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China dá primeiro passo para reciclar petrodólares

O acordo de troca de moedas assinado entre China e Emirados Árabes Unidos (EAU) durante a viagem do premiê Wen Jiabao pela região do Golfo Pérsico, provocará incômodo nas capitais ocidentais, especialmente em Londres e Washington. A lista de países com os quais a China já tem esse tipo de acordo vai aumentando lenta e continuadamente, e esse é o primeiro desses acordos assinado com um Estado do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG).

MK Bhadrakumar, no Indian Punchline

O acordo com os EAU cobre 5,5 bilhões de dólares – o comércio bilateral no ano passado, com as exportações chinesas responsáveis por dois terços, alcançou 36 bilhões de dólares – e visa a “fortalecer a cooperação financeira bilateral, promovendo o comércio e os investimentos e, simultaneamente, salvaguardar a estabilidade financeira regional” – segundo o Banco Central da China. A China está, essencialmente, fornecendo ‘seed money’ [lit. ‘dinheiro semente’], para que os comerciantes não precisem converter ao dólar todas as transações, o que reduz os custos de câmbio.

À primeira vista, o critério é da conveniência, mas evidentemente lança sombras sobre vários outros campos. Bem visivelmente, a China está tratando de ‘sensibilizar’ o Oriente Médio, em relação à função do renminbi[1]. Estar guardado como moeda de reserva nos cofres dos Emirados Árabes Unidos aumenta o prestígio do renminbi. Quanto aos Emirados Árabes Unidos, ter o poderoso yuan em suas reservas é a medida mais segura que jamais tomaram no mundo da alta finança, dado que a valorização da moeda chinesa é evento praticamente garantido para o futuro.

Além disso, a troca de moedas chama a atenção para o rápido crescimento dos laços econômicos da China com a região do CCG. É uma declaração política de que a China trabalha para ampliar seus laços com os Emirados Árabes Unidos que, até agora, historicamente, sempre viveram como ‘bolsão’ dos britânicos no Oriente Médio. Dos dhows[2], ouvem-se os gritos ‘Yo, ho, os chineses estão chegando!’

Mas estão chegando também com propósito bem claro. Abu Dhabi controla 7% das reservas comprovadas de petróleo do mundo, o preço do barril já está ultrapassando os cem dólares, os EAU estarão renovando suas concessões de petróleo em 2014, e, então, as empresas chinesas com certeza estarão posicionadas para dar trabalho, na disputa pelas concessões, à Royal Dutch Shell, à ExxonMobil e à Total francesa. Claro, os EAU são mercado difícil, no qual a cultura de negócios ocidental está profundamente enraizada, mas… nunca subestimem os chineses.

Acima de tudo, a China dá seus primeiros passos no mundo embriagador da reciclagem de petrodólares, e é difícil imaginar que Pequim não saiba o que está fazendo agora, nessa troca de moedas com os Emirados Árabes Unidos. A China é país milenar e sabe muito bem que qualquer longa marcha começa num pequeno primeiro passo.

O xis da questão é que as moedas dos países do Conselho de Cooperação do Golfo são aderidas ao papel verde, e seus massivos lucros são em grande parte encaminhados para os cofres dos bancos de Londres ou Nova York, ou são usadas para comprar ações e bônus do Tesouro dos EUA – e, isso, quando não são usadas para comprar armas ou noutros gastos extravagantes.

O negócio agora assinado entre China e Emirados Árabes Unidos meteu um pensamento muito excitante na cabeça dos estados do CCG: a possibilidade de faturar em renminbis – que muito preocupará o ocidente. Atualmente, ninguém precisará perder o sono, porque Pequim restringe rigidamente os fluxos de sua moeda fora das fronteiras chinesas, mas não há dúvidas de que a China já está implantando toda a infraestrutura indispensável para uma era, não muito distante, quando poderá dar adeus às estritas restrições hoje vigentes para o fluxo de moedas, se se interessar por usar o renminbi no comércio internacional. É possível que em 2025 a China esteja importando três vezes mais petróleo dos países do CCG, do que Tio Sam.
[1] Renminbi [lit. “moeda do povo”] é o nome oficial da moeda da China, introduzida na República Popular da China, na fundação, em 1949. Também chamado “Yuan.” (

[2] Embarcação mercante tradicional na região