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Inês Zuber: A "via diplomática" da UE

No site do Parlamento Europeu (PE) se pode ler o seguinte título: "Eurodeputados apoiam novas sanções ao Irã e avisam contra nova escalada", a propósito de uma resolução aprovada no passado dia 2 de Fevereiro sobre o Irã, em plenário do PE.

Por Inês Zuber*


Se quem escreveu o título (e o texto) tivesse algum rigor jornalístico, teria mencionado que a dita resolução não foi subscrita (nem votada favoravelmente) pelo GUE/NGL, grupo no qual os deputados do PCP se integram, mas sim pelos restantes grupos políticos (direita, liberais, sociais-democratas, conservadores, verdes).

O texto em causa é o respaldo do PE à decisão do Conselho Europeu de aprovar novas sanções unilaterais contra o Irã que incluem o embargo europeu de petróleo iraniano e a proibição de transacções da UE com o Banco Central iraniano, medidas que nada têm de original, sendo apenas a réplica europeia das sanções já decididas pelos EUA.

Nesta resolução, o PE diz "apoiar o empenho do Conselho na procura de uma solução diplomática para a questão nuclear iraniana". Sim, é estranho, mas a maioria dos deputados do PE consideram que impor um bloqueio que pretende asfixiar o sistema econômico e financeiro do Irã (a UE compra 18 por cento da exportação de petróleo iraniano) e cujas consequências incidirão em primeiro lugar nas condições de vida do povo iraniano, é uma forma "simpática" e "diplomática" de estabelecer diálogo.

É evidente que seja inaceitável, para os responsáveis europeus, perante tão "diplomática" abordagem dos EUA e da UE, que o governo iraniano tenha respondido com a ameaça de encerrar o estreito de Ormuz, por onde passa cerca de 20 a 30% do petróleo transportado por mar.

É que as medidas da UE são sempre "diplomáticas", já as respostas do Irã consistem em "provocações" merecedoras de repúdio e condenação. Ora, para combater essa "ameaça" de quem não tem direito a resistir a estratégias imperialistas, segundo a maioria dos deputados europeus, os EUA e países da UE foram "obrigados" – mas, sempre, "diplomaticamente" – a enviar enormes contingentes navais, como a Quinta Esquadra, para a costa marítima iraniana.

Sejamos claros. Qual é a parte desta triste "estória" que a humanidade já não conhece? Ter um pretexto para tentar que a opinião pública "aceite" uma possível intervenção militar que satisfaça as ambições imperialistas dos EUA e da UE? Não foi a alegada existência de armas de destruição maciça que pretendeu "justificar" a invasão dos EUA e da Grã-Bretanha ao Iraque, à margem de qualquer decisão do Conselho de Segurança das Nações Unidas? Mais tarde, o próprio vice-secretário da Defesa da administração Bush, Paul Wolfowitz, confessou que o motivo que conduziu a uma ocupação que fez mais de um milhão de mortos, a maioria civis, foi a existência de petróleo iraquiano.

No Afeganistão, a "luta contra o terrorismo" foi o motivo apresentado pelos EUA que queriam aqui pregar, mais uma vez, a sua "moral democrática". Mas, coincidentemente, o Afeganistão tornou-se novamente, por estes tempos, o país monopolista na produção mundial de ópio. E, mais recentemente a Líbia. Aqui, mais uma vez, os EUA, com o apoio da França e da Grã-Bretanha, papaguearam acerca da necessidade de uma curta "intervenção humanitária". Afinal, os devastadores bombardeamentos da NATO destruíram cidades e aldeias líbias durante mais de sete meses. E ainda antes de ter acabado a guerra, já os agressores imperialistas discutiam como distribuir o saque, ou seja, o petróleo e o gás líbios.

Hoje, no Irã, é o pretenso perigo de desenvolvimento de armas nucleares – nunca confirmado pela Agência Internacional de Energia Atómica – que tenta justificar, por parte dos EUA e UE, a imposição de sanções e de movimentações militares provocatórias. Mas como a história nos ensina e nos torna previdentes, temos por certo que, para lá de evidentes interesses geoestratégicos no contexto do projeto do "Grande Médio Oriente", as verdadeiras ambições dos EUA e da UE no Irã residem no fato de este ser o segundo país produtor de petróleo da OPEP e nos negócios lucrativos que uma guerra pode trazer, sobretudo, em tempos de crise.

As preocupações dos responsáveis e dos deputados europeus acerca de possíveis projectos nucleares é, curiosamente, muito "seletiva". É uma preocupação que visa alguns países mas jamais potências nucleares como a França, Inglaterra, os EUA ou Israel.

Quanto a nós, continuamos, como sempre, a defender e a lutar pelo desarmamento e fim das armas nucleares e de destruição maciça, pelo cumprimento das determinações da Carta das Nações Unidas, pelo respeito pela soberania e igualdade dos povos, pelo direito a viver em Paz. Mas sem hipocrisias.

*Inês Zuber é militante do Partido Comunista Português (PCP).

Fonte: Jornal Avante!