido a permitir que os membros do euro avancem para uma união fiscal e econômica mais forte.

Segundo esse novo tratado internacional, aberto aos demais parceiros da UE, os Estados da moeda única se comprometem a incorporar em suas constituições ou "legislação equivalente" a chamada "regra de ouro", que obriga os signatários a conseguir o equilíbrio orçamentário, com justificadas exceções. Dentro do ciclo econômico o déficit só poderá ser de 0,5% do PIB. Também se pretende reforçar a coordenação e a disciplina orçamentárias e as reformas em matéria trabalhista, aposentadorias e fiscalidade no que se refere ao imposto de empresas.

O novo tratado entrará em vigor quando for aprovado por nove Estados, o que abre a porta para que algum país fique atrasado por causa de dificuldades políticas para aprová-lo, como poderia ser o caso de Irlanda, Finlândia ou Grécia, e se instaure o euro em duas velocidades. O rascunho aprovado no final de dezembro voltará a ser analisado na cúpula de 30 de janeiro próximo. Está previsto que seja aprovado na cúpula de 1º e 2 de março e ratificado antes do final de 2012. O objetivo é que em longo prazo o novo tratado seja incorporado à legislação comunitária. Participarão das negociações a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Parlamento Europeu, cujos representantes já indicaram que os objetivos poderiam ser igualmente alcançados desenvolvendo-se a legislação secundária com os tratados atuais.

Fundo de resgate permanente

Também a toda pressa, os países do euro deverão acordar um tratado internacional para estabelecer um fundo de resgate permanente, o chamado Mecanismo Europeu de Estabilidade (Mede), com uma dotação de 500 bilhões de euros para ajudar os países que tiverem dificuldades para encontrar compradores para sua dívida pública. Espera-se que possa estar operacional em 1º de julho próximo, e entrará em vigor quando for ratificado pelos Estados que representem 90% de seu capital.

Maior protagonismo do BCE

Durante este ano continuará o deslocamento do poder político de Bruxelas para Frankfurt, sede do Banco Central Europeu, que foi a entidade chave para evitar o colapso de alguns países. O banco adquiriu mais de 211 bilhões de euros de dívida pública da Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha, evitando assim que seu encarecimento não fosse mais exorbitante. O banco emissor do euro será o encarregado da gestão do fundo de resgate temporário – o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) – diante da falta de meios de seus administradores atuais. A implementação dos dois tratados (para coordenar a política orçamentária e econômica e criar um fundo de resgate, o Mede) tem um duplo propósito não escrito. Trata-se de convencer a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente do banco emissor do euro, Mario Draghi, de que o BCE possa atuar como comprador de dívida pública de qualquer país do euro sem limites, e em segundo lugar para criar eurobônus.

Saneamento da banca europeia

O saneamento da banca é uma condição necessária para reativar a economia europeia. Os bancos estão paralisados há vários meses, isto é, não emprestam para famílias nem empresas, segundo o BCE. A última prova dessa desconfiança por parte das entidades foi registrada no final do mês passado. Depois que 523 bancos conseguiram empréstimos do BCE por três anos no valor de 489 bilhões de euros a 1%, guardaram em seu balanço cerca de 220 bilhões e correram a depositar o restante no BCE a 0,25%. Preferem manter um saldo recorde de 411 bilhões no banco emissor do que emprestá-lo para as empresas ou adquirir dívida pública. As autoridades europeias exigem que várias entidades se recapitalizem em um valor global de 115 bilhões antes de 30 de junho de 2012. Devem apresentar seus planos até 20 de janeiro.

Recessão, austeridade e cortes sociais

O prognóstico de Bruxelas é que a economia da zona do euro crescerá somente 0,5% este ano. Para o BCE o risco de recessão é muito alto. De fato, a queda de atividade já é uma realidade na Grécia e Portugal. Espanha, Itália e Reino Unido também registrarão dois ou mais trimestres de contração econômica. Por enquanto as receitas são austeridade e cortes dos direitos sociais, especialmente em aposentadorias e serviços de saúde, como estamos vendo na maioria dos países europeus. O desemprego se manterá ou crescerá. Os governos rejeitam a implementação de um plano de investimentos públicos reclamado por diversas instâncias da esquerda política. Há propostas concretas, como a criação de um Fundo de Estabilidade e Crescimento, como defendem Janis A. Emmanuoilidis e Fabian Zuleeg, pesquisadores do Centro de Políticas Europeias.

Grécia, pendente do segundo resgate

As incertezas sobre o euro se agravam diante da incapacidade de resolver os problemas mais antigos. A Grécia, país que desencadeou a crise da dívida há dois anos, continua situada no centro do furacão. Asfixiada pelo incessante acúmulo de planos de austeridade e com uma população cada vez mais sofrida com a perda da qualidade de vida, corre sérios riscos de ter de abandonar a moeda única, mesmo que seja uma decisão ainda mais desastrosa. O segundo plano de ajuda da UE e do FMI, de 130 bilhões de euros, acordado em outubro passado, que se somam aos 110 bilhões de maio de 2010, está pendente de ratificação. O plano depende de um acordo com os bancos, que deverão assumir um prejuízo de cerca de 100 bilhões, isto é, 50% de seu investimento.

Recomposição com o Reino Unido

A ruptura com o Reino Unido, registrada na cúpula de 9 de dezembro passado, não leva a nada bom para Londres, mas tampouco para a UE. Sarkozy tentará recompor a situação porque não quer estar só diante de Merkel, e a chanceler alemã é muito consciente da importância da praça financeira de Londres para deixá-la fora da União.

Nas mãos do FMI

A crise deixou clara a incapacidade da UE para resolver a crise da dívida. Até agora, a implementação dos mecanismos de resgate para países com dificuldades teve efeitos muito limitados e se tratava sempre de ajudas a pequenos países (Irlanda, Grécia e Portugal). A Alemanha não quer ser obrigada a emprestar grandes somas de dinheiro se países grandes como a Itália ou a Espanha cambaleiam. Berlim optou por emprestar dinheiro ao FMI e que este financie os fundos de resgate europeus ou diretamente aos países. Mas essa operação, que previa uma contribuição de 200 bilhões de euros, ficou em 150 bilhões por enquanto. Londres precisa tomar uma decisão no início do ano. A realidade é que a UE está cada vez mais nas mãos do FMI e sua presidente, Christine Lagarde, já se transformou em frequentadora habitual das reuniões do eurogrupo em Bruxelas.

Croácia, sócio número 28

Apesar da profunda crise que sofre a Europa, o projeto comunitário segue adiante, com novos sócios à vista, candidatos e aspirantes. Montenegro poderia iniciar suas negociações de adesão em junho. Em fevereiro a UE decidirá se concede à Sérvia o estatuto de país candidato. A União é uma referência internacional para os vizinhos e para as grandes potências, conscientes de que um colapso do euro e do projeto europeu teria consequências nefastas para todos eles. A presença cada vez mais frequente na Europa do secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, é um indício importante. Possivelmente o melhor guarda-chuva de proteção do projeto europeu é o interesse internacional das grandes potências.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Fonte: El País