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Presas mantêm relações homoafetivas no Pará

O Vermelho reproduz uma reportagem publicada, na quarta-feira (29), que revelou a intimidade de mulheres homossexuais em uma prisão na região metropolitana de Belém, no Pará. Celas improvisadas; encontros ligeiros  e relações conturbadas. Em uma delas, antigas rivais do tráfico se reencontram e vivem um romance entre tapas e beijos.

No Centro de Recuperação Feminino de Ananindeua, na região metropolitana de Belém, no Pará, as relações amorosas entre as detentas dependem do improviso. Na penitenciária, que tem 601 internas, há pelo menos 8 casais que aproveitam os horários de banho de sol, de trabalho ou de limpeza, quando as celas ficam abertas, para se encontrarem.

A visita íntima vale só para presos que possuem um parceiro do lado de fora das grades, e é  garantida a detentos homossexuais pela portaria do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), desde junho de 2011. Um levantamento apontou que pelo menos 196 detentos homossexuais, em 14 estados, já o solicitaram. Mas a Pastoral Carcerária defende a necessidade de se regulamentar também os encontros de casais formados dentro das prisões.

A reportagem do G1 esteve no presídio de Ananindeua, em novembro do ano passado, e conversou com três casais de presas que assumiram um relacionamento homoafetivo na unidade e com uma detenta que possui relação estável com uma ex-presidiária, da qual recebe visitas íntimas nos finais de semana. Os nomes usados na reportagem são fictícios para preservar a identidade delas.

“Ela mora na (cela) 15 e eu moro na 9, é na mesma vila. Quando abre para o banho de sol, a gente se visita. Mesmo se outras estiverem na cela, podemos nos ver. Moramos coletivamente, mas a gente respeita um o espaço da outra”, explica Barbie, uma detenta de 28 anos presa por roubo e tráfico. “Para não chamarmos a atenção, amarramos um pano, lençóis nas camas, e fazemos uma ‘empanada’, uma espécie de caixinha. Uma caixinha de prazer”, diz.

Barbie tem um relacionamento estável com Nat há 7 anos. Eram rivais no controle da venda de drogas em uma mesma área de Belém quando eram livres, namoraram o mesmo homem e Barbie chegou a tentar matar Nat várias vezes. Quando Barbie foi detida pela segunda vez, Nat mandou uma carta “pedindo paz”. Foi aí que o relacionamento começou.

“Conhecemos nosso limite. Não vou fazer algum barulho ou alguma coisa que possa denegrir a imagem da minha colega ou constranger ela diante das outras enquanto não estivermos sozinhas na 'empanada'. Vivemos aqui em um mundo de regras e normas. Mas também fica só eu e minha mulher, não pode vir ninguém atrapalhar”, explica Barbie, que já foi presa 11 vezes.

Lei Maria da Penha

Segundo a vice-diretora da unidade, Dorotéia Lima, o relacionamento das duas é um dos mais tumultuados da prisão. “Elas brigam demais, possuem um ciúme muito grande. Viviam na mesma cela, mas, como se agridem demais, tivemos que separá-las. Um dia chegaram a se cortar e a coisa foi tão feia que tive que mandá-las para a delegacia e a Barbie foi enquadrada na Lei Maria da Penha”, diz.

Dorotéia afirma que não tem como impedir relações sexuais dentro das celas. “Elas são maduras, se entendem. Se um casal se forma em uma mesma cela, não temos como impedir. Elas possuem regras de respeito entre si. É o que exigimos para que o presídio funcione bem. Só interferimos quando há casos de violência e agressividade entre elas, seja por ciúmes ou outros motivos”, explica.

Do lado de fora, homens levam 'o fora'

Algumas detentas contam que tinham maridos ou namorados do lado de fora quando foram presas e que usufruíram algumas vezes do direito à visita íntima até que optassem pelo rompimento da relação. “Eu me apaixonei por ela, foi amor à primeira vista. Vi ela entrando na cela e pensei: ‘que princesa’. Ela tinha um namorado, mas certa vez decidi arriscar e roubar um beijo. Ela nunca tinha se envolvido com uma mulher e acabou estranhando, mas até que optou por nossa relação e o 'Tonny Ramos' dela perdeu”, diz Joana, de 41 anos, presa por tráfico e que possui uma relação de 1 ano e 6 meses com Cris, de 20 anos, que faz curso de manicure na penitenciária.

As duas mantinham o namoro na prisão até Joana obter direito a progressão para o regime semiaberto e ser libertada. Agora, as duas possuem direito à visita íntima. “Eu já vim visitar ela, trouxe o fígado cozido que ela estava com desejo de comer, né, amor”, relembra Joana.

Ameaças

Já a ex-prostituta Juliana, de 31 anos, presa por assalto e corrupção de menores, diz que é ameaçada pelo ex-marido desde que ele descobriu que ela mantém um caso na prisão.

“Quando eu cortei a carteira de visitante do meu marido, ele ficou doido e prometeu me deixar em uma cadeira de rodas quando sair daqui ou me matar”, diz.

Carol, sua companheira, de 20 anos, conta que foi estuprada na infância por dois desconhecidos e diz que desde então não gosta de homens. Quando questionada sobre se não sente falta de uma relação heterossexual, Juliana responde:

“Na frente dela (da Carol) eu não posso falar, porque aqui dentro, somos companheiras, marido e mulher. Mas, na verdade, eu sinto falta, sim. Antes de entrar no presídio nunca tinha pensado na vida em me envolver com mulher nenhuma. Achava nojento. Mas o amor nasceu”, afirma a ex-prostituta.

Fonte: G1